Topo

Dilma Rousseff sofre impeachment, mas mantém direitos políticos

31/08/2016 16h38

Brasília, 31 Ago 2016 (AFP) - A presidente Dilma Rousseff foi destituída da Presidência do Brasil, após uma sentença histórica no Senado, que pôs um fim dramático a treze anos de governo de esquerda no país.

A ex-presidente não demorou a reagir ao anúncio de seu afastamento definitivo.

"Hoje, o Senado Federal tomou uma decisão que entra para a história das grandes injustiças. Os senadores que votaram pelo impeachment escolheram rasgar a Constituição Federal", declarou.

"Decidiram pela interrupção do mandato de uma Presidenta que não cometeu crime de responsabilidade. Condenaram uma inocente e consumaram um golpe parlamentar", acrescentou.

Por uma maioria de 61 senadores e 20 contra, o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, encarregado de supervisionar o julgamento político contra Dilma, anunciou a oficialização do impeachment.

Os votos superaram com folga os 54 (dois terços dos 81 senadores) necessários para que Dilma fosse condenada.

No entanto, o Senado rejeitou em segunda votação a proposta de que a ex-guerrilheira, de 68 anos, fique inabilitada para exercer cargos públicos.

A votação põe fim a uma sangria política que há nove meses mantém em vigília a maior economia da América Latina, que atravessa sua pior crise econômica em 80 anos e que mantém os principais partidos envolvidos em casos de corrupção.

É um fim trágico para a primeira mulher a chegar à Presidência, suspensa em maio após ser acusada de violar as normas fiscais do Brasil.

Será Michel Temer (PMDB, de centro-direita), de 75 anos, que assume Presidência horas antes de viajar a China, para a cúpula do G20 deste fim de semana.

"Este processo é uma farsa, farsa, farsa", disparou o senador Linderbergh Farias (PT-RJ).

"Canalhas, canalhas, canalhas!", repetiu nesta quarta-feira em um discurso fervoroso.

"Canalhas com aqueles que levaram o Brasil a uma situação crítica, no campo econômico e social", respondeu Ronaldo Caiado (DEM-GO).

Corrupção endêmicaFicaram para trás os dias do milagre socioeconômico iniciados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), padrinho político de Dilma, que tirou 29 milhões da pobreza e o país do mapa da fome da ONU.

A crise político-econômica se entrelaçou com um escandaloso esquema de corrupção que desviou mais de US$ 2 bilhões da Petrobras.

Embora atinja todas as forças políticas, o escândalo conhecido como Petrolão acabou por se aproximar do governo. E também ofuscou a imagem do político mais bem avaliado pelos brasileiros, o ex-presidente Lula, na mira por obstrução da Justiça e corrupção.

O Brasil aparece na 76ª posição do Índice de Percepção de Corrupção da Transparência Internacional de um total de 168 países. De fato, mais da metade dos 81 senadores que julgaram Dilma são investigados ou foram acusados em casos de corrupção.

Os desafios de TemerTemer terá poucos motivos para celebrar.

Com um desemprego em níveis recorde (mais de 11 milhões de pessoas), inflação galopante e um gigantesco déficit fiscal, a economia brasileira encolherá 3,16% este ano, segundo dados revelados nesta quarta-feira pelo Banco Central, que revisou para cima suas previsões.

O nome de Temer também veio à tona nas investigações do megaescândalo de corrupção na Petrobras, em várias delações premiadas feitas por acusados que querem reduzir suas penas.

O agora presidente interino nega qualquer vínculo com o esquema e a Justiça nunca apresentou acusações contra ele.

Ele também precisará de grande habilidade para fazer alianças em um Parlamento fragmentado, carregando a sombra de "usurpador".

"Dilma vai entrar para a História como uma figura ambígua: será vista como vilã do ponto de vista da gestão, foi uma governante ruim, que errou muito, que não soube dialogar com o Congresso, que é responsável em parte pela economia e tudo isto será atribuído a ela", disse à AFP Michael Mohallem, analista da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro.

Mas "também haverá uma leitura sobre o processo em si, que foi usado para favorecer um grupo político, para levar Michel Temer e o PMDB ao poder de um modo não tão legítimo como seriam as urnas", acrescentou.

Em sua última apresentação como presidente ante o Senado, a economista que foi guerrilheira marxista na juventude e sofreu torturas na ditadura militar (1964-1985) se mostrou altiva e disse que só eleições diretas podem julgar um chefe de Estado.

E destacou que será ela quem ficará "do lado certo da História".