Médica defende cloroquina, critica estudos e diz que aceitaria ser ministra
A médica oncologista e imunologista Nise Yamaguchi, que está entre os cotados para assumir o ministério da Saúde após a saída de Nelson Teich, voltou a defender hoje o uso da cloroquina para tratar casos de covid-19 e, sem apresentar provas, criticou estudos que mostraram a toxicidade da substância.
Em entrevista aos jornalistas Diogo Schelp e Tales Faria, colunistas do UOL, a médica evitou criticar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por participar de aglomeração, não foi clara sobre o que pensa a respeito do atual isolamento social adotado no país e disse que aceitaria o desafio de ser ministra da Saúde, mesmo em meio à pandemia.
"Tenho uma vida bastante consolidada, trabalho em Lyon, trabalhei na associação de oncologia dos EUA, é [um trabalho] muito sólido, não precisaria estar me expondo como estou me expondo se não achasse que pudesse salvar vidas", disse.
"Não é simples, mas aceitaria, sim [um convite de Bolsonaro para assumir a pasta]. Não é um desafio que depende da minha pessoa, mas um chamamento de uma sociedade", complementou.
Ela defendeu que o isolamento social seja relaxado. "Praias vazias, sendo que se pode ser distanciamento de 2 metros, parques. Aumentou suicídio, violência doméstica, depressão. Uma pessoa sozinha jamais conseguiria resolver. Não é só cloroquina, é muito mais que isso", acrescentou a médica.
Questionada sobre ter posição parecida com a de Bolsonaro em relação ao uso do medicamento, Nise disse que sua posição é "a mesma de sempre".
De acordo com ela, o posicionamento do presidente foi baseado em estudos. "Ele não teve essa posição por minha causa, foi a partir de conversas que ele teve com setores que tratam disso. Ele recebeu estudos importantes", disse a médica, sem citar porém quais seriam esses estudos.
"Minha questão não é parecida com a do Bolsonaro. Minha posição é anterior a ele. Ele também tem opinião baseada em estudos. Assumir o ministério não depende de mim. Precisa de uma composição de forças no Planalto. Meu papel é apaziguar o povo de onde eu estiver. 30% das pessoas acreditam que vão morrer na pandemia", afirmou.
"Aparentemente, o número de mortes no Brasil é grande, mas vejo pouca gente querendo tratar", complementou. "Vários médicos estão tomando hidroxicloroquina. A gente precisa considerar que o fato de você ter a oportunidade de trazer o paciente para uma situação menos grave", acrescentou.
A hidroxicloroquina é um remédio com cloroquina, mas é considerado um pouco mais segura, com menos efeitos colaterais.
Na entrevista, Yamaguchi evitou criticar a presença de Bolsonaro em aglomerações feitas em Brasília. "Está faltando uma linguagem em comum, as informações não são transversais, não estão trabalhadas a nível de integração. Meu papel é de harmonização", contemporizou sobre o comportamento do presidente.
Estudos contestados
"Sou muito a favor da ciência, por favor, não me confunda", afirmou a médica. Ela defende que há brechas em estudos que apontam a ineficácia do uso da cloroquina no combate à covid-19.
"Daqui um ano, dois, vamos ter as respostas. Vamos poder testar todos os antirretroviráis. Esse estudo não testou contra hidroxicloroquina, contra remédios simples. Não vai nunca dizer se é melhor ou não", iniciou o debate sobre estudos feitos sobre a cloroquina.
Ela citou um estudo feito no Amazonas que "mostrou que a cloroquina matava, que dava arritmia. A cloroquina em doses altas a gente sabe que mata, nem precisa desses estudos".
"Estudo que não tinha sido autorizado previamente. Esse estudo que mostrou que a cloroquina matava, realmente 22 pacientes morreram. A cloroquina em doses altas mata. Já sabemos disso", afirmou.
"É uma tristeza porque o Brasil não deveria fazer um papelão desses", disse sobre o estudo.
"Outro estudo que mostra [a ineficiência da cloroquina] é o estudo dos veteranos que é pobre baseado na evidência. O grupo que tomou era o grupo mais grave e o que não tomou era menos grave e aí eles disseram que os que morreram foi porque tomaram hidroxicloroquina não porque estava mais grave", complementou Nise.
A médica citou que há um estudo do New England Journal of Medicine que mostraria que a toxicidade da hidroxicloroquina é baixa. Porém a mesma publicação divulgou o maior estudo com mais de 1.300 pessoas apontando que o uso da substância é ineficaz contra o novo coronavírus.
Um estudo feito pelo Journal of the American Medical Association (JAMA) também apontou a ineficácia do tratamento e destacou ainda que a hidroxicloroquina pode causar problemas no coração, tanto sozinha como quando associada à azitromicina.
Desde o início da pandemia, cientistas do mundo todo têm feito testes para avaliar a eficácia e segurança do remédio contra o novo coronavírus (Sars-CoV-2), mas até hoje não há consenso na comunidade científica.
A médica citou ainda um relatório da Prevent Sênior que aponta casos tratados no Brasil. "Existe aí uma diferença do que é uma conduta e do que pode servir. Estudos são avaliações retrospectivas de análise e não mostraram aumento de toxicidade", disse.
Amiga de Teich
Yamaguchi é um dos nomes cotados para ocupar a vaga de Nelson Teich no Ministério da Saúde. Sem detalhar o motivo, Teich pediu demissão do cargo na última sexta-feira (15), menos de um mês após assumir a pasta. Disse apenas que foi uma escolha pessoal. Yamaguchi revelou ser amiga do ex-ministro ao UOL.
"Somos amigos há muitos anos. O doutor Nelson saiu por questões pessoais. Ele tinha feito um programa de organização do ministério, colocou a AGU, TCU, não tinha conseguido todos os materiais de testagem. Nelson colocou que foram questões absolutamente pessoais. Meu papel é técnico e suprapartidário", afirmou.
Teich foi o segundo ministro da Saúde a deixar a função durante a pandemia. Antes dele, Luiz Henrique Mandetta foi demitido. Ambos eram pressionados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para adotar a cloroquina como protocolo em casos leves provocados pelo novo coronavírus e relaxar o isolamento social.
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