Topo

Esse conteúdo é antigo

Cubano que virou ambulante retoma carreira de médico para enfrentar a covid

O médico cubano Raymond Garcia - Arquivo pessoal
O médico cubano Raymond Garcia Imagem: Arquivo pessoal

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Ponta Grossa

29/04/2020 14h13

Quase dois anos depois de deixar o programa Mais Médicos, o cubano Raymond Garcia, de 33 anos, volta a exercer a atividade no Brasil, lugar onde decidiu seguir a vida após o fim da parceria entre Cuba e o governo brasileiro. A missão agora é outra: combater o novo coronavírus, em Belém. Ele está ao lado de outros 85 compatriotas contratados pelo governo do Pará para auxiliar no combate à covid-19.

O retorno de Garcia à medicina ocorre pela primeira vez desde que deixou o Mais Médicos, em novembro de 2018. Neste período, para sustentar a família que formou no Brasil, o cubano se virou como pôde. Vendeu salgados como ambulante e trabalhou em uma farmácia em Ponta de Pedras, na Ilha do Marajó, no Pará.

Garcia tem residência em medicina intensiva e infectologia, umas das especialidades mais procuradas durante a pandemia, e se considera "entusiasmado e renascido" com a oportunidade de retomar a carreira em uma nova missão.

"Fazia muito tempo que não colocava o meu jaleco branco, não conversava com um paciente. Estou entusiasmado, sendo como se fosse um renascimento. Tirou uma frustração que estava em meu coração. Não vai ser fácil, porém é o dever com esta terra que meu deu liberdade e um filho", comentou o médico, que chegou anteontem em Belém, após uma viagem de barco que dura cerca cinco horas de Ponta de Pedras até a capital.

O cubano atuará no Hospital de Campanha montado pelo governo do Pará no centro de eventos Hangar, em Belém. O estado vive uma escalada no número de casos, passando de 902, em 20 de abril, para 2.470, segundo o último boletim da Secretaria de Saúde.

A situação deixou a saúde pública do estado à beira do colapso e forçou o Pará a contratar 86 médicos cubanos que decidiram permanecer no estado após o Mais Médicos. Eles aguardam a prova de revalidação do diploma, o Revalida, que não ocorre desde 2017, para obter autorização para voltarem ao trabalho no Brasil. A contratação do governo paraense é direta com o profissional, sem intermediação com Cuba.

Médico virou ambulante

Médico cubano - Arquivo pessoal  - Arquivo pessoal
O médico Raymond Garcia ganhou a vida vendendo salgadinhos
Imagem: Arquivo pessoal

Raymond Garcia chegou em Ponta de Pedras, no Pará, em 2016 por meio do Mais Médicos. Um ano depois conheceu a esposa, Janira Seara, de 36 anos, e ambos tiveram um filho, que nasceu em 25 de junho de 2018.

Antes de chegar ao Brasil para atuar na atenção básica de saúde, o médico também cumpriu missões em Guiné-Bissau, Serra Leoa e Venezuela.

Mesmo com toda a experiência na área, Garcia não podia atuar na profissão após o encerramento do Mais Médicos, pois ainda não tem a revalidação do diploma. Ele, então, passou a vender coxinhas pelas ruas de Ponta das Pedras para auxiliar a esposa com as despesas. Conseguia cerca de R$ 20 a R$ 50 por dia.

"Fiquei no Brasil porque tenho um filho pequeno. A partir daí, fiquei desempregado sem um jeito de levar comida para minha casa. Comecei, então, trabalhar vendendo algumas coisas na rua. Fiquei assim por quase um ano até ser contratado por uma farmácia", contou.

Garcia também aguarda a chamada do Ministério da Saúde de um edital publicado em março no Diário Oficial da União também para atuar no combate à pandemia.

"Estou muito dedicado em cumprir a minha missão de médico e principalmente auxiliar o povo paraense. Eu gosto muito do Brasil, da gente daqui e é um país que oferece a liberdade. É a minha segunda pátria. Voltar a ser médico é como ser fosse um agradecimento ao povo brasileiro que sempre me apoiou", finalizou.