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Análise: Trump se afasta de Seul, fazendo o jogo de Pyongyang

O presidente dos EUA, Donald Trump, e o presidente sul-coreano Moon Jae-in - K. Dietsch/picture alliance/newscom
O presidente dos EUA, Donald Trump, e o presidente sul-coreano Moon Jae-in Imagem: K. Dietsch/picture alliance/newscom

Em Seul

04/09/2017 10h50

O presidente americano, Donald Trump, faz o jogo de Pyongyang e corre o risco de enfraquecer uma aliança de décadas com a Coreia do Sul, a qual criticou após o teste nuclear norte-coreano, ameaçando romper um acordo comercial.

Mais de 24 horas depois do anúncio de Pyongyang, Trump não teria conversado com o presidente sul-coreano, Moon Jae-In, embora tenha tratado do assunto com o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe.

Em uma série de tuítes após o teste nuclear de domingo (3), Trump denunciou a atitude da Coreia do Norte, mas também emitiu críticas ao Sul.

"A Coreia do Sul já se deu conta, como lhes disse: um apaziguamento com a Coreia do Norte não funcionará, entendem apenas uma coisa!", tuitou, dirigindo-se a Moon, defensor do diálogo com o regime de Kim Jong-un.

No sábado (2), Trump disse que avalia a possibilidade de retirar seu país do acordo de livre-comércio com a Coreia do Sul, um texto que, segundo os especialistas, é um dos pilares da estreita relação entre dois países aliados há quase 70 anos.

Os ataques de Trump contra Seul surpreenderam. Os especialistas estão convencidos de que esses tuítes intempestivos agravam a situação em plena crise internacional. Ainda mais se for levado em consideração que Moon não é uma "pomba".

Moon, 'o Chamberlain moderno'

Depois do teste nuclear, o presidente sul-coreano pediu que se aplicasse "o castigo mais duro" contra Pyongyang, em particular com novas sanções no âmbito da ONU para "isolar completamente a Coreia do Norte".

Segundo John Delury, da Universidade Yonsei de Seul, Trump considera seu colega sul-coreano um Neville Chamberlain dos tempos modernos - em alusão ao promotor da política britânica de paz com Adolf Hitler no final dos anos 1930.

"Dá, atualmente, tão pouco valor a essa relação que está disposto a criticar publicamente seu sócio de Seul", explicou o pesquisador à AFP.

Os Estados Unidos são o protetor da Coreia do Sul, onde mantêm 28.500 militares estacionados. A aliança com Seul também é o pilar da estratégia americana na Ásia para compensar a influência da China e conter a militarização do regime norte-coreano.

Donald Trump conversou com Abe e também reconheceu que a China "tenta ajudar, sem muito sucesso".

"A hierarquia está clara: a Coreia do Sul está em último na fila", considerou Delury.

Em um tuíte, Adam Mount, do "think tank" Center for American Progress, disse que abordagem de Trump diante dessa crise pode ser "fatal para a política norte-coreana dos Estados Unidos".

"A coesão da aliança é o sinal mais simples e mais importante que se deve enviar", acrescentou.

"As opiniões de Trump sobre o comércio, as negociações, a inconstância política, as ameaças e outras humilhações destroçaram a aliança", continuou.

Pôr San Francisco em risco para salvar Seul?

Durante a campanha eleitoral americana, Trump havia acusado Seul de não pagar o suficiente pela proteção americana e ameaçou anular o acordo comercial "horrível" selado com a Coreia do Sul durante a Presidência de Barack Obama.

O tema ressurgiu, depois que Trump disse que discutiria esta semana com seus conselheiros a possibilidade de retirada dos Estados Unidos do acordo comercial KORUS FTA.

No contexto atual, essa eventualidade pode ser catastrófica, apontou a imprensa sul-coreana, alertando sobre os riscos de uma desestabilização ainda maior na região.

Pôr fim ao acordo enviaria "uma mensagem ruim para o Norte, em relação à aliança", estimou o editorial do "JoongAng Ilbo" nesta segunda-feira.

Essa avaliação é compartilhada por Colin Kahl, da Universidade de Georgetown, que trabalhou com o governo Obama.

Primeiramente, Washington precisa tranquilizar Coreia do Sul e Japão, diz Kahl. Ainda mais - segundo ele - no momento em que os recentes testes balísticos do Norte colocam, de forma legítima, a pergunta sobre a vontade real dos Estados Unidos de "colocar San Francisco em risco para defender Seul".

"Enfraquecer a solidariedade dentro da aliança é idiota e perigoso", tuitou Kahl.

"O governo deve falar em uma só voz antes que a confusão aliene seus aliados dos Estados Unidos, ou que provoque uma guerra, ou ambos", sugeriu.