Covid: Mudança na Saúde gera pico artificial com 92 mil casos ocultos no RJ
O estado do Rio de Janeiro foi responsável por 84% dos casos de covid-19 de todo o país no sábado (18). No entanto, apesar de computados agora nas estatísticas, 92.614 dos 105.700 registros do RJ são antigos, sendo 38% do ano passado.
A SES (Secretaria de Estado de Saúde) atribui o pico artificial a casos represados que foram "encontrados" após atualização do sistema de notificação do Ministério da Saúde. Mas tanto o RJ quanto a Saúde não explicaram por que até então esses registros eram desconhecidos.
A soma dos casos ocultos distorceu a média diária nacional de casos —o índice que marcou 18.273 na sexta (17) subiu para 34.127 no dia seguinte —e gerou questionamentos sobre o atual momento epidemiológico no estado.
Todos os 92,6 mil registros escondidos se referem a casos leves da doença, já que os números de casos graves e óbitos são inseridos em outros sistemas.
O que dizem o RJ e a Saúde
A secretaria afirma que o e-SUS, sistema do Ministério da Saúde que registra os casos de covid-19, foi atualizado, o que exigiu um "ajuste de base" por parte do Rio para extrair os dados.
O UOL questionou a SES sobre quais ajustes foram feitos e se houve mudança nos critérios de classificação da doença ou na forma de leitura dos dados.
Em resposta por telefone, a assessoria de imprensa da pasta disse apenas que os ajustes estão em curso, sem dar detalhes.
Já o Ministério da Saúde informou que as mudanças no e-SUS foram feitas para "para melhor atender às ações de vigilância".
A pasta disse que houve a inclusão de novos campos relacionados ao tipo de teste para detectar a covid-19. No entanto, não associou diretamente essa mudança ao pico artificial de casos.
O estado de São Paulo, que também enfrenta problemas com a atualização do sistema, informou que os casos encontrados somente agora não haviam sido identificados no sistema antigo.
No dia 17, o estado registrou 23.586 casos —destes, apenas 153 nas 24 horas anteriores. Antes desse pico de casos, a SES de SP informou ter identificado no sistema da Saúde a ampliação dos tipos de testes para classificar a doença.
Tanto o Rio quanto São Paulo relatam que estão "empenhados" para se adaptar ao novo sistema.
Ao UOL, o Ministério da Saúde informou que houve treinamento para os estados e um período de adaptação. "Até o momento, o ministério não foi procurado por nenhum estado relatando problemas", afirmou a pasta, por meio de nota.
Análise de cenário
Alberto Chebabo, vice-presidente na Sociedade Brasileira de Infectologia, afirma que o represamento de casos leves não têm o mesmo peso que os registros graves e óbitos na análise do cenário epidemiológico.
"Número de casos leves também [baseiam políticas de saúde], mas são muito menos importantes que casos graves, pois estes são os que impactam na questão dos leitos e na mortalidade", disse o médico.
A SES do RJ explicou que a análise de risco dos municípios, bem como as decisões de combate à pandemia de covid-19, são feitas a partir da data em que os infectados manifestam os primeiros sintomas, e não quando os casos entram no sistema.
Por isso, mesmo com o pico de registros, o estado mantém apenas uma das oito regiões administrativas com risco alto para a covid. A avaliação de risco considera a taxa de ocupação dos leitos de UTI e de enfermaria, previsão de esgotamento dos leitos, número de óbitos, casos e casos graves.
Casos do RJ estão concentrados em 25 municípios
O UOL analisou, a partir do total de registros da última semana, onde estão concentrados os casos notificados tardiamente no Rio. Dos 92 municípios, 25 se destacam pelo alto número de casos semanais, que diverge do padrão da pandemia até então.
O município com maior acúmulo é Barra Mansa, que divulgou 13.037 casos em toda a semana, incluindo o sábado. A última semana com maior registro havia sido em janeiro, com 1.091 casos. Entre os dias 5 e 11 deste mês, Barra Mansa registrou 283 casos de covid.
Ontem, o município tinha 24% dos leitos de UTI para covid ocupados. O risco do município para a covid-19 está baixo pela SES, com 6 pontos numa escala que vai até 30.
Apenas dois municípios que estão entre os 25 com mais registros têm risco considerado alto —Itaperuna e Santo Antônio de Pádua, com 20 e 22 pontos na escala até 30.
Em Itaperuna, a média de casos notificados por semana é de 95 durante toda a pandemia, mas na semana em que os dados "apareceram" houve 7.308 registros. Antes, a pior semana havia sido em julho de 2020, com 472. Atualmente, oito dos dez leitos de UTI para covid no município estão ocupados.
Em Santo Antônio de Pádua, a média de casos registrados semanalmente é de 70, mas o pico alcançou 1.493 na última semana. O município não tem leitos de UTI para covid.
Outros 11 municípios estão com risco alto, 16 com risco moderado e a maioria (83) com risco baixo.
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