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Covid, VRS e gripe: Cresce internação de crianças em hospitais de SP

Especialistas chamam atenção para as infecções respiratórias causadas pela epidemia de três diferentes vírus em crianças - Getty Images
Especialistas chamam atenção para as infecções respiratórias causadas pela epidemia de três diferentes vírus em crianças Imagem: Getty Images

Do UOL, em São Paulo

19/11/2022 04h00

A internação de crianças com doenças respiratórias, incluindo a covid-19, aumentou em hospitais da cidade de São Paulo. A baixa taxa de vacinação para essa faixa etária contra a gripe e o coronavírus, além da circulação de diferentes vírus ao mesmo tempo, são apontadas por médicos ouvidos pelo UOL Notícias como alguns dos motivos para o aumento.

A pedido do UOL, levantamento feito pelo Info Tracker —plataforma de monitoramento da covid-19 da USP (Universidade de São Paulo) e Unesp (Universidade Estadual Paulista)— junto a três hospitais de referência em atendimento infantil da rede pública da capital mostra que internações em decorrência do coronavírus dobraram em apenas 13 dias (veja abaixo a evolução dos casos de doenças respiratórias em crianças em seis hospitais privados).

Coordenadora das unidades de internação pediátrica do Hospital Sírio-Libanês, a pediatra Lucilia Santana Faria relata que a ala pediátrica e o pronto-socorro do centro de saúde estão lotados. Segundo a médica, as internações começaram a crescer em setembro, mas neste mês "de 60% a 70% das crianças estão internadas com quadro [de problema] respiratório".

Os especialistas chamam atenção para infecções respiratórias causadas pela epidemia de três diferentes vírus, a chamada tripledemia a coexistência de três epidemias virais respiratórias. Os vírus são: Sars-Cov-2, causador da covid-19, VRS (vírus sincicial respiratório) e influenza, da gripe.

"São vários vírus circulando ao mesmo tempo", diz Lucilia Faria. "Antes ocorria no outono e inverno, agora está o ano todo, particularmente agora, mesmo na primavera."

Os casos mais frequentes são de bronquiolite, uma inflamação dos bronquíolos causada por um dos vírus da tripledemia, o VSR (vírus sincicial respiratório).

"Em setembro e outubro, houve um aumento significativo dos casos de bronquiolite", afirma Juliana Okamoto, pediatra do Hospital Santa Catarina-Paulista. "Além destas doenças em circulação, há também mais dois vírus em alta no Brasil: o influenza e o vírus sincicial respiratório. Este cenário é preocupante, pois dois ou mais tipos de infecções respiratórias afetando uma população simultaneamente é um sinal de alerta."

Já Hamilton Robledo, pediatra da Rede de Hospitais São Camilo São Paulo, atribui o "aumento dos quadros respiratórios em crianças" ao isolamento social após o surgimento da covid-19.

"Ocorreu um represamento da circulação de muitos vírus", diz. "Crianças nascidas a partir do segundo semestre de 2019 nunca haviam sido expostas a vírus ou tido contato com outras crianças. Agora, estão se infectando com maior frequência."

Ele explica que os patógenos competem entre si. Além da Sars-Cov2, causador da covid, há "outros agentes infecciosos, como influenza, SRV e rotavírus, causador da gastroenterocolite [inflamação gastrointestinal]".

Um dos motivos é a baixa cobertura vacinal contra a gripe. Como tivemos um surto em dezembro de 2021, muitas mães acharam que as crianças já estavam imunizadas, mas a cobertura dura seis meses. Este ano teriam de ser revacinadas. Esses são os fatores que têm determinado o aumento de casos [de problemas] respiratórios na criança."
Hamilton Robledo, pediatra

Vacinação infantil patina. Até o dia 1º deste mês, 1.955 crianças com menos cinco anos morreram de covid desde o início da pandemia —foram 280 só neste ano, segundo dados do Observa Infância, iniciativa da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e da Unifase (Centro Universitário Arthur Sá Earp Neto).

Quatro meses após a aprovação do uso emergencial da CoronaVac em crianças de três e quatro anos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), apenas 5,5% da população brasileira dessa faixa etária recebeu as duas doses da vacina.

Dados do Vacinômetro Covid-19 do Ministério da Saúde levantados pelo Observa Infância no dia 7 deste mês indicam que 938.411 crianças de três e quatro anos tomaram a primeira dose da vacina contra a covid, enquanto 323.965 tomaram as duas doses do imunizante. Há no Brasil 5,9 milhões de crianças nessa faixa etária.

Questionado, o Ministério da Saúde afirmou que, no dia 10, iniciou a distribuição "de forma proporcional e igualitária" de 1 milhão de doses pediátricas contra a covid "destinadas a crianças de seis meses a menores de três anos com comorbidades".

Lucilia disse ter notado nos últimos dias um aumento nos casos de covid-19 entre crianças. "Não são tão graves como no início da pandemia, mas há aumento."

A razão, diz ela, é a baixa taxa de vacinação. "Até recentemente as crianças com menos de cinco anos não eram vacinadas. Recentemente foi liberado para crianças com mais de seis meses com alguma comorbidade", explica.

Eu pessoalmente recomendo a vacinação de todas as crianças porque a vacina protege de infecções graves."
Lucilia Santana Faria, pediatra

Menino, criança, tomando vacina, vacinado, vacinação infantil - iStock - iStock
Quatro meses após a aprovação do uso emergencial da CoronaVac em crianças de 3 e 4 anos, apenas 5,5% da população dessa faixa etária recebeu as duas doses
Imagem: iStock

Questionado sobre a proibição da imunização de crianças sem comorbidade, o Ministério da Saúde afirmou em nota que, "com o fim da Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional, a possibilidade da ampliação das doses para as crianças nessa faixa etária sem comorbidades será avaliada pela Conitec [Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS]."

Dados de hospitais privados referência em atendimento infantil

Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo: Na quinta-feira (17), 51 pacientes estavam internados em alas pediátricas do hospital para tratamento de quadros respiratórios, 17 em UTIs (Unidades de Terapia Intensiva). O aumento é de 82% em comparação com as 28 crianças hospitalizadas 30 dias antes.

Hospital da Criança, da Rede D'Or São Luiz: O Hospital da Criança registrou na segunda semana de novembro um aumento de 16,8% no número de atendimentos no pronto-socorro em relação à primeira semana do mês. Houve uma elevação de 10% na taxa de ocupação hospitalar comparada à segunda quinzena de outubro. Os casos respiratórios motivaram a maioria das internações com taxa de positividade para covid 11% maior comparada ao mês de outubro, quando havia predomínio dos vírus influenza A e sincicial respiratório.

"O cenário atual reforça a importância da vigilância pediátrica para sintomas respiratórios como tosse e coriza e, principalmente, sinais de alerta para gravidade como cansaço para respirar, desânimo persistente ou sonolência e dificuldade para alimentação", afirma Maria Augusta Junqueira Alves, diretora-geral do Hospital da Criança. "Em caso de dúvida, o ideal é que a criança seja avaliada por um médico pediatria para o melhor tratamento para o quadro."

Hospital Infantil Sabará: No Hospital Infantil Sabará, os testes positivos para vírus respiratórios saltaram 92% entre a semana de 2 a 8 de outubro e a semana de 6 a 12 de novembro —passou de 28 para 54 casos positivos.

No mesmo período, o número de exames de covid-19 (RT-PCR, o mais preciso) passou de zero para 58, com 14% de positividade, ante 6% da semana anterior, quando 12 testes foram realizados.

Hospital Albert Einstein: Na unidade Morumbi do Albert Einstein, o registro de contaminações de crianças pelo vírus VSR só aumenta. Os exames passaram de 611 para 872 e os positivos de 53 para 128 na comparação entre a semana de 9 e 15 de outubro com a mais recente, de 6 a 12 de novembro.

Nesta última semana epidemiológica, de 6 a 12 de novembro, 30 pacientes abaixo de 17 anos estavam internados após infecção pelo VSR. Em nota, o hospital aconselha "priorizar o uso de máscaras de proteção em ambientes coletivos e higienizar as mãos com frequência, usando água e sabonete ou álcool gel 70% são práticas fundamentais".

Crianças com sintomas respiratórios devem ser afastadas de creches e escolas durante o período de manifestações clínicas. Além disso, é fundamental a realização de testes para diagnóstico preciso das doenças."
Hospital Albert Einstein, em nota

Hospital Santa Catarina - Paulista: No dia 17 deste mês, 47 pacientes pediátricos estavam internados no hospital devido a síndromes respiratórias, "sendo 19 pacientes nas UTIs e 28 nas nossas unidades de internação".

Embora tenha havido diminuição nos casos de Influenza e VSR na última quinzena, "registramos um aumento 50% no número de pacientes pediátricos internados com covid-19. Temos cinco crianças internadas", afirma o hospital em nota.

A vacinação existente para covid-19 e influenza podem colaborar para diminuição dos casos."
Juliana Okamoto, pediatra

Hospital Sírio Libanês: 60% de ocupação nos leitos destinados à pediatria no hospital com síndromes respiratórias e 15% de covid (síndromes bronquiolite, vírus sincicial respiratório, adenovírus, influenza).

Hospitais públicos: Como o governo estadual não atualizou as internações de crianças por hospital entre 5 e 16 de novembro, a Info Tracker —plataforma de monitoramento da covid-19 da USP (Universidade de São Paulo) e Unesp (Universidade Estadual Paulista)— comparou o total de crianças internadas por covid entre 4 e 17 de novembro no Hospital Infantil Cândido Fontoura, Hospital Municipal Infantil Menino Jesus e Hospital Infantil Darcy Vargas —todos na capital.

As crianças internadas nesses hospitais passaram de sete, no dia 4, para 15 no dia 17, oito delas em UTI —um aumento de 114% em 13 dias.

"Embora o patamar atual seja inferior ao registrado na onda ômicron do início do ano, é muito preocupante um incremento da ordem de 100% nas internações em hospitais infantis em um período tão curto de duas semanas", avalia um dos coordenadores da Info Tracker, o professor da Unifesp Wallace Casaca.