Barroso diz que julgamento sobre maconha é 'tipicamente' do Judiciário

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luis Roberto Barroso, afirmou nesta quarta-feira (26), que a discussão sobre a descriminalização do porte de maconha é "tipicamente" uma competência do Supremo

O que aconteceu

Barroso saiu em defesa do papel do STF. Ele se manifestou na abertura do julgamento desta tarde, no qual o tribunal decidiu os parâmetros para se definir quem pode ser enquadrado como usuário e quem pode ser enquadrado como traficante.

O ministro reforçou que o STF entrou no tema porque recebeu o habeas corpus de um cidadão preso em São Paulo por porte de maconha. Barroso disse que é função do STF julgar habeas corpus e recursos, mas que para isso, é necessário que haja critérios sobre os fatos a serem julgados.

É muito importante voltar a esclarecer isso. A discussão sobre ser ou não ser competência do STF se pronunciar sobre esse assunto, quem recebe os Habeas Corpus que envolvem as pessoas presas com drogas é o STF. E, portanto, nós precisamos ter um critério que oriente a nós mesmos em que situações se deve considerar tráfico e em que situação se deve considerar uso. Portanto, não existe matéria mais pertinente de atuação do Supremo que essa, porque cabe ao Supremo manter ou não uma pessoa presa como cabe aos juízes de primeiro grau. Portanto, essa é tipicamente uma matéria para o poder Judiciário, nós precisamos ter um critério para definir se a pessoa deve ficar presa ou não.
Luis Roberto Barroso, presidente do STF

Ao final da sessão, Barroso reiterou as palavras. Ele disse não querer ser "censor" do presidente Lula (PT) e afirmou respeitar as opiniões do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). "Não foi o Supremo que se mobilizou para ter uma ingerência em um tema que não é da alçada do Supremo. Os recursos chegam aqui e o Supremo tem que julgar, é assim que funciona a vida do Poder Judiciário", disse.

O presidente Pacheco tem todo direito de ter a opinião que lhe pareça bem acerca desse tema. Nós entendemos que não é invasão de competência. Julgar Habeas Corpus e julgar recurso extraordinário é competência do Supremo, o Congresso não tem esse papel. E para julgar adequadamente esses HCs e recursos, precisamos estabelecer critérios. Como a lei não estabelece critério que distingue tráfico de porte para consumo pessoal, nós tivemos que estabelecer um critério. Se, quando o Congresso atuar, se atuar de maneira compatível com a Constituição, é a vontade do Congresso que vai prevalecer.
Luis Roberto Barroso, presidente do STF

Reações de Lula e Pacheco

Ontem o tribunal formou maioria para entender que o porte de maconha para uso pessoa não deve ser considerado crime, mas um ilícito administrativo. Com o estabelecimento de critérios objetivos, o STF pretende acabar com eventuais abusos e estabelecer uma regra para atuação de autoridades locais.

A manifestação de Barroso se deu após falas críticas dos outros Poderes ao papel do Supremo. O presidente Lula (PT) afirmou hoje, em entrevista ao UOL, que a diferenciação entre usuário e traficante deveria, na visão dele, ser feita pelo Congresso e que a Suprema Corte "não tem que se meter em tudo". Ele reclamou de uma "disputa de vaidades" entre os dois Poderes.

Continua após a publicidade

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, viu 'invasão à competência" do Congresso. Ele se manifestou ontem após o STF formar maioria para descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. O senador é autor de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que prevê a criminalização do porte de qualquer quantidade de droga ilícita. Proposta está em trâmite na Câmara.

Eu discordo da decisão do Supremo Tribunal Federal [de descriminalização do porte de drogas para uso pessoal]. (...) Há uma lógica jurídica, política, racional em relação a isso, que, na minha opinião, não pode ser quebrada por uma decisão judicial que destaque uma determinada substância entorpecente, invadindo a competência técnica que é própria da Anvisa e invadindo a competência legislativa que é própria do Congresso Nacional.
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado

Acho que é nobre que haja diferenciação entre o consumidor, o usuário e o traficante. É necessário que a gente tenha uma decisão sobre, não na Suprema Corte, pode ser no Congresso Nacional, para que a gente possa regular (...)Se um dia um ministro da Suprema Corte pedisse um conselho para mim: 'Presidente, o que eu faço?' Eu falaria: 'recusa essas propostas'. A Suprema Corte não tem que se meter em tudo, ela precisa pegar as coisas mais sérias sobre o que diz respeito à Constituição, e ela virar senhora da situação, mas não pode pegar qualquer coisa e ficar discutindo, porque aí começa criar uma rivalidade que não é boa nem para democracia, nem para Suprema Corte, nem para o Congresso Nacional.
Lula, presidente da República em entrevista ao UOL

Gilmar também defende julgamento

Decano do Supremo, o ministro Gilmar Mendes também se manifestou sobre julgamento. Mais cedo, ele afirmou em entrevista em Lisboa que o julgamento do STF não significa um "liberou geral" e evitou polemizar com a fala de Pacheco sobre invasão de atribuição.

Foi um entendimento muito racionalizado e moderado. Se trata apenas de separar o traficante daquele que é apenas usuário. Não se trata de uma liberação geral para recreio ou coisa do tipo. É enfrentar a droga como uma doença mesmo, que precisa de tratamento. É, antes de tudo, um problema de saúde (...) Não há invasão de competência porque, de fato, o que estamos examinando é o artigo 28 da lei de drogas em face da Constituição.
ministro Gilmar Mendes

Deixe seu comentário

Só para assinantes