Nova lei mudou saída temporária de preso, agora sem prazo para voltar

A nova lei que muda como as penas são executadas no país produziu um animal exótico no sistema brasileiro: a saída temporária agora não tem mais prazo definido para o preso voltar ao estabelecimento onde cumpre pena.

A girafa está na Lei 14.843/2024, que altera a Lei de Execução Penal (LEP), de 1984, aprovada pelo Congresso e sancionada por Lula, com vetos, na última quinta-feira (11). As mudanças já estão em vigor.

O projeto original, PL 2.253/2022, da Câmara dos Deputados, previa revogação total da saída temporária, eliminando os três incisos do artigo 122 da LEP que listavam as razões do benefício (visita à família, frequência a curso profissionalizante ou escolar e participar de atividades para facilitar o retorno ao convívio social).

Nas origens, o PL também revogava totalmente o artigo 124 da LEP, que limitava a autorização para deixar o estabelecimento prisional a prazo de sete dias, podendo ser renovada por mais quatro vezes durante o ano.

No Senado, o projeto foi modificado e foi mantida a hipótese de participação em curso. Lula vetou as mudanças feitas pelo Congresso no artigo 122, mantendo as hipóteses de visita à família e de atividades voltadas ao convívio social, mantendo a mudança feita pelo Senado.

Com isso, o texto que está em vigor permite as três hipóteses para deixar o estabelecimento penal, só que eliminou o prazo para se reapresentar. Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que se trata de erro.

"O legislador, sem querer, atribuiu um poder ao juiz para conceder o tempo de permanência na saída temporária", afirma o juiz Ulisses Augusto Pascolati Júnior, professor de processo penal na Universidade Mackenzie e que já atuou como corregedor de presídios.

Entendimento similar é o de Leonardo Castro, professor de direito penal em cursos preparatórios para concursos públicos.

"Foi falta de zelo, para ser educado. O artigo 124 era fundamental para que se soubesse o prazo da saída temporária e quais os limites, e simplesmente revogaram o artigo. Com essa redação [da nova lei] a saída temporária vai ficar a critério do juiz", afirma Castro.

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"Se o juiz quiser dar uma saída temporária de 15 dias, não tem óbice nenhum, porque a lei não limita mais nada. O presidente deveria ter vetado a revogação do artigo 124 junto com os vetos aos incisos I e III do artigo 122", opina.

Teoria e prática

Doutor em Direito Penal pela USP (Universidade de São Paulo), o juiz Pascolati é um crítico das mudanças trazidas pela lei. Segundo ele, a pretexto de tornar mais duro o cumprimento das penas no país, a Lei 14.843 pode tornar mais caótica a progressão de regime num sistema que já tem 800 mil presos.

Em termos mais simples, a progressão é a mudança de regime de cumprimento de pena, de forma gradual, na qual o condenado sai de regime mais rigoroso e passa para regime mais leve, se obedecer aos requisitos da lei. Trata-se de um direito do preso.

Uma das mudanças foi trazer de volta como requisito do resultado do exame criminológico para a progressão do regime, além da boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento.

"O exame criminológico para estes fins já esteve na lei, mas em 2011 foi suprimido porque tinha um efeito deletério sobre o sistema. Como não havia corpo técnico disponível no Estado, atrasava-se injustificadamente a progressão de regime", analisa.

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A experiência do passado, afirma o juiz, era que a exigência do exame criminológico agravava a superlotação do regime fechado. Ou então presos que conseguiam levar a questão à Justiça saltavam direto do regime fechado para o aberto porque o Estado não tinha condições de aplicar o exame.

"Pode ser que daqui a alguns anos a lei vá mudar de novo para eliminar o exame por causa dos efeitos no sistema", afirma.

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