Vacina anunciada pelo governo federal tem suspeita de conflito de interesse
O MPC (Ministério Público de Contas) e o TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) suspeitam de um possível conflito de interesses no desenvolvimento de uma vacina contra covid-19. O imunizante foi destacado pelo Ministério da Saúde no dia 26 de março, mas está com problemas na pesquisa e no desenvolvimento.
O possível conflito de interesses foi apontado porque supostamente o professor doutor da USP (Universidade de São Paulo), Célio Lopes, que é responsável pela pesquisa, integrou o quadro societário da Farmacore, empresa que pretende negociar a vacina, caso ela seja viabilizada. Ele trabalhou na empresa entre janeiro e agosto de 2020.
Além disso, o pesquisador consta como consultor científico da empresa em seu cadastro na Junta Comercial, de acordo com o MPC. O órgão também afirmou, em relatório encaminhado ao TCE, que foi solicitado ao Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento de Imunobiológicos da FMPR-USP R$ 3,8 milhões outorgados diretamente a Silva para desenvolver a pesquisa.
Os recursos viriam do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), do governo federal, e não passariam pelo orçamento da universidade.
Nota-se, portanto, que, na condição de agente público coordenador das atividades de pesquisa realizadas nas dependências
da USP em virtude do convênio e de beneficiário de auxílio custeado com verbas públicas, o pesquisador também integrava o quadro societário da empresa que explorará comercialmente o imunizante produzido, mantendo sua relação comercial com a sociedade empresária mesmo após a sua retirada, como consultor científico.
João Paulo Giordano Fontes, procurador do Ministério Público de Contas de São Paulo
Outro ponto levantado pelo procurador é que o endereço de Silva que consta no documento de admissão como acionista da Farmacore é o mesmo da CEO da empresa, Helena Faccioli Lopes. De acordo com o relatório, a informação foi alterada posteriormente na Junta Comercial.
Segundo o procurador, isso pode ser um indício de parentesco entre o pesquisador e a presidente da empresa.
"Nesse prisma, infere-se possível relação de parentesco entre os agentes citados, o que reforçaria o vínculo do pesquisador público com a sociedade privada, com potencial prejuízo ao princípio da impessoalidade na elaboração e celebração do convênio", disse Fontes no relatório enviado ao TCE.
TCE e MPC querem novos esclarecimentos
O conflito de interesses foi apontado inicialmente por um despacho do conselheiro do TCE-SP Antonio Roque Citadini. A USP respondeu ao despacho, mas tanto o MPC quanto Citadini pediram novos esclarecimentos nesta semana.
Os órgãos querem que "seja esclarecido o grau de relacionamento das partes interessadas" e questiona a utilização de recursos materiais e de pessoal da universidade
Uma das linhas de pesquisa foi abandonada, mas o convênio com a USP foi mantido. E o MPC considera que o acordo atual é suspeito, pois a USP só lucrará com 5% de possíveis ganhos da empresa sobre a vacina. "Interessa, neste caso, saber qual o critério e justificativa utilizados para essa repartição percentual, aparentemente tão desproporcional".
A vacina desenvolvida pela USP e pela Farmacore teve recursos cortados na aprovação do Orçamento. O Ministério de Ciência e Tecnologia apostava num aporte de R$ 200 milhões para a pesquisa, mas o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cortou o valor. O Ministro da Ciência e Tecnologia, o astronauta Marcos Pontes, qualificou esse corte como um "estrago".
USP diz que convênio foi regido por 'normas habituais'
Procurada pelo UOL, a FMRP-USP confirmou a existência do convênio entre a USP e a empresa Farmacore, por meio da parceria com o laboratório coordenado pelo pesquisador Celio Lopes da Silva. Em nota, a instituição afirmou que a parceria envolve estudos e testes em animais para o desenvolvimento de vacinas de uso veterinário e em humanos.
No caso do projeto para o desenvolvimento da vacina contra a covid-19, a faculdade disse que o convênio celebrado com a empresa foi "regido pelas normas habituais da USP e aprovado pelas instâncias competentes, com responsabilidades e obrigações da USP e Farmacore previamente explicitadas, assim como a justificativa para divisão da propriedade intelectual do referido convênio".
A instituição informou ainda que o professor Celio Lopes da Silva tem seu regime de trabalho aprovado pela CERT (Comissão Especial de Regimes de Trabalho) e que os termos do convênio, o plano de trabalho e todas as suas implicações serão fornecidos ao TCE.
Também procurada, a Farmacore afirmou que não foi comunicada formalmente sobre nenhum pedido de esclarecimento por parte do TCE.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.