Bens que vão para acervo pessoal devem ter imposto, dizem especialistas
Os presentes supostamente enviados pelo governo da Arábia Saudita em 2021 ao então presidente Jair Bolsonaro devem passar pela cobrança de impostos caso ele fique com os itens para uso pessoal, dizem especialistas ouvidos pelo UOL.
Além do jogo com colar avaliado em R$ 16,5 milhões apreendido pela Receita Federal, a comitiva do ex-ministro Bento Albuquerque trouxe ao Brasil um outro pacote, que inclui relógio, caneta e outros itens da marca suíça de diamantes Chopard. Esses bens não foram interceptados pela Receita e foram entregues para compor o acervo de Bolsonaro em novembro do ano passado.
Caso os itens não fiquem no acervo da Presidência da República e sejam usados para fins pessoais, Bolsonaro precisa regularizar a situação dos produtos, o que inclui o pagamento de imposto, diz Mauro Silva, presidente da Unafisco (associação dos auditores fiscais).
Se [o conjunto do relógio] não fizer parte do patrimônio da União, fica irregular sem o documento da alfândega"
Mauro Silva
Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação de Bolsonaro, diz que não há limitação financeira para os presentes privados que o presidente recebe enquanto ocupa o cargo e que o chefe de Estado não paga imposto sobre os itens.
No entanto, especialistas dizem que todos os cidadãos devem seguir as regras de isenção tributária: apenas bens no valor de até US$ 1 mil não precisam ser declarados à Receita ao entrar no país.
A União não paga imposto, mas o presidente paga"
Lucas Furtado, procurador junto ao TCU (Tribunal de Contas da União)
Eles destacam que não há na legislação tributária uma diferenciação para a entrada de itens de alto valor por meio de intermediários do presidente da República. As joias entraram no Brasil pela bagagem da equipe do ex-ministro Albuquerque.
Se esse relógio [da Chopard destinado a Bolsonaro] aparecer no braço de alguém, é possível que seja apreendido.
Mauro Silva
O caso das joias que entraram ilegalmente no país vai ser investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Bolsonaro negou ter cometido qualquer ilegalidade em relação às joias.
Receita também vai apurar. Na manhã desta segunda-feira (6), o órgão informou que a entrada do outro pacote de joias no país "somente seria possível se trazido por outro viajante, diferente daquele alvo da fiscalização aduaneira". Ou seja, o conjunto com o relógio estava na bagagem de outro auxiliar do ministro.
O fato pode configurar em tese violação da legislação aduaneira também pelo outro viajante, por falta de declaração e recolhimento dos tributos
Comunicado da Receita Federal em 6 de março de 2023
A Receita Federal informou, ainda, que "tomará as providências cabíveis no âmbito de suas competências para o esclarecimento e cumprimento da legislação aduaneira, sem prejuízo de análise e esclarecimento a respeito da destinação do bem".
Mala diplomática
O presidente da Unafisco diz que o procedimento padrão para o transporte de presentes entre chefes de Estado é por meio de uma mala diplomática carregada por um diplomata e que não pode ser aberta pela Receita no aeroporto.
Estávamos em outubro de 2021, não se falava em eleição. Que pressa era essa que não dava para esperar um diplomata trazer o presente? O diplomata traz a mala, marca audiência, faz cerimônia de entrega de um presente como demonstração de apreço ao país. A joia que vem para um governo representa algo na relação entre as nações. Há um rito nas relações entre países.
Mauro Silva, da Unafisco
O pacote com relógio, caneta, abotoaduras, anel e rosário não foi retido no aeroporto pela Receita como o conjunto de joias que seria um presente do regime saudita a Michelle Bolsonaro. O governo fez 8 tentativas de recuperar os diamantes destinados à ex-primeira-dama.
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