Ato de Bolsonaro em São Paulo vira encruzilhada para Nunes em ano eleitoral
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), ainda não decidiu se vai participar do ato convocado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para 25 de fevereiro, na avenida Paulista. Aliados do prefeito ouvidos pelo UOL dizem que a presença dele na manifestação trará mais desvantagens do que vantagens na corrida eleitoral.
Por que aliados desaconselham participação
Um dos receios é que a manifestação não tenha tom democrático. Ao convocar o ato, Bolsonaro disse que irá se defender das acusações recebidas nos últimos meses e pediu que seus apoiadores não levassem cartazes "contra quem quer que seja". Em outros atos convocados pelo ex-presidente e por seus apoiadores, era comum surgirem frases contra o STF, por exemplo.
Aliados do prefeito não têm total segurança de que não haverá algum tipo de manifestação antidemocrática. No 7 de setembro de 2021, na avenida Paulista, Bolsonaro, então presidente da República, xingou o ministro do STF Alexandre de Moraes de "canalha" e disse que não respeitaria suas decisões. Hoje, Moraes é relator dos inquéritos que investigam Bolsonaro e seus aliados.
O entorno do prefeito define a situação como uma "saia justa". Bolsonaristas querem que Nunes compareça ao ato como uma forma de mostrar sua fidelidade e retribuir o apoio do ex-presidente à sua campanha à reeleição. Enquanto isso, os aliados do emedebista calculam os riscos sobre sua participação.
"Como explicar para o eleitor, de quem ele quer o voto em outubro, a presença num ato com ares antidemocráticos?", disse um interlocutor do prefeito. Nunes ainda não bateu o martelo, mas disse a pessoas próximas que deve participar da manifestação de 25 de fevereiro. Procurado duas vezes pela reportagem, o prefeito não respondeu se irá. O UOL também questionou a assessoria da Prefeitura de São Paulo, mas não teve retorno.
Bolsonaro é investigado pela Polícia Federal por participação em suposta organização criminosa para mantê-lo na Presidência. Ele teve seu passaporte apreendido pela PF na quinta-feira (8) e, quatro dias depois, divulgou nas redes sociais um vídeo convocando ato na Paulista. As imagens também foram compartilhadas por apoiadores do ex-presidente.
Os aliados dizem que a presença de Nunes no ato não trará impactos positivos para a pré-campanha. "Não é o MDB que apoia o PL, e sim o PL que está apoiando o MDB", disse uma fonte do partido.
Participar da manifestação, segundo aliados, pode arranhar a imagem do prefeito e dar munição aos adversários. O pré-candidato e deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) tem tentado vincular Nunes à extrema-direita e dito que derrotá-lo nas eleições será "derrotar o bolsonarismo".
"Tudo que Boulos quer é um confronto ideológico", disse uma pessoa do MDB. A operação da PF já foi utilizada pelo psolista nas redes sociais para criticar a proximidade do atual prefeito com Bolsonaro.
Nunes faz o mesmo com o adversário ao tentar enquadrá-lo como extrema-esquerda. O pré-candidato à reeleição tenta reforçar a imagem de Boulos como radical devido à sua ligação com o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto).
Pontos negativos da ausência em ato
Em caso de ausência no ato, o ponto negativo seria o prefeito perder o apoio de Bolsonaro nas eleições. Sem a aliança, os interlocutores afirmam que Boulos levaria as eleições. Isso porque eles acreditam que, em um possível segundo turno com um candidato bolsonarista, o psolista venceria.
Pesquisa Datafolha mostrou que 68% dos paulistanos não votaria em um candidato apoiado por Bolsonaro. Os dados são referentes a setembro de 2023.
Sem o apoio de Bolsonaro, o PL ficaria de fora da campanha de Nunes, o que significaria menos tempo de TV durante a propaganda eleitoral, por exemplo. Ainda assim, os impactos negativos caso o prefeito não vá ao ato, segundo os aliados, poderiam ser contornados.
Confirmação de Tarcísio no ato pressiona
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), já declarou que estará ao lado de Bolsonaro na manifestação. À CNN Brasil, Tarcísio disse que o ato terá caráter pacífico. "Essa será uma manifestação pacífica de apoio ao [ex-]presidente, e eu vou estar ao lado dele, como sempre estive", disse.
Tarcísio e Nunes são frequentemente cobrados pelos bolsonaristas a se posicionar publicamente em defesa do ex-presidente. O silêncio de ambos sobre a operação da Polícia Federal da qual Bolsonaro e aliados foram alvos irrita o grupo.
Questionado pela colunista da Folha Mônica Bergamo a respeito da operação da PF às vésperas do Carnaval, o prefeito não quis responder. Antes, ele disse a jornalistas que tem "plena confiança nas instituições do nosso país e no nosso Judiciário". No caso de Tarcísio, pesa ainda a relação amistosa com o presidente Lula (PT).
Prefeito e governador têm intensificado agendas conjuntas. Depois de sinalizar que não apoiaria Nunes sem o aval de Bolsonaro, Tarcísio embarcou de vez na campanha do emedebista. Só em janeiro, os dois estiveram juntos em oito agendas. Nos encontros, ambos têm ressaltado a importância do alinhamento entre governo e prefeitura, num contraponto a Boulos.