Covid-19: De falta de máscaras a sabonete, CFM registra 2.000 denúncias
O CFM (Conselho Federal de Medicina) recebeu 2.166 denúncias de irregularidades na estrutura necessária para o enfrentamento à pandemia de covid-19 nos hospitais do país. Segundo dados divulgados pelo órgão nesta quinta-feira (14), cerca de 1.500 profissionais registraram reclamações em 546 municípios de todos os estados.
O principal problema relatado pelos médicos é a falta de EPIs (equipamentos de proteção individual), sobretudo de máscaras N95, recomendadas para evitar a contaminação de equipes de saúde, e de aventais.
Na sequência, vêm as denúncias sobre falta de exames e medicamentos — desde os testes para diagnosticar covid-19 até material para curativos.
"As denúncias de falta de infraestrutura sempre existiram. Ao longo de anos, a gente sempre comentou a falta de leitos para terapia intensiva, falta de sabão para atenção primária, existem médicos que trabalham debaixo de árvore em unidade de saúde. Só que, em relação a uma pandemia de doença infecciosa, as denúncias sobre falta de EPIs aumentam", afirma o neurologista Hideraldo Cabeça, secretário do CFM e conselheiro federal pelo Pará.
Relatos reunidos em documento elaborado pelo Sindicato dos Médicos de São Paulo, que também tem recebido denúncias, descrevem a falta de estrutura dos profissionais no estado que é o epicentro da pandemia no Brasil.
Há médicos contando que precisam implorar por máscaras N95, outros dizem que precisam comprar seus próprios equipamentos de proteção.
Quando recebem as máscaras, segundo diversos relatos, são orientados a usá-las por até um mês sem trocar. Outros nem sequer têm pia à disposição em seus consultórios. Lavar as mãos é uma das recomendações mais básicas de prevenção ao novo coronavírus.
As identidades dos profissionais foram omitidas a pedido para preservá-los.
Eles não tinham máscara N95 disponível nem para o plantonista do PA [Pronto Atendimento]. Nos dias seguintes providenciaram máscaras, mas o médico precisava sair da unidade, ir na segurança do trabalho (que fica bem longe) para implorar por uma máscara. E eles ficam fazendo muitas perguntas antes de saber se podem ou não fornecer"
Médico de hospital estadual no fim de março
Já são mais de dez funcionários afastados e ainda não sabemos a causa. Não tem álcool gel em todas as salas. Uma das salas não tinha água corrente. O espelho de ponto é em apenas um local, o que acumula profissionais nos horários mais críticos"
Médico da rede municipal da capital
Os hospitais públicos respondem por 84,6% das denúncias recebidas pelo CFM e os privados, por 10,4%. O restante se divide entre entidades filantrópicas e casos em que o denunciante não sabia o tipo de vínculo da instituição.
Mesmo em menor escala, o sindicato paulista foi informado de irregularidades graves em hospitais particulares.
Um profissional que atua numa unidade privada denunciou a má qualidade de EPIs mesmo para atender pacientes de covid-19 na UTI, que não eram oferecidos em quantidades suficientes a toda a equipe.
Os aventais disponibilizados não são impermeáveis e falta capacete com visor de vidro para proteção de gotículas. O grande problema são os aventais. São aqueles aventais descartáveis, tipo TNT, que não são impermeáveis. Usar avental de TNT para intubar pacientes com coronavírus e manter o uso de máscara N95 mesmo que tenha intubado outro paciente anteriormente?
O momento da intubação do paciente é considerado o mais crítico para o contágio das equipes de saúde. Esse mesmo médico termina a denúncia com um apelo:
Com certeza teremos muitos médicos e enfermeiros doentes, talvez mortos. Por favor, o hospital está abandonado"
"O médico, como todos os profissionais de saúde, não se nega a atender. O que não é admissível é que ele vá atender sem a proteção devida", afirma Hideraldo,
Segundo o conselheiro do CFM, as denúncias são investigadas pelo órgão e, caso confirmadas, o diretor do hospital é notificado. Além disso, o Conselho Federal de Medicina registra denúncias no Ministério Público e informa as secretarias de saúde sobre as irregularidades identificadas.
São Paulo e Rio de Janeiro são os estados com mais denúncias — respectivamente, respondem por 21,8% e 11,3% das irregularidades apontadas para o CFM.
De acordo com os dados do órgão, a distribuição de relatos feitos pelos médicos segue a proporção de número de casos e de óbitos: onde há mais pacientes de covid-19 há, também, mais denúncias.
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