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Fraude na saúde do Rio movimentou R$ 50 milhões em propina, diz empresário

O governador afastado do Rio, Wilson Witzel (PSC) - Wilton Júnior/Estadão Conteúdo
O governador afastado do Rio, Wilson Witzel (PSC) Imagem: Wilton Júnior/Estadão Conteúdo

Gabriel Sabóia

Do UOL, no Rio

13/01/2021 15h13Atualizada em 13/01/2021 16h02

O empresário Edson Torres afirmou hoje ao Tribunal Misto que julga o processo de impeachment contra o governador afastado do Rio, Wilson Witzel (PSC), que o total pago em propinas na área da saúde entre 2019 e 2020 supera R$ 50 milhões.

Ele admitiu que recebia parte dos valores pagos por OSs (Organizações Sociais) que mantinham contratos com a administração pública do estado. O Pastor Everaldo, ex-presidente do partido de Witzel, e o ex-secretário de Saúde Edmar Santos também estavam, segundo o empresário, entre os beneficiados do esquema. Durante o depoimento, Edson Torres não apresentou contudo provas que embasem as acusações.

O empresário explicou como era feita a partilha dos valores. "Algumas OSs faziam pagamentos e quem cuidava da arrecadação dividia proporcionalmente. Entre 2019 até maio ou junho de 2020, dos 100% arrecadados, 15% ficavam comigo, 15% com o [também empresário] Vitor Hugo, 30% ficavam com o secretário Edmar e 40% iam para o Everaldo e para a estrutura de governo."

No período citado, segundo Torres, o esquema teria movimentado entre R$ 50 milhões e R$ 55 milhões. As organizações sociais pagavam percentuais que giravam entre 3% e 6% do valor final dos contratos.

Questionado se parte da propina iria para os bolsos de Witzel, Torres disse não ter condições de responder.

Apesar de não esclarecer uma possível participação de Witzel na fraude, o empresário confirmou ter repassado R$ 980 mil ao governador em 2018. Segundo ele, o valor foi entregue em parcelas a aliados do governador afastado —em uma das entregas, o próprio Witzel estaria presente.

O valor seria uma espécie de "bônus" para assegurar a estabilidade financeira de Witzel, que largou a magistratura para se lançar na política. Edson Torres chamou hoje o valor de "caixa de subsistência". Questionado durante a oitiva, ele disse ter provas da entrega do dinheiro —extratos bancários e contas pagas referentes à campanha de Witzel.

Empresário diz ter indicado secretário

Influente junto ao partido de Witzel, Torres disse ter tido papel decisivo na indicação de Edmar Santos para ocupar a Secretaria de Saúde. A relação entre eles teria começado quando Edmar ocupava o cargo de diretor do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Torres era proprietário da empresa de segurança Dinâmica, que prestava serviços à universidade e a outros órgãos estaduais.

"Diante da minha relação de amizade com o [Pastor] Everaldo, participei de ajuda em escolhas do governo. O próprio Edmar Santos. Ele me procurou no final de outubro [de 2018], por meio de uma pessoa próxima e fizemos uma reunião. Ele queria ser diretor do Pedro Ernesto, posteriormente reitor da Uerj e deputado. Ele pediu para encaminhar um currículo ao governador, me pediu a indicação política. O governador entendeu que ele era a pessoa ideal para ser secretário, pelo bom currículo", detalhou.

A partir da nomeação, a relação dos dois se tornou mais estreita. "A minha relação política com Edmar cresceu durante o governo de Witzel. Eu fui procurado por uma pessoa a mando dele, sobre as empresas da minha família para pagar uma comissão àqueles contratos que eu executava. Eu paguei vantagens indevidas durante a gestão do Edmar Santos", reconheceu.

Braço direito de Pastor Everaldo

Edson Torres é informalmente conhecido como o "braço direito do Pastor Everaldo". A relação entre eles teria começado em 1998, de acordo com o MPF (Ministério Público Federal).

Torres e Everaldo foram presos na Operação Tris in Idem, que apura corrupção na saúde do estado, em 28 de agosto do ano passado. Edson foi liberado após o fim da prisão temporária. Everaldo segue preso preventivamente.

Witzel teria sido escolhido para dar "novo rosto ao grupo político". A cooptação de Witzel para fazer parte da organização criminosa teria se iniciado ainda em 2017. O MPF teve acesso a um registro feito na agenda de Witzel, que comprovaria o encontro dele com Edson Torres e com o Pastor Everaldo em 2017.

De acordo com o MPF, Witzel passou a encabeçar a organização criminosa depois de eleito, recebendo vantagens ilícitas e lavando dinheiro.

Outro lado

Desde o início do processo de impeachment, Witzel —que ainda não prestou depoimento ao Tribunal Misto— nega a participação em irregularidades e se diz vítima de uma perseguição política. Ele também nega o recebimento de valores e considera as afirmações "fantasiosas".

Procurada pelo UOL, a defesa de Edmar Santos disse que não se manifestará sobre as acusações de Edson Torres.

Em depoimento ao Tribunal Misto, Pastor Everaldo chorou, pediu clemência e limitou-se a dizer de forma lacônica: "Nunca recebi R$ 15 mil ou qualquer dinheiro do governador Witzel".

Lucas Tristão também negou ao Tribunal Misto a participação em fraudes contratuais durante a pandemia do coronavírus.