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Brasil no caminho da polarização entre Bolsonaro e Haddad

19/09/2018 15h53

Brasília, 19 Set 2018 (AFP) - O Brasil parece se encaminhar para um polarizado duelo eleitoral entre o ultradireitista Jair Bolsonaro e o esquerdista Fernando Haddad, candidato do ex-presidente Lula, figuras que geram adesões passionais e os maiores índices de rejeição do país.

As últimas pesquisas conseguiram dissipar a incerteza inicial desta atípica campanha e confirmam uma tendência sólida visando o primeiro turno, em 7 de outubro: Bolsonaro, que se recupera no hospital da facada que recebeu em um comício, lidera com 28% de intenção de votos, segundo o Ibope.

Haddad, que subiu 11 pontos desde que foi oficialmente declarado candidato há pouco mais de uma semana, se afasta do "segundo pelotão" e alcança 19%. Mais abaixo estão Ciro Gomes (11%), Geraldo Alckimin (7%) e Marina Silva (6%).

Bolsonaro, com suas declarações misóginas, homofóbicas e racistas, tem um índice de rejeição consistente, de 42%; enquanto Haddad, junto com os votos e o fervor por Lula, está herdando também o ódio que o ex-presidente desperta em amplas camadas da população, com 29% dos eleitores dizendo que nunca votariam nele.

Em um segundo turno, em 28 de outubro, Bolsonaro e Haddad ficariam empatados, com 40% das intenções de voto cada, 15% de votos brancos e nulos e 5% de indecisos, detalha a pesquisa realizada entre domingo e terça-feira.

"O fato de serem opções com tanta rejeição tem sérias consequências para o país. Traz um problema de legitimidade ao próximo governo, o que dificultará a aplicação da agenda de reformas, e significa que, seja quem for o ganhador, terá muita resistência no Congresso", explica Thomaz Favaro, analista da consultora de riscos Control Risk.

Um comentário de um leitor do jornal Valor Econômico resume o nível de polarização: "Jamais perdoarei o Bolsonaro por me obrigar votar no PT", escreveu o leitor, que assina como "Liberal Jabuticaba".

- Novos atores -O duelo entre centro direita e esquerda foi visto praticamente em todas as eleições desde a redemocratização, em 1985, encarnado a partir de 1994 pelo PSDB, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e pelo PT.

Mas desta vez, em um contexto de saturação da corrupção e da crise econômica, apareceram novos protagonistas: Bolsonaro, um capitão da reserva e admirador da ditadura militar, e Ciro Gomes, ex-ministro de Lula.

O PT parecia condenado a sair da história após o impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016 e da prisão em abril deste ano de Lula, condenado a 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.

Mas "o PT conseguiu se reconstruir desde o impeachment, capitalizando um discurso de vitimização e se opondo às reformas impopulares atuais do presidente (Michel) Temer", com uma estratégia elaborada pelo próprio Lula de sua cela em Curitiba.

Bolsonaro, por sua vez, anima seus partidários com discursos filmados em seu leito no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde se recupera de uma facada na barriga ocorrida em 6 de setembro em Juiz de Fora, Minas Gerais.

O deputado, de 63 anos, "conseguiu capitalizar o seu discurso antiestablishment, captar uma parte do eleitorado que vê os partidos políticos tradicionais com descrédito, e o seu discurso da linha dura contra o crime", aponta Favaro.

"A linguagem conciliadora da direita tradicional (PSDB e Democratas) e do centro pragmático (MDB) perdeu qualquer apelo popular", declarou à AFP Lincoln Secco, analista e historiador da Universidade de São Paulo.

- A queda de Alckmin -A grande vítima desse cenário é o candidato do PSDB, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, estagnado em quarto lugar nas pesquisas, apesar de seu partido ter uma das maiores maquinarias eleitorais e de sua aliança com vários partidos de centro e de direita ter lhe assegurado mais de 40% do tempo de propaganda gratuita na TV.

Mas, segundo analistas, sua fala lenta e professoral não combina com um ambiente tão agitado como o atual e com o fato de as últimas operações contra a corrupção terem atingido dirigentes do seu partido.

Alckmin havia se tornado o favorito dos mercados com as suas promessas de implementar os ajustes necessários para enfrentar os grandes déficits fiscais do país.

"Mas os dois pontos fortes dele, que são a independência do Banco Central e o programa de privatizações, também estão no programa de Bolsonaro, e isso está lhe roubando votos. Os mercados estão indo em direção a um plano B", explica o professor Ricardo Wahrendorff Caldas, do Instituto de Ciência Política (IPOL) da Universidade de Brasília.