ONGs: Empresa de peixeiro tem pagamentos suspensos após reportagem do UOL

A Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio) mandou a ONG Instituto Realizando o Futuro suspender pagamentos à empresa de um peixeiro que recebeu mais de R$ 1 milhão para fazer 77 eventos em um projeto esportivo, mas teria entregue apenas quatro.

O que aconteceu

"Evidências de irregularidade". A medida foi tomada pela Unirio — responsável pelo acompanhamento da execução do projeto — após uma comissão ter detectado problemas no contrato da ONG com a JPB Comércio Serviço e Gestão Empresarial.

A comissão analisa indícios de desvios de recursos revelados em série de reportagens do UOL. O Instituto Realizando o Futuro faz parte de uma rede de sete ONGs suspeita de desvios de recursos, que recebeu quase meio bilhão de reais em emendas parlamentares entre 2021 e 2023.

Conforme revelou o UOL, a JPB — que pertence ao peixeiro João Paulo Monteiro Barcelos, 34 — recebeu da ONG, entre janeiro e março, R$ 1,2 milhão para a realização de 77 eventos no projeto de atividades esportivas Fazendo Arte.

Em análise preliminar, a comissão da Unirio constatou que "somente quatro eventos teriam sido realizados pela empresa entre o fim de julho e o início de agosto".

Prejuízo pode passar de R$ 1 milhão. Caso fique efetivamente constatado que só foram realizados quatro eventos, o custo seria de apenas R$ 64 mil.

ONG foi chamada para dar explicações. Segundo a Unirio, o Instituto Realizando o Futuro foi convocado para esclarecer os motivos da discrepância.

Um relatório final da comissão deve sair até o fim do mês. Dezenas de contratos de uma rede de ONGs que realiza projetos em parceria com a Unirio, com recursos de emendas parlamentares, estão sob análise após as reportagens do UOL.

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O UOL questionou a assessoria de imprensa do Instituto Realizando o Futuro a respeito do contrato com a JPB, mas não obteve retorno. A ONG já defendeu os procedimentos que realiza (leia a íntegra da resposta).

A reportagem encontrou o peixeiro em uma feira livre da Cidade de Deus, na zona oeste, no fim de março. Ele se recusou a dar informações sobre as empresas. O UOL esteve duas vezes em um escritório na Barra da Tijuca, atual sede da firma, mas não encontrou ninguém. Telefone e email da empresa não funcionam.

Empresa de peixeiro

A JPB Comércio Serviço e Gestão Empresarial é uma das duas empresas do peixeiro João Paulo Monteiro Barcelos, que, de janeiro de 2023 a maio passado, receberam R$ 5 milhões de três ONGs que desenvolvem projetos de esportes e qualificação profissional.

As duas firmas — a outra se chama JPB Serviços Empresariais — foram criadas no ano passado e, logo em seguida, passaram a receber recursos milionários dessas entidades.

As empresas oferecem serviços como treinamento, monitoramento, publicação de resultados e realização de eventos para projetos esportivos e de qualificação profissional, que nada têm a ver com a atividade de Barcelos, que atua na venda de peixe em feiras livres na cidade do Rio.

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O peixeiro mora com Ingrid Costa de Souza, 29, que é enteada do presidente de uma das ONGs que contrataram serviços de Barcelos, o Instituto Carioca de Atividades.

Até fevereiro, Ingrid foi dona da empresa ArtPlural Produções e Eventos, que assinou contratos de R$ 10,6 milhões com ONGs entre 2021 e 2023.

Pagamento antes de projeto começar

Conforme revelou o UOL, o Instituto Realizando o Futuro pagou R$ 714 mil para a JPB Comércio, em 5 de janeiro, por 44 eventos no projeto Fazendo Arte, que segue em andamento.

O Fazendo Arte só foi, contudo, lançado oficialmente no dia 23 daquele mês.

Em 7 de março, a JPB Comércio recebeu mais R$ 536 mil por 33 eventos.

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Cada um dos 77 eventos saiu por pouco mais de R$ 16 mil. O site da ONG mostra que o projeto só tem 17 polos.

Ao todo, o contrato com a JPB neste projeto é de R$ 1,7 milhão por 110 eventos.

Não há em documentos públicos disponibilizados pela ONG nenhuma descrição do que deveria ser entregue em cada um desses eventos.

Ao todo, o Fazendo Arte tem custo de R$ 4,8 milhões, vindos de uma emenda da ex-deputada Clarissa Garotinho (União Brasil). Ela disse que cabe à Unirio a fiscalização de eventuais irregularidades nos contratos.

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