Alvo de denúncias e com futuro incerto, Milton Leite mantém apoio na Câmara

Alvo de denúncias recentes, o presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), mantém a base de apoio afinada, ainda que a chance de ser vice do prefeito e pré-candidato Ricardo Nunes (MDB) seja incerta, na opinião de cientistas políticos.

O que aconteceu

Denúncias surgiram nas últimas semanas. O UOL noticiou que o governador Tarcísio (Republicanos) usou uma operação contra o PCC para que Leite apoiasse a privatização da Sabesp. Já a Folha revelou investigações que apontam Leite com "papel juridicamente relevante na execução dos crimes" ligados a Transwolff.

Leite recebeu apoio público de vereadores na última terça (28). No Colégio de Líderes, reunião na qual membros da casa definem a pauta da semana, João Jorge (MDB), Senival Moura (PT) e Xexéu Trípoli (UB) manifestaram solidariedade ao presidente da câmara. A movimentação revela a força de Leite entre os pares.

Para cientistas políticos, a denúncia enfraquece Leite — mas não o anula. De acordo com três especialistas entrevistados pela reportagem, a revelação cria um obstáculo extra para que o vereador seja vice de Nunes em comparação com outros nomes. Mas todos concordam que é cedo para dizer que Leite está fora do jogo.

Sem Leite, outros padrinhos ganham força para indicar vice de Nunes. Para Marco Antônio Teixeira, da FGV, o governador Tarcísio (Republicanos), Gilberto Kassab (PSD) e até Bolsonaro (PL) ganham mais fôlego para indicar um vice para a campanha de reeleição do prefeito. Já Tathiana Chicarino, da FESP, crê que a força de Leite nas urnas pode atrair novos aliados.

Revelação pode afetar planos de Leite para o futuro. Doutor em ciência política e professor da USP, José Veríssimo Romão Netto afirma que a denúncia pode abalar outros projetos que vem sendo cogitados no meio político. Um deles seria concorrer ao Senado em 2026. Para isso, Leite teria de tirar dos bolsonaristas a vaga ocupada em 2018 por Major Olímpio, morto durante a pandemia. Na visão do pesquisador, a costura política para isso se torna mais delicada com Leite no centro de uma investigação.

"O Milton tem um apoio grande na base aliada", diz membro da oposição. Segundo Celso Giannazi (Psol), a situação justifica as manifestações de solidariedade recebidas por Leite. Mesmo na oposição, medidas como a abertura de CPI — cogitadas em ocasiões anteriores parecidas — não estão em discussão no momento.

Leite nega acusações

Justiça quebrou sigilos fiscal e bancário de Leite em 2023. Segundo reportagem da Folha no dia (25, promotores do Grupo de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público de São Paulo afirmaram que o vereador teve envolvimento com crimes cometidos pela Transwolff, empresa ligada ao PCC.

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Investigação de suposta lavagem de dinheiro do PCC por meio de empresa de ônibus resultou em operação. Batizada de "Fim da Linha", a ação resultou na prisão do presidente de Transwolff, Luiz Carlos Efigênio Pacheco, o Pandora, e outras pessoas em abril. Leite não foi um dos alvos da operação.

'A notícia só não basta' para acusar', afirmou vereador. Durante a reunião na Câmara, Leite disse que não é contra investigações nem reportagens, mas pediu prudência. Segundo ele, a Folha se baseou em "ilações" que resultaram em "manchete maldosa". Apesar disso, Leite elogiou o editorial do jornal daquele dia.

Editorial pondera que "não se sabe o que pesa contra" Leite. No texto, o jornal afirma que as "investigações, por ora, estão longe de conclusivas — e é cedo para apontar qualquer responsabilidade" em relação ao presidente da Câmara. Na reunião, Leite disse que o editorial "corrige" problemas da reportagem.

Vereador reforçou que abriu seu sigilo bancário por conta própria. Em sua fala na Câmara na terça, Leite disse que nada foi encontrado por investigações — apesar do trabalho "duro e firme" dos promotores — porque nem ele nem ninguém próximo havia cometido irregularidades. "A minha vida é aberta", disse ele.

Quem é Milton Leite?

Leite é vereador desde 1997. Aliado de todos os prefeitos desde então, foi eleito presidente da Câmara Municipal por sete vezes. Ao longo de 2024, já anunciou algumas vezes que não deve se candidatar de novo este ano e que planeja ser vice na chapa de Nunes.

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Nos bastidores, dois nomes são tidos como pré-candidatos de Leite à Câmara. Um é Silvio Antonio de Azevedo, que é presidente da Estrela do Terceiro Milênio, escola de samba apoiada por Leite. O outro é Silvio Ricardo Pereira dos Santos, o Silvinho — chefe de gabinete na subprefeitura do M'Boi Mirim.

Leite não foi alvo de operação, mas é testemunha na denúncia oferecida à Justiça em abril. Além dele, o deputado federal Jilmar Tatto (PT) também foi arrolado como testemunha, mas não é acusado de suspeitas semelhantes, segundo a Folha. A reportagem afirma ainda que a investigação sobre Leite continua.

Mensagens em que Pandora pede voto para Leite fazem parte do material levantado pela investigação. De acordo com a Folha, as menções dos investigadores ao presidente da Câmara podem ser lidas como um aviso de que o vereador também pode ser alvo de operações ligadas ao tema no futuro.

O que dizem os envolvidos?

A finalidade da manchete em questão e de parte do conteúdo da matéria têm o único objetivo de macular a imagem idônea que construí em quase 30 anos de vida pública. Por fim, chama a atenção o interesse em se tentar assassinar minha reputação em um ano eleitoral, sem base em novos documentos e desconsiderando decisões judiciais já tomadas, o que ocorre justamente quando meu nome se destaca entre possíveis candidatos a vice-prefeito..
Milton Leite (União Brasil), presidente da Câmara Municipal de São Paulo, em nota à imprensa

Milton Leite é uma figura poderosa na cidade. Para muitos, um primeiro-ministro. Ele reúne apoios que vão do PT ao bolsonarismo e seu enfraquecimento agora não o anula, mas abre espaço para que outras forças políticas tenham maior influência na indicação de quem será o vice de Nunes nas eleições deste ano.
Marco Antônio Teixeira, cientista político e professor-adjunto do Departamento de Gestão Pública da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas de São Paulo

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Leite é fundamental na atual configuração da campanha para Nunes, mais que o bolsonarismo, por ser capaz de atrelar à figura do prefeito as obras que são entregues na periferia. O crescimento de Nunes nas pesquisas reflete isso. Sem a ação de Leite, ficaria mais barato para o Boulos ir atrás desse voto.
Tathiana Senne Chicarino, coordenadora da graduação em sociologia e política na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo

A gente não sabe o que vai aparecer nesse processo. Se, na metáfora jurídica, houver uma arma fumegante com a digital de Leite, ficará difícil para ele escapar de ser punido pela Justiça e, por consequência, afastado da política.
José Veríssimo Romão Netto, vice-coordenador do grupo de pesquisa Qualidade da Democracia no Instituto de Estudos Avançados da USP

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