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Secretário pede afastamento após áudio sobre esquema para furar fila do SUS

Weudson Ribeiro

Colaboração para o UOL, em Brasília

01/06/2022 20h56

O secretário Saúde de Luziânia (GO), Divonei Oliveira de Souza, pediu afastamento da pasta, depois de ter se tornado alvo do MP-GO (Ministério Público do Estado de Goiás), que apura o conteúdo de um áudio em que ele admite coordenar esquema para furar filas de cirurgias realizadas pelo SUS (Sistema Único de Saúde) no município.

Segundo a gravação, o prefeito Diego Sorgatto (MDB) e vereadores da região tinham conhecimento da prática. Ao UOL, a Prefeitura de Luziânia afirmou que segue rigorosamente critérios de regulação do SUS nos atendimentos no município. "Uma sindicância foi instaurada para apurar a existência de alguma irregularidade, e assim tomar as providências cabíveis", informou.

As manifestações ocorrem depois uma servidora do Hospital Municipal do Jardim Ingá, identificada como Poliana, ter gravado uma reunião em que Divonei informava que a profissional seria transferida para outra unidade de saúde e a repreendia por supostamente questionar superiores hierárquicos que a orientavam a privilegiar pacientes indicados por Sorgatto e vereadores no processo de agendamento de operações e consultas.

"Se tem dez cirurgias de vesícula, eu faço oito e duas eu faço de acordo com o processo. Isso faz parte do jogo", disse o secretário num trecho do áudio, obtido pelo UOL. "Você não vai ficar mais na marcação de consulta. Quem define sou eu. Se você não está concordando, isso não é problema meu", afirma o secretário.

Ao UOL, o secretário disse que "o que ocorreu foi um excesso verbal" dentro de uma discussão acalorada e afirmou que por ter sido "tirada do contexto", a gravação pode "sugerir interpretações equivocadas". Ela nega que o conteúdo dos áudios configurem erro ou irregularidade de sua parte ou por parte da Secretaria de Saúde.

O Ministério Público informou que, pedirá à direção do hospital cópias de documentos, agendas, prontuários, relacionados à listagem de todos os pacientes que já realizaram cirurgias, bem como daqueles que ainda aguardam procedimento cirúrgico e atendimento médico.

O que diz o áudio

No áudio de cerca de 20 minutos, Divonei diz a Poliana que preza pela organização e pelo controle de todas as decisões tomadas no Hospital do Jardim Ingá.

"A gente tem tentado organizar o máximo possível. A gente fez algumas mudanças. Mais ou menos, vocês conseguem o meu jeito de ser, a forma de trabalhar. Hoje, até onde eu sei, tudo que se faz no Jardim Ingá, passa pela gente. Tem chegado a mim que você tá questionando as atitudes que eu tô tomando. Dois vereadores vieram falar comigo que presenciaram você nervosa, brava, gesticulando... Você jogou a pasta para ele e falou 'Tem gente aqui de 2018, como você passa outra pessoa na frente?'"

Os nomes dos vereadores não são revelados na gravação.

"O secretário de Saúde sou eu, quem define sou eu. Se você não está concordando, isso não é problema meu. Não gostei. E mais: um paciente também veio me falar. Veio te elogiar. Ele elogiou dizendo isso, que você estava dizendo nos corredores que não concordava... Então, assim, ficou ruim demais isso para nós", diz ele.

Divonei, então, comunica a transferência de Poliana para outra unidade de saúde e pede que ela "tome cuidado". Ele reitera que ela foi elogiada internamente por se negar a favorecer pacientes em detrimento de outros.

"Você não vai ficar mais na marcação de consulta. Vai entrar outra pessoa lá. A gente vai passar você para a área administrativa. Peço que você pense muito nas suas atitudes e decisões. Tome muito cuidado [antes de colocar a boca no trombone]. Não estou ameaçando, não. Se um paciente veio te elogiar, que você estava questiona porque tinha gente querendo passar na frente, então é porque você realmente não estava tendo controle", diz.

O UOL entrou em contato com o Hospital Municipal do Jardim Ingá e aguarda retorno.

Servidora sofre retaliação, diz defesa

Em nota ao UOL, a defesa da servidora Poliana diz que a servidora passou a sofrer retaliações "por discordar das reiteradas ordens do secretário" de Saúde para "furar a fila" dos pacientes.

"A servidora confirma a autenticidade do áudio e, cumprindo com o seu dever de cidadã e primando pela ética no serviço público, já comunicou o fato às autoridades competentes. Pela sua conduta de enfrentamento, sofreu a punição de ser transferida para um posto de saúde. Visando a boa condução das investigações, ela só irá se manifestar em Juízo."

Diovanei se defende

Leia a íntegra da nota enviada pelo secretário Saúde de Luziânia, Divonei Oliveira de Souza, ao UOL:

Em função dos últimos fatos relacionados à secretaria de saúde, gostaria de esclarecer alguns pontos à população de Luziânia.

1) Durante minha gestão à frente da secretaria de saúde, nunca houve nada de errado no tocante à regulação de cirurgias ou em nenhuma outra área. Até pelo compromisso que tenho com Deus, com minha família, com a população de Luziânia e com o prefeito, que é uma pessoa séria e honrada, sempre agi da forma mais correta possível.

2) Em relação aos áudios divulgados: o que ocorreu foi um excesso verbal dentro de uma discussão acalorada com uma servidora que, tirada do contexto, pode sugerir interpretações equivocadas. Mas que não configura, em nenhum momento, erro ou irregularidade de minha parte ou por parte da secretaria de saúde.

Apesar disso, para não gerar nenhum tipo de constrangimento ao prefeito Diego Sorgatto, por quem tenho o maior respeito e admiração por seu histórico de vida e trabalhos realizados em prol da população, e para que não surja nenhum tipo de ilação sobre possível interferência de minha parte na sindicância que está sendo aberta para apurar os fatos, resolvi entregar o cargo e me desligar da secretaria até que as apurações sejam concluídas. Decisão esta que já comuniquei ao prefeito de Luziânia.

Por fim, quero agradecer todas as manifestações de apoio que recebi nesses últimos dias e reafirmar que, durante todo o período que estive à frente da secretaria de saúde, me dediquei para realizar o melhor trabalho possível, que tem configurado uma melhoria visível no atendimento da saúde em Luziânia e no Distrito do Jardim Ingá.