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Gustavo Petro, o 'revolucionário' moderado que levou a esquerda ao poder na Colômbia

Da AFP

19/06/2022 21h07Atualizada em 20/06/2022 06h38

Depois de quatro décadas de luta, primeiro em armas e depois na democracia, um revolucionário de óculos que sobreviveu à tortura e ao exílio mudou a História da Colômbia. Aos 62 anos, Gustavo Petro foi eleito o primeiro presidente de esquerda do país.

Em sua terceira tentativa chegar à Presidência, Petro derrotou as elites que sempre questionou e o milionário Rodolfo Hernández, de 77 anos, que disputou com ele a bandeira da mudança na reta final da eleição.

Míope desde criança, Petro descreve a si próprio como "um revolucionário obstinado".

Nascido em uma família de classe média, de pai conservador e mãe liberal, e educado por padres lassalistas, formou-se economista.

Orador habilidoso, em sua vida política sempre levantou as bandeiras da mudança e da ruptura com as forças que tradicionalmente governaram a Colômbia.

Sua ascensão assusta os setores conservadores, pecuaristas e parte do empresariado e dos militares, que temem que seu governo seja um "salto no vazio" ou um esquerdista que levará o país a um socialismo falido.

Outros, mais moderados, não embarcam em seu messianismo. "Ele se acha predestinado (...) a única pessoa que pode salvar a Colômbia", resumiu uma fonte próxima que falou ao portal independente La Silla Vacía.

Durante a campanha, Petro se apresentou como um progressista antes de um esquerdista na tentativa de evitar ser associado a uma corrente que causa repúdio em um país com guerrilhas marxistas no centro de um conflito armado de seis décadas.

Mas seu passado na luta armada o persegue. Por 12 anos se rebelou contra o Estado que agora pretende reformar fundamentalmente. Hoje as armas oficiais o protegem.

Várias vezes ameaçado de morte e forçado a um exílio de três anos na Europa, Petro teve que se blindar para seus discursos eleitorais com um colete à prova de balas, escudos e pelo menos 20 guarda-costas no palanque.

Casado com Verónica Alcocer e pai de seis filhos, Petro admitiu em fevereiro em entrevista à AFP o medo de ser assassinado.

O moderado

Petro militou no M-19, uma guerrilha nacionalista de origem urbana que assinou a paz em 1990. Admirador fervoroso do Prêmio Nobel Gabriel García Márquez, na clandestinidade adotou o nome Aureliano, em homenagem ao personagem de "Cem Anos de Solidão".

Foi detido e torturado pelos militares e ficou preso por um ano e meio. Sempre foi um combatente "medíocre", de acordo com seus ex-companheiros de armas.

Em sua biografia, destaca: "Nunca senti, ao contrário de muitos de meus companheiros, uma vocação militar (...) o que eu queria era fazer a revolução".

Sua "opção preferencial pelos pobres", sustenta, não provém do marxismo, mas da teologia da libertação.

Candidato pelo Pacto Histórico, endossa a defesa do meio ambiente. Ele propõe parar a exploração de petróleo (cujo comércio representa 4% do PIB) em uma "transição" para as energias limpas.

Petro quer fortalecer o Estado e cobrar mais impostos dos ricos. Antes do segundo turno, mostrou-se um político moderado, próximo do povo e do feminismo.

"Quando subia em um palanque e falava por uma hora e meia (...), o que fazia era aprofundar em detalhes seu modelo econômico (...) e isso se torna um pouco sofisticado", admite Alfonso Prada, diretor de debates do esquerdista.

Diante dos temores que desperta, Petro prometeu que não tentará a reeleição por reforma constitucional, nem vinganças pessoais, e que respeitará a propriedade privada.

"Digo enfaticamente que nunca pensei, nem vou pensar em confiscar ou menosprezar" os bens, afirmou.

Sua filha, Sofía, assegura que Petro "é um homem em desconstrução".

Impetuoso

Seu programa de governo também propõe reformar a polícia, envolvida em violações dos direitos humanos, e regular as promoções no âmbito das Forças Militares, que considera classistas. Petro será o primeiro ex-guerrilheiro às quais as tropas vão jurar lealdade.

Depois de assinar a paz, Petro chegou ao Congresso em 1991 e depois à prefeitura de Bogotá em 2012-2015.

Como parlamentar, destacou-se por denunciar os vínculos entre políticos e os paramilitares de extrema direita, mas como prefeito ganhou fama de autoritário e mau administrador por seu plano caótico de estatizar a coleta de lixo, então nas mãos de particulares.

Daniel García-Peña, assessor de Petro na época e que se distanciou dele por causa de seu "despotismo", ainda se lembra de suas "dificuldades em trabalhar em equipe", embora reconheça seu conhecimento do país e sua inteligência.

Ele tem "um temperamento muito impetuoso e autoritário, e quando insistiu em realizar suas propostas (...), não soube conciliar os diferentes setores para colocá-las em prática. Travou muitas brigas ao mesmo tempo e isso gerou muita frustração nas metas que ele mesmo tinha traçado", disse o professor universitário à AFP.

Petro, o moderado, ganhou, no entanto, "certa maturidade" e hoje é uma "pessoa mais serena, tranquila", argumentou uma fonte do entorno do presidente eleito, que falou à AFP sem se identificar.