Ansiedade invade bairros ricos do Rio, ao alcance dos fuzis da Rocinha
Rio de Janeiro, 28 Set 2017 (AFP) - Com os tiroteios letais na Rocinha, os praticantes de parapente dos ricos bairros próximos deixaram de sobrevoar a maior favela do Rio, limitando seus elegantes malabarismos voadores à vizinha praia de São Conrado.
Moradores de bairros chiques da cidade, ao alcance dos fuzis da Rocinha, experimentam ansiedade e resignação após a onda de violência da semana passada na favela, onde o Exército precisou intervir contra os traficantes, diante da incapacidade da Polícia de controlar a situação.
Os tiroteios forçaram o fechamento da autoestrada Lagoa-Barra, que separa fisicamente a Rocinha do sofisticado bairro de São Conrado e de sua estação do metrô, enquanto milhares de pessoas assistiam no Parque Olímpico ao Rock in Rio, evento musical do ano na cidade.
Morador do bairro, o empresário Leonardo Ferreira, de 48 anos, considera a situação atual "muito aflitiva".
"Eu tenho uma filha de 2 anos e meio, e um filho de 9 anos e os dois estudam muito próximo da Rocinha. Eu trabalho, a minha esposa trabalha também", contou à AFP.
"Ficamos os três apreensivos, acompanhando os noticiários para saber se aquilo não vai se repetir ou não vai crescer ainda mais para que a gente possa ir resgatar os filhos no colégio correndo e voltar para casa, onde a gente tem o nosso búnquer lá do condomínio", acrescentou.
"É uma situação muito ruim que impacta obviamente a sua capacidade de concentração no trabalho, a sua produtividade obviamente cai vivendo numa situação tão ruim, tão negativa de violência".
O instrutor de parapente Mauro Sacramento, de 54 anos, acaba de pousar suavemente com um turista nas areias da bela praia de São Conrado. Nada de sobrevoos na Rocinha, proibidos pelo Exército.
Sacramento afirma que os tiroteios afetaram. "A Rocinha é vizinha nossa aqui, e é onde nós voamos. Inclusive voamos às vezes acima da Rocinha, de acordo com a direção do vento, então teve um impacto muito grande. Até hoje, quando as pessoas marcam um voo por e-mail ou telefone, perguntam: 'Como é que está aí o trajeto? Está calmo, está tranquilo?".
"É muito triste ver isto porque nós temos um lugar lindo. Poderia ser um dos melhores lugares do mundo para se viver".
- "Tenho que viver com isso" -Em frente à praia, o piauiense Miguel Eduardo, de 56 anos, explica, no quiosque que gerencia, ter notado "uma queda de 20% a 30%" em suas vendas de salgados e suco. "As pessoas têm medo de vir aqui com tudo isso".
Mas, "já teve situações assim na época do Nem", traficante que chefiou o tráfico de drogas na Rocinha e que, mesmo preso, estaria por trás da tentativa de invasão da comunidade.
"Sempre tem, sempre teve, sempre vai ter... Sai um, vem outro", lamenta.
A resignação é a mesma de René Hasenclever, presidente da Associação de Moradores da Gávea, outro bairro abastado da cidade, vizinho à Rocinha. Para ele, este "não é o primeiro e também não será o último" momento difícil que vai experimentar.
Mas "esses últimos dias, escolas fecharam, as pessoas estão com receio de sair. São menos pratos vendidos, menos chopes vendidos. À noite está mais vazio", acrescentou.
"Hoje a zona sul do Rio de Janeiro está cercada por favelas, mas não são as favelas que nos incomodam. A favela é o esconderijo do tráfico, isso é o que incomoda", diz. "Tenho que viver com isso. Eu fico assustado às vezes".
Em nenhum outro lugar ricos e pobres vivem tão perto uns dos outros como no Rio, onde as favelas ficam encravadas no meio da cidade e não na periferia, como em Brasília ou em São Paulo.
Assim, os mais ricos, que costumam morar ao longo do mar, com frequência ficam ao alcance dos disparos que impõem o ritmo cotidiano de cerca de dois milhões de cariocas pobres que se amontoam nos flancos de morros sinuosos. E, ano após ano, a superfície das favelas abocanha pouco a pouco o Rio.
Com a violência atual, a presença do Exército é que costuma trazer tranquilidade para os cariocas.
É o caso de Rômulo Silva, analista de sistemas de 32 anos, que sobe de bicicleta a via cercada de mata que liga a Gávea à Rocinha, entrevistado a alguns metros de uma blitz montada por militares fortemente armados.
"A gente entra em contato através de aplicativos de celular, trocando informações: tá acontecendo operação na Rocinha. Tá acontecendo operação na entrada da Vista Chinesa. Há informação de bandidos escondidos na mata", exemplifica.
"A razão mandaria eu ficar recluso em casa, mas eu optei por não me render ao medo", afirma.
pt-mh/mvv
Moradores de bairros chiques da cidade, ao alcance dos fuzis da Rocinha, experimentam ansiedade e resignação após a onda de violência da semana passada na favela, onde o Exército precisou intervir contra os traficantes, diante da incapacidade da Polícia de controlar a situação.
Os tiroteios forçaram o fechamento da autoestrada Lagoa-Barra, que separa fisicamente a Rocinha do sofisticado bairro de São Conrado e de sua estação do metrô, enquanto milhares de pessoas assistiam no Parque Olímpico ao Rock in Rio, evento musical do ano na cidade.
Morador do bairro, o empresário Leonardo Ferreira, de 48 anos, considera a situação atual "muito aflitiva".
"Eu tenho uma filha de 2 anos e meio, e um filho de 9 anos e os dois estudam muito próximo da Rocinha. Eu trabalho, a minha esposa trabalha também", contou à AFP.
"Ficamos os três apreensivos, acompanhando os noticiários para saber se aquilo não vai se repetir ou não vai crescer ainda mais para que a gente possa ir resgatar os filhos no colégio correndo e voltar para casa, onde a gente tem o nosso búnquer lá do condomínio", acrescentou.
"É uma situação muito ruim que impacta obviamente a sua capacidade de concentração no trabalho, a sua produtividade obviamente cai vivendo numa situação tão ruim, tão negativa de violência".
O instrutor de parapente Mauro Sacramento, de 54 anos, acaba de pousar suavemente com um turista nas areias da bela praia de São Conrado. Nada de sobrevoos na Rocinha, proibidos pelo Exército.
Sacramento afirma que os tiroteios afetaram. "A Rocinha é vizinha nossa aqui, e é onde nós voamos. Inclusive voamos às vezes acima da Rocinha, de acordo com a direção do vento, então teve um impacto muito grande. Até hoje, quando as pessoas marcam um voo por e-mail ou telefone, perguntam: 'Como é que está aí o trajeto? Está calmo, está tranquilo?".
"É muito triste ver isto porque nós temos um lugar lindo. Poderia ser um dos melhores lugares do mundo para se viver".
- "Tenho que viver com isso" -Em frente à praia, o piauiense Miguel Eduardo, de 56 anos, explica, no quiosque que gerencia, ter notado "uma queda de 20% a 30%" em suas vendas de salgados e suco. "As pessoas têm medo de vir aqui com tudo isso".
Mas, "já teve situações assim na época do Nem", traficante que chefiou o tráfico de drogas na Rocinha e que, mesmo preso, estaria por trás da tentativa de invasão da comunidade.
"Sempre tem, sempre teve, sempre vai ter... Sai um, vem outro", lamenta.
A resignação é a mesma de René Hasenclever, presidente da Associação de Moradores da Gávea, outro bairro abastado da cidade, vizinho à Rocinha. Para ele, este "não é o primeiro e também não será o último" momento difícil que vai experimentar.
Mas "esses últimos dias, escolas fecharam, as pessoas estão com receio de sair. São menos pratos vendidos, menos chopes vendidos. À noite está mais vazio", acrescentou.
"Hoje a zona sul do Rio de Janeiro está cercada por favelas, mas não são as favelas que nos incomodam. A favela é o esconderijo do tráfico, isso é o que incomoda", diz. "Tenho que viver com isso. Eu fico assustado às vezes".
Em nenhum outro lugar ricos e pobres vivem tão perto uns dos outros como no Rio, onde as favelas ficam encravadas no meio da cidade e não na periferia, como em Brasília ou em São Paulo.
Assim, os mais ricos, que costumam morar ao longo do mar, com frequência ficam ao alcance dos disparos que impõem o ritmo cotidiano de cerca de dois milhões de cariocas pobres que se amontoam nos flancos de morros sinuosos. E, ano após ano, a superfície das favelas abocanha pouco a pouco o Rio.
Com a violência atual, a presença do Exército é que costuma trazer tranquilidade para os cariocas.
É o caso de Rômulo Silva, analista de sistemas de 32 anos, que sobe de bicicleta a via cercada de mata que liga a Gávea à Rocinha, entrevistado a alguns metros de uma blitz montada por militares fortemente armados.
"A gente entra em contato através de aplicativos de celular, trocando informações: tá acontecendo operação na Rocinha. Tá acontecendo operação na entrada da Vista Chinesa. Há informação de bandidos escondidos na mata", exemplifica.
"A razão mandaria eu ficar recluso em casa, mas eu optei por não me render ao medo", afirma.
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