Médico conta como HC-SP montou 'covidário' e pede manutenção do isolamento
O Hospital das Clínicas de São Paulo, um dos mais importantes da América Latina, montou um comitê de crise em 29 de janeiro, menos de um mês após a explosão de casos do novo coronavírus na China. Depois de colocar em prática o que ficou chamado de um "covidário", um local de tratamento exclusivo para a doença, o local já está com sua taxa lotação perto do esgotamento. Responsável por esse setor no HC, Aluisio Segurado alertou que "não há um ser humano livre de adquirir essa infecção", falou sobre cloroquina e disse não ver elementos para reduzir medidas de isolamento neste momento.
Em entrevista ao site El País, Segurado, presidente do Conselho Diretor do Instituto Central do hospital e professor de moléstias infecciosas da USP, relembrou como foi montado o "covidário" e afirmou que novos leitos de UTI devem ser colocados à disposição do HC, já que dos 200 disponíveis, 191 estavam ocupados até segunda-feira (27)- além disso, há 700 leitos de enfermaria.
"Foi uma operação de desmonte da estrutura para uma remontagem. Transferimos todos os pacientes, mais de 400, muitos deles em estado grave, na UTI", contou ele, ao site, ressaltando que já existem protocolos para este tipo de ação do hospital.
"Não é nada simples você adaptar uma instituição de saúde de grande porte pra dar essa resposta. Logo se viu que mais uma vez o hospital poderia ser acionado e foi se montando esse comitê e estabelecendo uma divisão de tarefas. O fato de termos iniciado mais precocemente nos permitiu tomar decisões que teriam sido muito difíceis se elas tivessem sido deixadas para serem tomadas em um momento em que a crise já estivesse instalada", afirmou Segurado.
Sobre os números de leitos, explicou: "Fizemos inicialmente essa proporção de 200 leitos de UTI para 700 de enfermaria imaginando que a maioria dos pacientes que viriam com covid-19 não estariam em situação grave. Mas não foi isso que se viu". Já estão sendo feitas alterações de leitos comuns para leitos de UTI, o que exige também recursos humanos e materiais específicos. Na terça-feira, João Doria, governador de São Paulo, anunciou o pedido de mais 100 leitos de UTI para o HC. O hospital recebe de 30 a 35 pacientes por dia - muitos direto para a terapia intensiva.
Segurado defende as medidas de isolamento social do governo de São Paulo e explica que elas permitem o achatamento da curva e evitar um colapso do sistema de saúde.
Mais agressivo que H1N1
Ele ainda explicou que observa uma agressividade maior da covid-19 em relação a gripes como o H1N1.
"Tivemos aqui uma experiência de gripe com o H1N1 e estamos percebendo que a agressividade do coronavírus é maior. Vemos que há uma evolução desproporcional para a gravidade frente ao que inicialmente se imaginava que seria o perfil de risco daquele paciente. Isso vai demandar um estudo um pouco maior, porque às vezes o indivíduo pode ter um fator de risco que não está revelado. Uma deficiência imunológica", analisou Segurado.
"Outro dia vi uma citação que achei bastante interessante que dizia que os únicos três seres humanos que estavam livres da covid-19 eram os que estavam na plataforma espacial. Mas eles voltaram. Então hoje não há nenhum ser humano que esteja livre de adquirir essa infecção, infelizmente. É um sentimento muito novo para nós. Sou um infectologista é e estou há 40 anos na especialidade e nunca vivenciei uma situação como essa de pandemia", acrescentou.
Cloroquina e isolamento
Questionado sobre a cloroquina e hidroxicloroquina, defendida por nomes como Jair Bolsonaro e Donald Trump, ele explicou que ela não faz parte das recomendações do HC.
"Nosso protocolo é de manutenção das condições gerais do paciente, de assistência ventilatória. Não há nenhuma proposta de tratamento medicamentoso [específica] mesmo porque nenhum desses tratamentos medicamentosos foi cientificamente comprovado como eficaz. Agora, o Hospital das Clínicas é um hospital de ensino e pesquisa. Então, existe uma plataforma de pesquisa com vários projetos sendo submetida aos órgãos reguladores para assim que a gente tenha alguma liberação a gente possa trabalhar com eles. A cloroquina não faz parte da nossa recomendação. Não identificamos nenhuma evidência científica na sua utilização", disse o médico.
Por fim, Segurado disse ainda não ver elementos para uma reabertura do comércio e fim do isolamento em São Paulo.
"Acho que a gente ainda não tem elementos para propor isso imediatamente. O nosso Estado está pautando as suas decisões pelo comitê de crise, que tem se baseado em evidências científicas. É um Estado em que as medidas foram implementadas precocemente e está firmemente aderindo a isso. Pelo menos até 10 de maio não há nenhuma perspectiva de mudança nessa política. A gente continua recebendo uma demanda muito alta de pacientes graves, o que denota que o vírus está circulando intensamente na cidade. As medidas de isolamento ainda são bastante necessárias aqui", concluiu.
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