Sob pressão do Congresso, STF pode retomar nesta quarta análise do marco temporal
Apesar de o tema ter avançado no Congresso em tramitação de urgência, com aprovação por 283 votos a 155 na Câmara, a presidente do Supremo, Rosa Weber, decidiu manter o processo na pauta. O texto ainda precisa passar pelo Senado, mas o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a deliberação da matéria será tratada com "cautela" e "prudência".
Desde o início da sua gestão, Rosa tem sinalizado seu compromisso com o julgamento do marco temporal. Em janeiro, prometeu à ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, incluir a ação em pauta. Mas ainda é possível que um pedido de vista adie a análise para depois da tramitação do projeto no Congresso - ou, no máximo, pelo prazo de 90 dias.
A discussão é se a data da promulgação da Constituição Federal, de 5 de outubro de 1988, deve ser adotada como marco temporal para definir a ocupação tradicional da terra por indígenas. Na prática, a tese permite a expulsão de indígenas que não puderem comprovar que ocupavam a terra naquela data. Até o momento, foram proferidos dois votos: o do relator, ministro Edson Fachin, que se manifestou contra o marco temporal, e o do ministro Nunes Marques, a favor.
O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes em setembro de 2021. O ministro, no entanto, devolveu o processo para julgamento logo no mês seguinte. Desde então, foi segurado pelo ex-presidente do tribunal, Luiz Fux, e pela atual, Rosa Weber, que tem o poder de definir a pauta da Corte.
A tese é defendida por ruralistas sob o argumento de que a definição do marco traria insegurança jurídica para produtores rurais. Essa linha foi encampada por Nunes Marques em seu voto. "Posses posteriores à promulgação da Constituição Federal não podem ser consideradas tradicionais, porque isso implicaria o direito de expandi-las ilimitadamente para novas áreas já definitivamente incorporadas ao mercado imobiliário nacional", afirmou.
Já representantes dos povos indígenas afirmam que o marco temporal pode intensificar conflitos e ameaçar a sobrevivência de comunidades, pois muitas demarcações poderão ser revistas. Em seu voto, Fachin defendeu que a Constituição classifica os direitos indígenas como cláusulas pétreas e que a posse das terras ocupadas tradicionalmente é um direito originário que não se sujeita a marco temporal.
Segundo dados compilados pelo Instituto Socioambiental (ISA) a partir de publicações de atos no Diário Oficial da União, existem hoje 238 pedidos de demarcação pendentes de análise e 496 terras já homologadas.
Na tarde desta terça-feira, 6, lideranças indígenas se reuniram com os ministros Fachin e Luís Roberto Barroso e com o chefe de gabinete de Rosa. O Cacique Raoni, que subiu na rampa com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia da posse no terceiro mandato, participou do périplo de gabinetes.
Histórico
O marco temporal tem origem em um precedente do próprio Supremo. Em 2009, ao analisar o caso do território Raposa Serra do Sol, em Roraima, os ministros entenderam que os indígenas tinham direito à posse porque já estavam ali antes da promulgação da Constituição. O julgamento foi isolado, ou seja, não tinha efeito vinculante para outros processos. Ainda assim, a tese ganhou força.
Em 2013, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) autorizou a reintegração de posse de uma área localizada em parte da reserva indígena em Santa Catarina. A Fundação Nacional do Índio (Funai) contestou a decisão no Supremo. É esse caso, em específico, que a Corte julga agora. Mas agora a tese tem repercussão geral - ou seja, será replicada nos casos semelhantes que tramitam em todas as instâncias da Justiça.
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