Tribunal manda plano de saúde fazer feminização facial e mamoplastia de aumento em mulher trans

Embora não tenha cobertura obrigatória pelo rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), as cirurgias de adequação de gênero não podem ser negadas pelos planos de saúde em determinadas situações. Esse foi o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo ao negar recurso da Fundação CESP contra decisão judicial de primeira instância e definir que uma paciente transexual deve receber atendimento de cirurgia de feminização facial e mamoplastia de aumento.

O Estadão fez contato com a defesa da instituição. No processo, a fundação alegou que os procedimentos não fazem parte do rol da ANS.

O relator da ação no TJ, Olavo Sá, destacou em seu voto que procedimentos dessa natureza não têm caráter estético, mas de adequação de gênero. "A incongruência com o gênero e o corpo de nascimento provocam, sofrimento e angústia" na paciente, citou o magistrado.

A jurisprudência utilizada por Olavo Sá remete a orientações do Conselho Federal de Medicina que garantem a realização das cirurgias fora do rol da ANS quando um médico determina a necessidade de tal medida. Neste caso, a paciente apresentou laudo médico indicando transtorno de identidade de gênero, o que impacta sua saúde mental.

"A cirurgia pretendida não possui finalidade estética, sendo necessária para adequar sua identidade de gênero e preservar seu bem-estar psicológico, não podendo, ainda, ser ignorado o princípio da dignidade humana", pontuou o relator.

A decisão ainda cita a tese aprovada pelo Superior Tribunal de Justiça que determina a execução de procedimentos fora do rol caso não haja substituto terapêutico ou procedimentos possíveis esgotados.

A adequação física de gênero no caso da paciente, que inclui a feminilização facial e mamoplastia de aumento, não tem substitutivos opcionais.

No processo, a Fundação CESP alegou que, caso a paciente não tenha condições financeiras de pagar pelos procedimentos de alto custo, deve procurar atendimento no serviço público de saúde.

A Fundação anotou que seus contratantes são empresas que fornecem o serviço aos funcionários, ‘sem manter relação direta entre indivíduo e o plano de saúde’.

Danos morais negados

Em primeira instância, a paciente entrou com outros dois pedidos, que foram negados pelo juiz Valdir da Silva Queiroz Junior da 9ª Vara Cível da Capital.

Ela pediu R$ 10 mil a título de danos morais e a realização do procedimento com um médico específico. Sustentou que a negativa do plano de saúde e a falta de resposta por meses geraram sentimento de incerteza acerca da sua saúde.

A Justiça considerou que não foram demonstradas atitudes que implicaram a violação da honra, intimidade ou reputação da paciente.

A autora da ação solicitou que um médico cirurgião não credenciado no plano de saúde contratado realizasse as cirurgias. Neste ponto, a Justiça decidiu que os procedimentos devem ocorrer em um hospital ou clínica credenciados pelo plano de saúde contratado. "Não sendo possível permitir à parte autora a livre escolha de clínica quando há a possibilidade da realização do procedimento em clínica ou hospital credenciados pela operadora do plano de saúde", definiu o juiz.

‘Sofrimento de angústia’

No Tribunal de Justiça, o relator Olavo Sá foi taxativo. "No presente caso, a apelada é uma pessoa transexual que se reconhece como do gênero feminino e, com base em laudos médicos profissionais, confirmou sua disforia de gênero e iniciou sua jornada para alcançar, ainda mais, o corpo com aspectos femininos. A incongruência com o gênero e o corpo de nascimento lhe provoca sofrimento e angústia."

O magistrado pontuou que ‘a cirurgia pretendida não possui finalidade estética, sendo necessária para adequar sua identidade de gênero e preservar seu bem-estar psicológico, não podendo, ainda, ser ignorado, o princípio da dignidade humana’.

"Portanto, uma vez constatado o caráter não estético do procedimento, necessário à reparação da incongruência entre a aparência física e autoimagem da apelada, como forma de preservação da dignidade e da saúde humana, a negativa de cobertura se mostra abusiva", advertiu o relator.

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