Topo

Castro escapa por um voto de cassação por cargos secretos revelados por UOL

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), na abertura da segunda edição do Rio Innovation Week Imagem: FLAVIO TEIXEIRA VAIRO/ESTADÃO CONTEÚDO

Do UOL, no Rio e em São Paulo

23/05/2024 17h44

Por um placar de 4 x 3, o TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do RJ) decidiu não cassar a chapa do governador do RJ, Cláudio Castro (PL), pelo escândalo dos cargos secretos da Fundação Ceperj e da Uerj (Universidade do Estado do RJ) revelado pelo UOL. Ele foi acusado de abuso de poder político e econômico nas eleições de 2022.

O que aconteceu

Nenhum dos desembargadores negou a existência das irregularidades reveladas pelo UOL. Porém, a maioria sinalizou que a questão não deveria ser objeto de análise pela Justiça Eleitoral, e sim por outras instâncias. Em linha com a defesa de Castro, o entendimento levou o julgamento ao resultado final.

Advogado de Marcelo Freixo recorrerá ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Após o julgamento, Paulo Henrique Teles Fagundes afirmou que a disputa de 2022 foi "viciada" e que houve "um derrame de dinheiro às vésperas das eleições".

O Ministério Público Eleitoral informou que também vai ao TSE contra a absolvição. "Não faltaram provas", afirmou a procuradora regional eleitoral Neide Cardoso após o resultado.

A defesa de Castro disse ter "respeito a todos os votos, tanto a favor quanto contra". Eduardo Damian relatou "tranquilidade" após o resultado final do julgamento.

A desembargadora Kátia Valverde Junqueira deu o voto decisivo a favor de Castro. Ela alegou não ter visto a "prova efetiva" de que as 24 mil contratações feitas por meio do esquema tenham se refletido na diferença de 2 milhões de votos que deu a vitória ao governador na disputa contra Marcelo Freixo (então no PSB). No entanto, o UOL revelou a presença de aliados de Castro e até de cabos eleitorais entre os contratados na Ceperj e na Uerj.

Voto final foi de Henrique Figueira, presidente do TRE-RJ. O desembargador se posicionou a favor da cassação, mas a maioria contra a medida já estava formada. Ele defendeu que os gastos relacionados ao esquema deveriam ser comparados às despesas totais de campanha, restritas a R$ 17,8 milhões na disputa para governador. Se somados, as folhas secretas de pagamento na Ceperj e Uerj envolveram ao menos R$ 1 bilhão.

Fernando Marques de Campos Cabral Filho votou contra cassação. Ele afirmou que faltam provas de que os atos de improbidade tiveram efeito no processo eleitoral. "A simples ocorrência de atos de improbidade administrativa não configura a prática de abuso político ou econômico na Justiça Eleitoral", disse.

Desembargadora destacou que, apesar de a defesa de Castro ter alegado que suspendeu os projetos da Ceperj antes do início do processo eleitoral, os projetos da Uerj continuaram funcionando até dezembro de 2022. Daniela Bandeira de Freitas também ressaltou o impacto da injeção de recursos milionários na universidade e na fundação no período pré-eleitoral

Já Marcello Granado afirmou que há indícios de "graves irregularidades", mas que o caso deve ser objeto de análise em outras instâncias, como as Justiças cível e criminal.

Tese semelhante foi defendida pela defesa de Castro, que alegou que o caso deveria ser enquadrado como improbidade administrativa.

Argumentos de Gerardo Carnevale Ney da Silva foram parecidos aos de Granado. Ele ressaltou que o reitor da Uerj era Ricardo Lodi, então candidato a deputado federal pelo PT, e disse não ver de que forma os projetos da universidade teriam beneficiado Cláudio Castro. O UOL revelou, contudo, que o esquema uniu a direita e a esquerda.

"Como fizeram o milagre da multiplicação?", perguntou Silva, ao comparar as 27 mil contratações feitas pela Ceperj com os mais de 4 milhões de votos obtidos pela chapa de Castro. Ele também minimizou o impacto dos valores investidos na Uerj e na Ceperj —que somados chegaram a cerca de R$ 1 bilhão— com o orçamento total do estado, de R$ 90 bilhões.

Dois anos após a revelação do esquema por reportagens do UOL, ninguém foi denunciado pelo Ministério Público do RJ. Apesar dos indícios de desvio de dinheiro, a principal consequência da revelação foi uma liminar que determinou a interrupção dos pagamentos na Ceperj em agosto de 2022.

Além de Castro, outras 12 pessoas eram réus na ação, entre elas, o atual vice-governador Thiago Pampolha (MDB) e o deputado estadual Rodrigo Bacellar (União Brasil), presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio).

Relator recomendou cassação de Castro

"Quem arquitetou esse plano perverso é um gênio, mas um gênio do mal", disse o relator. Na última sexta (17), o desembargador Peterson Barroso Simão afirmou que o escândalo envolveu ilicitudes que comprometeram o processo eleitoral de 2022.

Para Simão, vice foi favorecido por esquema. O desembargador disse que o dolo de Pampolha foi menor por ter entrado na chapa na reta final da campanha, mas que isso não o eximiria de responsabilidade. Segundo ele, o mesmo valia para Bacellar, secretário de governo à época.

Além de cassação, inelegibilidade. Em seu voto, o desembargador defendeu que Castro, Bacellar e Pampolha sofressem cassação de mandato e ficassem inelegíveis até 2030. Ele também se posicionou a favor da aplicação de uma multa de R$ 106 mil ao governador e outra de R$ 20 mil ao vice, entre outras medidas.

Defesa questionou instância para julgamento, enquanto acusação disse que fraude tinha objetivo eleitoral. As defesas de Castro e dos demais réus defenderam que o caso deveria ser enquadrado como improbidade administrativa, e não crime eleitoral. Já a procuradora Neide Oliveira disse que o esquema tinha "notório propósito político e eleitoral"

"Folhas secretas"

Série de reportagens do UOL mostrou que dezenas de milhares de pessoas foram contratadas sem transparência. Foram identificados indícios de uso político dos projetos tocados pela Fundação Ceperj (Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro) e pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

Esquema serviu para a contratação indevida de cabos eleitorais, segundo procuradoras. De acordo com Neide Cardoso de Oliveira e Silvana Batini, os contratados foram "utilizados para promover as candidaturas e cooptar votos para as respectivas vitórias, nas urnas, atendendo a interesses pessoais escusos e a perpetuação dos referidos políticos".

Defesa de Castro disse que vitória "acachapante" sobre Freixo é prova de que esquema não existiu. Em 2022, o atual governador venceu o candidato de esquerda com mais de 2 milhões de votos de vantagem. Os advogados do governador também dizem que os projetos da Ceperj foram suspensos logo após a primeira decisão judicial e que, por isso, não houve qualquer impacto nas contas públicas.

Presença de nomes da oposição entre os contratados foi apontada como evidência de que suposto esquema não existiu. Um exemplo é o caso de familiares de Ricardo Lodi, ex-reitor da Uerj. Nas eleições de 2022, Lodi conseguiu uma vaga de suplente de deputado federal pelo PT.

Investigação do Ministério Público do RJ descobriu saques de dinheiro vivo na "boca do caixa" no período em que o suposto esquema estava em operação. Ao todo, R$ 248 milhões foram retirados em agências bancárias por dezenas de milhares de pessoas que integrariam o suposto esquema.

Antes de ser absolvido, Castro disse manter confiança na Justiça Eleitoral. Em nota enviada ao UOL, o governador informou que "as suspeitas de irregularidades ocorreram antes do início do processo eleitoral" e que, assim que tomou conhecimento das denúncias, "ordenou a suspensão de pagamentos e contratações" pela Ceperj.

Quem é Cláudio Castro

Chefe do executivo fluminense nasceu em Santos (SP). Cantor gospel com dois álbuns lançados, ele ingressou na vida pública em 2016, como vereador pelo PSC na Câmara Municipal do Rio. Dois anos depois, foi escalado para vice na chapa de Wilson Witzel (à época, no PSC) para o governo do estado, que ganhou.
Governador ocupa o cargo desde 2020. Em agosto daquele ano, o Superior Tribunal de Justiça determinou o afastamento de Witzel por suspeita de fraude em compras na área da saúde durante a pandemia. Em abril de 2021, a aprovação do impeachment por conta da denúncia afastou Witzel em definitivo do cargo.

Em 2022, Castro teve mais votos que Witzel quatro anos antes. Na última eleição, o atual governador teve o apoio de 4,9 milhões de eleitores —contra 4,6 milhões que votaram em Witzel em 2018. Com uma coligação de 14 partidos, Castro teve o apoio de 85 dos 92 prefeitos fluminenses e elegeu maioria na Alerj.

"Lealdade total" a Bolsonaro não se reverteu em reeleição do ex-presidente. Eleito no primeiro turno em 2022, Castro disse que pediria votos "todos os dias" para o aliado, que foi derrotado por Lula (PT) no segundo turno. Castro e Bolsonaro mantém uma relação amistosa. Em abril, os dois estiveram juntos em um ato em Copacabana.

Sobre Lula: "político experiente". A fala de Castro se deu em entrevista feita em janeiro, quando eles se falaram por telefone por conta das chuvas no Rio. "Não sou inimigo dele", disse Castro à época. Mesmo assim, em março, ele cortou o presidente em uma foto dos dois com o presidente francês Emmanuel Macron.

Comunicar erro

Comunique à Redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Castro escapa por um voto de cassação por cargos secretos revelados por UOL - UOL

Obs: Link e título da página são enviados automaticamente ao UOL

Ao prosseguir você concorda com nossa Política de Privacidade


Política