Variante delta: Pesquisa aponta disparada de casos em São Paulo em setembro
Apesar da decisão do governo João Doria (PSDB) de autorizar a reabertura total do comércio e setor de serviços em São Paulo, uma pesquisa projeta o avanço da covid-19 na capital paulista nas próximas semanas.
Levantamento da Info Tracker, sistema de monitoramento da pandemia das universidades paulistas USP e Unesp, confirma que a variante delta já responde pelo aumento dos casos no Rio e prevê que o mesmo aconteça a São Paulo a partir do mês que vem.
De acordo com a Gisaid —plataforma internacional de dados genômicos indicada pela Opas (Organização Pan-Americana de Saúde)—, o número de casos mapeados da delta no Brasil aumentou 74% nas últimas quatro semanas.
"Embora a vacina vá ajudar na contenção, as pessoas precisam se preparar mentalmente para essa mudança de tendência da pandemia, porque vai acontecer", diz um dos coordenadores da Info Tracker, o professor da Unesp Wallace Casaca.
Para chegar a uma projeção sobre quando a variante delta ganhará força em São Paulo, a pesquisa levou em consideração a data de chegada da cepa em Israel, Nova York e Londres e quanto tempo ela precisou para aumentar as infecções nessas regiões, escolhidas por terem população semelhante à de São Paulo.
Os aumentos começaram a acontecer 80 dias, em média, após o surgimento da delta, calcula a plataforma. Enquanto o primeiro caso da cepa foi identificado em abril em Londres (dia 2), Nova York (10) e Israel (16), no Rio de janeiro o primeiro infectado com essa variante foi registrado em 26 de maio e, em São Paulo, no dia 21 de junho.
Chamado pelo prefeito Eduardo Paes (PSD) de "epicentro da covid" na última sexta-feira (13), o Rio de Janeiro decidiu reabrir leitos exclusivos para a doença depois que a ocupação na terapia intensiva chegou a 95% na capital. No estado, ao menos sete municípios estavam ontem com ocupação máxima nos leitos de UTI para covid-19. A ocupação na rede pública estadual é de 70%, o maior índice desde 13 de junho, quando 71% dos leitos de UTI para a doença causada pelo coronavírus estavam ocupados.
Os laboratórios utilizados pela prefeitura informam prevalência em 56,6% da nova cepa nas amostras recolhidas em agosto na capital fluminense. Por lá, os casos por 100 mil habitantes caíram a 9,91 em 29 de maio, menor patamar desde que a nova variante foi identificada. Desde então, essa proporção cresceu e hoje está a 17,62.
No Rio, a situação é mais grave, porque já atingiu a tendência de alta sustentada, embora ainda não esteja no mesmo patamar de pico de Nova York, Londres e Israel.
Wallace Casaca, coordenador da Info Tracker
Em São Paulo, o secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido, diz que os próximos dias serão cruciais para saber se a vacinação em massa conseguirá frear as novas variantes.
Cerca de 20,3% dos casos na região metropolitana de São Paulo são da variante delta até 14 de agosto, segundo o Instituto Adolfo Lutz. Mas os 231 casos delta rastreados pelo laboratório podem se somar a outras 169 suspeitas "em investigação". Na capital paulista, os casos ainda são estáveis em 11,93 por 100 mil habitantes, mas a tendência é seguir o padrão das regiões analisadas.
"O aumento ainda é pequeno em São Paulo, mas será perceptível e com elevação acentuada a partir da segunda quinzena de setembro", diz o especialista.
Delta no mundo
De acordo com a Opas, a delta já representa 90% das amostras do vírus sequenciadas no mundo. Identificada primeiro na Índia, a cepa se tornou dominante na Europa no fim do mês passado, segundo comunicado da OMS (Organização Mundial da Saúde) em 23 de julho. Nos Estados Unidos, ela corresponde a 83% das infecções, diz o CDC (Centro para Controle e Prevenção de Doenças).
Apesar da possibilidade de aumento de casos, o governo de São Paulo derrubou as restrições de circulação baixadas em 24 de março do ano passado ao comércio e setor de serviços, decisão precipitada, diz a infectologista Joana D'arc Gonçalves da Silva, médica do Hospital Regional da Asa Norte, em Brasília.
"O ideal é que o Brasil aumente as restrições de circulação. O problema agora é a população seguir as orientações", diz a médica. "Falta fiscalização e o brasileiro tem dificuldade em seguir essas normas, basta ver as aglomerações nos aeroportos apesar da demarcação de distância entre as pessoas no chão."
Ela critica principalmente a abertura de bares e restaurantes porque "as pessoas bebem e abandonam o cuidado". "A boa notícia", diz, é que "até o momento a delta não está associada à maior gravidade e mortalidade", apesar de muito mais transmissível.
Dados publicados pelo governo britânico indicam que a cepa é até 60% mais contagiosa do que a variante alfa (detectada na Inglaterra) e quase duas vezes mais transmissível do que a cepa original.
Vacinação lenta
"O problema no Brasil é o número muito baixo de vacinados", diz a infectologista. Cerca de 31% dos brasileiros com mais de 18 anos estão totalmente imunizados, muito abaixo dos 70% de imunização total necessária para que a transmissão seja controlada de fato.
Estudo publicado no "New England Journal of Medicine" indica que a efetividade da primeira dose cai de 50% para 35% contra variante delta, reforçando a importância da segunda dose. Já a aplicação das duas doses da vacina da Pfizer ou da AstraZeneca resultou em eficácia superior a 90% contra hospitalizações causadas pela delta, segundo o NHS, o órgão britânico de saúde pública.
"Além da vacina, é preciso investir na mudança de comportamento do indivíduo: usar máscara corretamente e ficar em quarentena", afirma a médica.
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