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RJ: Reabertura e imunidade explicam por que idoso é principal alvo da covid

Lola Ferreira

Do UOL, no Rio

25/08/2021 04h00

Sete meses após o início da campanha de vacinação de idosos no Rio de Janeiro, o grupo de pessoas com mais de 60 anos voltou a ser o mais afetado pela covid-19 no estado.

A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) explica que o aumento na proporção de idosos diagnosticados e mortos com covid-19 no Rio está relacionado à alta transmissão do vírus (o estado sofre hoje com o avanço da variante delta), ao efeito do avanço da vacinação nas diferentes faixas etárias e à baixa imunidade dos idosos.

Essa tendência foi percebida a partir de junho, segundo dados do Observatório Covid-19 da Fiocruz. Nas primeiras semanas do ano, antes da vacinação, idosos eram 99% dos mortos por covid no Rio. Com a vacinação, essa proporção caiu até atingir 86% em meados de junho. Desde então, permanece estável, oscilando em torno desse índice.

Os casos e óbitos de idosos ficaram proporcionalmente mais baixos nos primeiros meses da campanha de vacinação porque os jovens ainda não haviam tomado a vacina, conforme explica Marcelo Gomes, coordenador do boletim InfoGripe e pesquisador da Fiocruz.

Agora, com os níveis de vacinação crescendo entre a população com menos de 60 anos, a tendência é de que os idosos sejam sempre os mais suscetíveis à doença por fatores biológicos. O estado do Rio tem 31,8% da população adulta com esquema vacinal completo.

Neste mês, a SES (Secretaria Estadual de Saúde) já registrou ao menos 1.007 óbitos de idosos por covid-19. Estima-se contudo que esse número seja maior porque nem todos os casos foram registrados no sistema.

Proteção coletiva para proteger idosos

Especialistas em saúde explicam que, em um cenário ideal com todos vacinados, os idosos sempre serão os principais alvos da doença, em razão da baixa imunidade.

Marcelo Gomes afirma que, para frear o alto contágio entre idosos, o vírus precisa parar de circular.

"Estamos vivendo uma armadilha de achar que no momento atual, mesmo com duas doses, as vacinas resolvem tudo. Há mais pessoas circulando, mais interações, a adesão ao uso de máscaras caindo. Tudo influencia no aumento de casos e diminui a proteção coletiva dos idosos", afirma.

No estado do Rio de Janeiro, a capital é responsável pela maioria dos casos e óbitos. Na última semana, o município teve o pico de casos registrados de covid-19 do ano: 47.215.

Na capital, com exceção de boates e festas pagas, todos os outros estabelecimentos podem funcionar com capacidade de 60% em lugares abertos, distanciamento e uso de álcool para higiene das mãos. O prefeito Eduardo Paes (PSD) diz que só deve endurecer as restrições se o aumento das infecções evoluir para casos graves e mortes.

A vacina indiscutivelmente ajuda, mas não é uma barreira intransponível nem a solução de todos os problemas. É parte importante e fundamental, mas não a única."
Marcelo Gomes, pesquisador da Fiocruz

O epidemiologista Danilo Klein afirma que a proteção coletiva —segundo ele, mais importante que a individual— deve ser perseguida agora.

"Quando estamos numa grande onda, pensamos mais na proteção individual: 'quero que o idoso da minha família se vacine para pegar a doença de uma forma branda'. Mas agora precisamos pensar no coletivo: todos vacinados para que não haja circulação [do vírus] e esse idoso nem pegue a doença."

O que é imunossenescência

A imunossenescência é a maior suscetibilidade biológica dos idosos a doenças. Em linhas gerais, é o fenômeno de envelhecimento do sistema imunológico.

Com o passar do tempo, nossos órgãos envelhecem fisiologicamente, o que aumenta as chances de infecção e reduz a resposta vacinal —para covid e outras doenças.

Médica geriatra no Hospital São Vicente de Paulo, Alessandra Ferrarese explica que se trata de um processo fisiológico natural, pelo qual todos passam. Existem contudo idosos com resposta imunológica melhor que a de outros —o que explica por exemplo o fato de contraírem a doença e se curarem.

"Todos os idosos têm maior suscetibilidade do que os jovens. Mas cada idoso é único e é impossível comparar indivíduos, mesmo os da mesma idade. Há fatores como a resposta imunológica, doenças pré-existentes e carga viral da doença", afirma Alessandra.

Dose de reforço pode aumentar resposta imunológica

Acompanhando o dia a dia de idosos, a médica aponta que já percebeu nos atendimentos a necessidade de uma dose de reforço, exatamente em razão da imunossenescência.

A vacina foi fundamental e chegou num prazo bacana, mas já faz alguns meses e parece adequado o reforço para aumentar a resposta imunológica de idosos."
Alessandra Ferrarese, médica geriatra

Marcelo Gomes lembra que várias vacinas têm eficácia mais baixa na população idosa. Por isso, defende o pesquisador da Fiocruz, o Brasil deve avançar na discussão sobre o reforço.

"Tem a questão da disponibilidade de doses, que é um cobertor curto. Mas o que não podemos fazer é nos furtar de discutir seriamente essa necessidade", diz.

Nesta semana, a cidade do Rio anunciou que programa para setembro a aplicação de dose de reforço em idosos. O planejamento ainda não encontra eco no PNI (Plano Nacional de Imunização), que libera as doses para estados e, posteriormente, chega aos municípios.

Marcelo Queiroga, ministro da Saúde, afirmou que o reforço só acontecerá quando o país avançar na segunda dose para maior parte da população.