Relator tira 'taxa das blusinhas' de projeto, e Senado adia votação

O Senado adiou nesta terça-feira (4) a votação do projeto Mover. A decisão foi tomada após o relator do texto na Casa, senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), tirar de seu relatório o trecho que propõe taxar em 20% compras internacionais de até US$ 50, a chamada "taxa das blusinhas". A expectativa é que o projeto seja discutido e votado amanhã (5).

O que aconteceu

O Mover propõe incentivos fiscais para estimular uma produção mais sustentável de veículos. Mas na Câmara, o relator, Átila Lira (PP-PI), incluiu um trecho com a "taxa das blusinhas". Na política, um dispositivo incluído em um projeto com o qual não tem relação direta é chamado de "jabuti".

A "taxa das blusinhas" foi aprovada na semana passada na Câmara e seguiu para o Senado. Na Casa, o texto seria votado na quarta-feira (29), mas foi adiado para hoje — e agora novamente postergado. A taxação afeta compras em sites internacionais como Shein, AliExpress e Shopee.

Hoje, Rodrigo Cunha apresentou seu relatório sem a taxa, mas a decisão de mudar o texto não foi bem aceita pelos líderes das bancadas. Tanto Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo, quanto Rogério Marinho (PL-RN), da oposição, pediram o adiamento da votação, argumentando que precisavam entender melhor as mudanças propostas pelo relator. O petista declarou que já teria o compromisso do presidente Lula (PT) para vetar alguns trechos do relatório original, então as mudanças feitas por Cunha atrasariam a promulgação do projeto, que precisaria voltar para a Câmara.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), acatou o pedido dos líderes e adiou a votação. O presidente pediu que os senadores se reúnam com o relator da proposta para que cheguem a um acordo sobre o texo.

Acho mais pertinente [adiar], até para que o senador tenha mais tempo. Pra mim, tem muito ruído de comunicação. Pra votar essa matéria agora, tem muita confusão. Eu prefiro trabalhar até amanhã pra construir um procedimento sobre a votação dessa matéria. Porque tudo bem, podemos votar a matéria como está apresentada e ela voltará para a Câmara. Ou seja, nós em vez de agilizarmos algo que considero importante, estaríamos postergando.
senador Jaques Wagner, líder do governo no Senado

Disputa entre Senado e Câmara

Ao avisar que tiraria a taxação, o relator mostrou descontentamento pelo fato de a taxa ter sido acordada pela Câmara com o governo federal sem participação do Senado. "Esse assunto não foi tratado, e deveria ter sido tratado, da Câmara com o Senado e com o governo. O que se foi colocado desde o início é que houve um acordo de o presidente Lula não vetar o acordo de 20% com a Câmara, mas quanto ao Senado não houve esse tipo de conversa", apontou.

Não é o momento ideal. Não será taxar as blusinhas que vai fazer com que o país melhore de um dia pro outro. Mas o que nós vamos fazer de maneira responsável é tratar esse assunto de maneira pertinente, e não permitir um jabuti, uma matéria estranha, uma artimanha legislativa ser colocada em um projeto tão importante como esse e as pessoas serem surpreendidas. E repito, mais uma vez, o próprio governo ser desconsiderado.
senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL)

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Com a mudança, se o relatório sem a taxa for aprovado no plenário do Senado, ele terá que voltar à Câmara. De lá, ainda que os deputados retomem a taxação, o texto segue para sanção do presidente Lula.

Para Cunha, se a Câmara recolocar a taxa no projeto, ficará claro que a iniciativa é dos deputados, e não de todos os parlamentares. "Quanto à situação se a Câmara irá ou não colocar novamente a taxação das blusinhas, essa situação cabe à Câmara dos Deputados. Agora espero que dessa vez não apenas insiram o artigo, mas também insira a digital de quem vai concordar com isso", afirmou o senador.

Projeto separado para taxação

Cunha defendeu que a taxação de compras internacionais seja votada em um projeto separado. Disse ainda que é necessário avaliar os efeitos do programa Remessa Conforme, instituído pelo governo federal em 2023 para zerar o imposto de importação das compras internacionais abaixo de US$ 50. A medida é válida para pessoas físicas no Brasil, para compras enviadas por pessoas jurídicas (empresas) no exterior.

Sou um defensor da redução da carga tributária nacional. Compreendo as colocações do setor varejista e do governo, mas não podemos de forma afoita impor uma taxa de 20% para compras internacionais de até US$ 50 sem antes realizarmos uma ampla discussão com sociedade, empresários, governo e parlamento nacional. Lembro também que o governo criou recentemente o programa Remessa Conforme, que já tributa as encomendas internacionais. Por este motivo, em meu relatório, expresso minha posição contra a taxa.
senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL)

O relator ainda defendeu a importância do Mover, programa com previsão de R$ 19,3 bilhões em incentivos fiscais que tem como objetivo estimular a produção de veículos mais limpos. "O Mover é uma ação primordial para a eletromobilidade no Brasil, e seu debate não pode se misturar a outras questões. Respeito a posição do governo e a iniciativa da Câmara dos Deputados, mas como senador relator da proposta, pontuo que, do jeito como ela chegou ao Senado, sua tramitação nesta Casa não pode se dar desta maneira açodada", disse ele.

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O UOL apurou junto a fontes do governo federal que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não foi consultado pelo Senado para a decisão anunciada nesta terça-feira.

A equipe econômica do governo já era a favor da separação. Haddad e o vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro da Indústria, nunca foram a favor de a proposta ser incluída como jabuti, por atrapalhar tanto o debate sobre a taxação quanto a aprovação do Mover, voltado ao setor automotivo.

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