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Criança é internada com sintoma de gripe e sai com paralisia cerebral em SP

Beatriz antes e depois de internação no hospital Sepaco - Arquivo Pessoal
Beatriz antes e depois de internação no hospital Sepaco Imagem: Arquivo Pessoal

Do UOL, em São Paulo

17/02/2023 04h00

Beatriz, de 2 anos, foi levada ao Hospital Sepaco, em São Paulo, com sintomas de gripe, mas deixou a unidade com paralisia cerebral. A mãe da criança, a servidora Eliana Carvalho, 34, disse que a complicação aconteceu por um erro médico, depois de uma intubação malsucedida.

A menina nasceu com laringomalácia, uma flacidez na laringe, quadro clínico que exige cuidado redobrado durante a intubação.

O Sepaco admite que a intubação de bebês com laringomalácia "torna o cenário bem mais complexo e com maiores riscos". "A despeito do uso de todos os recursos terapêuticos disponíveis, maior criticidade do quadro é esperada neste cenário, o que pode culminar com falta de oxigenação e instabilidades cardiocirculatórias graves", diz o hospital, em nota.

A Justiça decidiu em liminar e depois em primeira instância que a Central Nacional Unimed deveria bancar o tratamento domiciliar da criança, mas o plano de saúde de Beatriz recorreu.

O juiz Cláudio Salvetti D'Angelo escreveu que Beatriz "vem sofrendo com a negligência" da Unimed. O magistrado apontou uma "recusa injustificada" para fornecer o home care à menina.

A requerida [Unimed] tem agido com desleixo na prestação de serviços na internação domiciliar
Juiz Cláudio Salvetti D'Angelo

A Unimed afirma que "não houve negativa para qualquer atendimento designado pelo plano terapêutico". Informa também, em nota, "que não comenta decisões judiciais".

Beatriz - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Beatriz antes de ser internada
Imagem: Arquivo Pessoal

Ao ser internada, Beatriz foi diagnosticado com bronquiolite —inflamação viral nos bronquíolos que atinge principalmente bebês. Por três dias, a criança ficou em observação na UTI, respirando com o auxílio de aparelho.

No dia 26 de dezembro, Eliana notou que a filha, muito ativa, desanimou. Ao comentar com uma médica, ouviu que Beatriz estava no pico da bronquiolite. as que começaria a melhorar a partir do dia seguinte.

Segundo a mãe da criança, o CPAP nasal —aparelho utilizado no auxílio à respiração— foi regulado com pressão 17, "apropriada para o peso dela". Ao chegar para o plantão da madrugada, porém, a médica aumentou a pressão para 35, causando desconforto na criança, segundo relato de Eliana.

"Beatriz parou por 27 minutos"

beatriz intubada - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Beatriz intubada no hospital Sepaco
Imagem: Arquivo Pessoal

Eliana conta que, ao alertar a médica sobre a flacidez na laringe da criança, o pai ouviu a seguinte resposta: "Quem sabe da conduta sou eu. Se ela não está bem, vou intubar".

Ele ligou aflito para Eliana e passou o telefone à médica, que disse que Beatriz havia "parado por 27 minutos" e que havia "feito tudo o que podia".

"Ela [a médica] disse: 'eu tentei intubar, mas no procedimento ela teve uma parada cardíaca'."

Beatriz saiu do hospital com "encefalopatia crônica não evolutiva", lesões no sistema nervoso central que deixaram as seguintes sequelas:

  • Hipertensão;
  • Perda da visão;
  • Perda da sustentação do pescoço;
  • Perda de todos os movimentos do corpo;
  • Impossibilidade de alimentação oral e ingestão de líquidos.

Paguei fisioterapeuta e auxiliar de enfermagem do meu bolso. Um dia de medicação foi R$ 1.000 na farmácia, fora o convênio que custa R$ 2 mil por mês."

Segundo a decisão da Justiça, o plano de saúde é obrigado a oferecer, além de medicamentos, equipe com oito especialistas no home care.

O juiz fala de equipamentos "que nunca foram entregues" e da falta de "profissional capacitado" para lidar com os aparelhos, obrigando a família a recorrer a "amigos e familiares" para "arcar com os custos".

Ele condenou a Unimed a reembolsar o gasto com médicos, no valor de R$ 5.500, juros de 1% ao mês e correção monetária "até a data do efetivo pagamento".

O plano de saúde não quer ter despesas; somente receitas. A conduta foi abusiva, displicente, (...) frustrando expectativa de cuidado."
Juiz Cláudio Salvetti D'Angelo

Segundo a Unimed, o plano "vem cumprindo a decisão nos exatos termos como proferido pelo Poder Judiciário" e "reafirma que o respeito e o cuidado com os beneficiários são a base de suas relações".

Outra ação judicial mira uma indenização do Hospital Sepaco. "Buscamos uma espécie de pensão mensal vitalícia para o custeio das necessidades da Beatriz porque um dia seus pais podem faltar", diz o advogado da família, Anderson Albuquerque.

O Hospital Sepaco diz ser referência em maternidade e pediatria, "com corpo clínico com sólida formação profissional".

Ainda sonho em ver minha filha voltar a andar, sentar, segurar as coisas e enxergar.
Eliana Carvalho, mãe de Beatriz

sepaco - Google Street View - Google Street View
Hospital Sepaco, na Vila Mariana, zona sul de São Paulo
Imagem: Google Street View