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"Vamos morrer mesmo": banhistas lotam praias de Santos apesar de restrições

Maurício Businari

Colaboração para o UOL, de Santos

31/01/2021 21h20Atualizada em 01/02/2021 11h48

Era como se a fase vermelha não houvesse sido decretada aos finais de semana por João Doria (PSDB). Apesar das restrições, as praias de Santos, no litoral de São Paulo, ficaram cheias neste que foi o primeiro domingo ensolarado com as novas regras mais restritas. A diferença é que as pessoas deixaram de se concentrar na faixa de areia seca — por conta da proibição de uso de cadeiras e guarda-sóis — e se aglomeraram na faixa de areia úmida, à beira-mar, onde era impossível transitar sem esbarrarem uns nos outros.

As cidades da Baixada Santista se encontram, atualmente, na fase laranja durante os dias úteis. Nos finais de semana, feriados e a partir das 20h nos dias úteis, elas passam para a fase vermelha. Os quiosques da orla, por exemplo, só podem atender pedidos por delivery, sem consumo ou retirada de produtos no local. O uso de máscaras pelos banhistas é obrigatório.

As restrições atingem também as atividades físicas e esportivas, tornando permitidas apenas as individuais (corrida e caminhadas). Barracas de alimento e vendedores ambulantes estão proibidos de funcionar; assim como se torna proibido o consumo de bebidas alcoólicas e refeições ao longo de toda a orla.

A multa para quem descumprir o Código de Postura do Município varia de R$ 1,5 mil a R$ 12 mil, segundo a prefeitura. A fiscalização na orla é realizada pela Guarda Civil Municipal (GCM).

Banhistas compareceram neste domingo (31) à Praia do Gonzaga, em Santos (SP), apesar das restrições decorrentes da pandemia do novo coronavírus - Fernanda Luz/UOL - Fernanda Luz/UOL
Banhistas compareceram neste domingo (31) à Praia do Gonzaga, em Santos (SP), apesar das restrições decorrentes da pandemia do novo coronavírus
Imagem: Fernanda Luz/UOL

Alheios a tudo isso, paulistanos e turistas vindos de outras regiões do Estado escolheram as praias de Santos como parada de descanso e lazer neste domingo. A maioria, dispensando o uso de máscaras e proteções faciais. E, nas proximidades do Canal 2, sentados em cadeiras e com guarda-sóis montados como se fosse um dia comum.

A Prefeitura de Santos afirmou à reportagem que a fase vermelha vale aos finais de semana para todo o estado e que o município decretou regras ainda mais rígidas do que as vigentes no Plano SP.

Neste sábado (30) e domingo (31), a Guarda Civil Municipal (GCM) realizou 1.795 orientações a banhistas sobre o uso da faixa de areia, 595 orientações sobre a obrigatoriedade sobre o uso da máscara, e aplicou três multas pelo não uso da máscara. Vale lembrar que a multa (de R$ 100,00) só é aplicada se a pessoa não tem o item consigo e/ou se recusa a usá-lo.

"Pra quê?"

Apesar da pandemia, nem todos os frequentadores da Praia do Gonzaga, em Santos (SP), usavam máscaras neste domingo (31) - Fernanda Luz/UOL - Fernanda Luz/UOL
Apesar da pandemia, nem todos os frequentadores da Praia do Gonzaga, em Santos (SP), usavam máscaras neste domingo (31)
Imagem: Fernanda Luz/UOL

Foi exatamente num trecho entre a Avenida Bernardino de Campos e a Avenida Ana Costa que a reportagem do UOL avistou uma viatura da GCM, parando ao lado dos turistas e solicitando que fechassem os guarda-sóis. Em nenhum momento os ocupantes do veículo desceram ou pediram que as pessoas recolhessem suas cadeiras, esteiras ou usassem máscaras.

Um ambulante que comercializava bebidas irregularmente no momento da chegada dos guardas fugiu correndo. Já os banhistas, ao serem abordados, apenas fechavam seus guarda-sóis, esperando a viatura se afastar e os abriam novamente.

"Vieram pedir para a gente fechar o nosso guarda-sol porque poderia dar problema", contou o comerciante paulistano Hamilton Prone.

Eu acho que é exagero tudo isso. Para quê? Já escolhemos ficar aqui, na parte seca, para mostrar que estávamos isolados. E eles vêm e pedem pra gente fechar o guarda-sol? De que adianta isso? O resultado pode ser uma insolação, já que não vamos sair da praia, vamos permanecer aqui nas cadeiras."
Hamilton Prone, comerciante

Sobre a montagem de guarda-sóis e cadeiras na faixa arenosa, conforme a legislação vigente, a GCM realizou o trabalho de conscientização sobre as regras, que proíbem o uso destes itens na faixa de areia, aos sábados e domingos. Nesses casos, não há multa prevista, até o momento.

"Vamos todos morrer mesmo"

Público compareceu em grande número à Praia do Gonzaga, em Santos (SP), neste domingo (31), mesmo com as restrições provocadas pela covid-19 - Fernanda Luz/UOL - Fernanda Luz/UOL
Público compareceu em grande número à Praia do Gonzaga, em Santos (SP), neste domingo (31), mesmo com as restrições provocadas pela covid-19
Imagem: Fernanda Luz/UOL

Sem a presença costumeira dos ambulantes de alimentos e bebidas, e apesar das restrições, os banhistas se viraram como puderam, levando latinhas de cerveja em caixas de isopor e alimentos em sacolas térmicas.

Alguns levaram até caixas de som e animaram os banhistas ao redor, que dançavam ao som de clássicos do Funk carioca. Todos aproveitando o domingão da fase vermelha, como o paraibano Eduardo Gomes dos Santos, que mora e trabalha em São Paulo como segurança.

"Esse negócio de covid aí não é como todo mundo fala, não. Olha eu, aqui, sem máscara. Não pega nada, não. Todo mundo é livre para usar ou não a máscara, ninguém pode me obrigar. Isso aí é só uma gripezinha, é só tomar remédio e cuidar em casa", afirmou, ecoando o discurso adotado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) desde o início da pandemia.

"Por que a gente pode se aglomerar num ônibus mas não pode curtir a praia? Que raio de lei é essa? Eu posso me matar no trabalho, mas aqui não posso? Quer saber? Vamos todos morrer mesmo, então eu vou é aproveitar", prosseguiu.

Dizem aí que o vírus é invisível, que a gente não vê. Só que pecado também é invisível, a gente não vê. Mas Deus é quem vê e sabe de tudo. Isso tudo é mentira dos governadores para nos manterem presos, Deus sabe disso."
Eduardo Gomes dos Santos, segurança

Nós temos que mostrar para esses maiorais, para esse Dória (governador de São Paulo, responsável pelo Plano SP), que nós não somos escravos. Somos um povo livre. Como diz o presidente, vamos todos morrer um dia, mas não precisamos viver presos como esses governantes querem. Existem tantas outras doenças aí! H1N1, dengue... Por que cismaram com essa covid?"
Solange Avena Prone, empresária

Mesmo com a proibição de ambulantes, guardas-sóis e cadeiras, banhistas curtiram o domingo de sol em Santos (SP) - Fernanda Luz/UOL - Fernanda Luz/UOL
Mesmo com a proibição de ambulantes, guardas-sóis e cadeiras, banhistas curtiram o domingo de sol em Santos (SP)
Imagem: Fernanda Luz/UOL

Santos tem mais que o dobro de mortes que média do estado

A região da Baixada Santista, no litoral de São Paulo, registrou 307 novos casos confirmados de Covid-19 neste sábado (30). Boletins epidemiológicos divulgados pelas cidades registraram oito mortes causadas pela doença nas últimas 24 horas.

Ao todo, a Baixada soma 93.887 confirmações e 3.070 mortes por covid-19. São 2.633 casos suspeitos, 100 óbitos sendo investigados e 81.269 pacientes recuperados. O número de hospitalizados é de 245.

Santos aparece como o município com o maior número de internações, registrando neste sábado 201 pacientes hospitalizados com sintomas da doença. Na cidade, a taxa de ocupação geral dos 615 leitos de Covid-19 disponíveis está em 33%. Entre os 273 leitos de UTI, a ocupação é de 43%. No SUS, a taxa é de 34%, e na rede privada, de 57%.

Levantamento da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) revelou que Santos, apesar de ter registrado uma redução de aproximadamente 20% no número de mortes em janeiro deste ano, apresenta mais que o dobro de mortes na comparação com a média do Estado. São 233,8 falecimentos/100 mil habitantes, o que deixa o município com a vice-liderança nesse ranking.

Brasil registrou 563 mortes decorrentes da covid-19 em 24 horas, mas pandemia não afastou público da praia em Santos (SP) - Fernanda Luz/UOL - Fernanda Luz/UOL
Brasil registrou 563 mortes decorrentes da covid-19 em 24 horas, mas pandemia não afastou público da praia em Santos (SP)
Imagem: Fernanda Luz/UOL

Estamos fazendo a nossa parte na infraestrutura para atendimento de pacientes, com leitos suficientes, de testes, mas precisamos da colaboração de todos neste momento mantendo o distanciamento social. A pandemia não acabou.
Mantivemos uma ampla fiscalização nas praias, o que reduziu a quantidade de guarda-sol nas areias, nos estabelecimentos comerciais e nos demais locais públicos, mas é fundamental a conscientização de moradores e turistas respeitando as regras enquanto a vacina não está disponível para toda a população.
Depois de tudo que já vimos a respeito, é lamentável ter que multar alguém por conta da falta de uso de máscara, mas fizemos isso."

Rogério Santos, prefeito

Apesar disso, o prefeito de Santos e presidente do Conselho de Desenvolvimento da Baixada Santista, Rogério Santos (PSDB), enviou um pedido de revisão da classificação da Baixada Santista no Plano São Paulo ao Governo do Estado nesta sexta-feira (29), levando em consideração indicadores divulgados no último boletim do Governo de São Paulo.

Ele se baseia no fato de que nesta sexta-feira (29), na última atualização divulgada, os dados de ocupação de leitos UTI para pacientes com Covid-19, novos casos, internações e óbitos pela doença apresentaram classificações referentes ao necessário para as fases verde e amarela do plano. A próxima reclassificação das regiões do estado no Plano SP está prevista para acontecer até o dia 8 de fevereiro, caso a solicitação do prefeito não seja aceita.