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Cardeal Pell, ex-número três do Vaticano, declarado culpado de pedofilia

27/02/2019 00h34

Melbourne, 27 Fev 2019 (AFP) - O cardeal George Pell foi declarado culpado de crimes sexuais contra menores na Austrália, e depois de se tornar o mais alto dignatário da Igreja católica condenado em um caso de pedofilia, foi demitido nesta terça-feira (26) do posto de secretário de Economia do Vaticano pela Santa Sé.

Os promotores australianos ressaltaram que o cardeal, de 77 anos, não mostrou "nenhum arrependimento" pelo "vergonhoso" comportamento com dois coroinhas e pediram a "prisão imediata" do ex-número três do Vaticano.

O prelado, que chegou a ser um dos conselheiros mais próximos do papa, foi recebido aos gritos de "monstro" e "parasita" ao chegar à corte de Melbourne, no sul da Austrália, onde era aguardado por vários manifestantes um dia antes de ser conhecido o veredicto.

A corte de Melbourne (sul da Austrália) declarou o cardeal, de 77 anos, culpado em um julgamento em dezembro por agressão sexual e outras quatro acusações de atentado ao pudor contra dois coroinhas de 12 e 13 anos na sacristia da Catedral de São Patrício em Melbourne nos anos 1990.

Pell foi considerado culpado, entre outras acusações, de ter obrigado uma das vítimas a fazer sexo oral nele e a se masturbar diante da outra.

Mas o tribunal proibiu até esta terça-feira que os meios de comunicação informassem sobre o caso.

Após a condenação, o Vaticano decidiu afastá-lo do cargo de secretário de Economia do Vaticano, que ocupava desde 2014.

"Posso confirmar que o cardeal George Pell já não é prefeito da Secretaria de Economia", escreveu no Twitter o porta-voz do Vaticano Alessandro Gisotti, referindo-se ao terceiro cargo mais importante do Vaticano.

O dirigente havia negado as acusações inicialmente e o júri não havia chegado a um veredicto no primeiro julgamento sobre o caso, em setembro, mas o cardeal foi declarado culpado em um novo julgamento, em 11 de dezembro.

A corte de Melbourne adotou então uma "ordem de supressão", que proibia aos veículos fazer qualquer menção ao caso, sob pena de ações legais.

Este silêncio forçado foi imposto com o objetivo de proteger o júri de um segundo julgamento em que o cardeal Pell devia responder a outros supostos crimes.

Mas a acusação decidiu abrir mão deste, o que levou à suspensão, nesta terça-feira, da proibição a que a imprensa reportasse o caso, autorizando aos veículos a anunciar o veredicto de culpa.

"O cardeal George Pell sempre manteve sua inocência e continua fazendo", afirma um comunicado publicado nesta terça-feira por seus advogados, que anunciaram ter apresentado um recurso de apelação.

O texto também destaca que várias acusações contra Pell foram retiradas ou não foram aceitas.

O Vaticano expressou o "profundo respeito" pela justiça australiana após a condenação.

"É uma notícia dolorosa que, estamos cientes, chocou muitas pessoas, não só na Austrália. Como fizemos antes, reafirmamos nosso profundo respeito pelas autoridades judiciais australianas", disse o Vaticano em um comunicado lido por seu porta-voz, Alessandro Gisotti

"Em nome deste respeito, esperamos agora o resultado do julgamento em apelação, recordando que o cardeal Pell reafirmou sua inocência", completou o Vaticano.

"Apodreça no inferno"Um dos coroinhas vítimas de Pell morreu em 2014. O outro informou em um comunicado publicado por seu advogado que o processo legal é estressante e "ainda não terminou".

"Como muitos sobreviventes, experimentei vergonha, solidão, depressão e dificuldades. Como muitos sobreviventes, demorei anos para compreender o impacto que deve na minha vida", disse a vítima, que não foi identificada publicamente.

Na entrada do tribunal, defensores de outras vítimas de abusos receberam Pell aos gritos de "monstro" e "apodreça no inferno", quando o cardeal deixou a corte ao final da audiência.

Na quarta-feira está prevista outra audiência, antes do anúncio da sentença.

A condenação representa um novo golpe para a Igreja, apenas dois dias depois do encerramento de uma reunião histórica que abordou a questão da pedofilia, evento durante o qual o papa Francisco prometeu adotar medidas para que os crimes de abuso sexual não se repitam.

Mas os críticos consideram que a instituição aborta o um problema global de décadas com muito lentidão.

Dias depois da condenação de Pell em sigilo, a Igreja anunciou que ele havia sido afastado do grupo de cardeais que integram o gabinete do papa e seus conselheiros mais próximos.

Mas no papel ele continua aparecendo no comando da secretaria de Economia da Santa Sé, ou seja, como o número três do Vaticano, um cargo do qual tirou licença para preparar sua defesa.

O caso de Pell provocou uma grande comoção na Austrália, onde ele lidera as vozes conservadoras em questões como o casamento gay e a mudança climática.

Pell negou durante décadas ter cometido ou ocultado abusos sexuais, mas admitiu problemas na maneira de lidar com a questão dos padres pedófilo no estado de Victoria.

Uma comissão que investiga os abusos de menores afirmou em um relatório do ano passado que dezenas de milhares de crianças foram vítimas de abusos sexuais em igrejas, orfanatos, clubes esportivos, grupos de jovens e escolas na Austrália durante gerações, em um país no qual uma em cada cinco pessoas são católicas, o que representa quase cinco milhões de cidadãos.