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O país onde uma granada custa menos do que uma Coca-Cola

Andrew Harding

Na África

08/02/2015 20h22

As granadas vêm da China ou da Bulgária. Os morteiros são do Sudão. Os lançadores de foguetes foram fabricados no Irã. As balas no Reino Unido, na Bélgica e na República Checa. Espanha e Camarões fornecem os cartuchos de espingarda. E a lista continua.

Um estudo detalhado das armas que circulam na República Centro-Africana revela dados interessantes sobre a indústria mundial de armamentos e como esses produtos acabam nas mãos dos rebeldes.

A pesquisa também sugere que o impacto do comércio de armas pode ser "duradouro" e "devastador" para o país, quando, por exemplo, a coalizão Seleka, formada por diferentes facções políticas e milícias, depôs o governo do presidente François Bozizé e instalou ali uma guerra civil, obrigando milhares de civis a deixarem suas casas.

"Pequenas e fáceis de esconder"

Após Seleka tomar poder, guerra civil eclodiu no país, forçando milhares de pessoas a deixarem suas casas. "As granadas de mão 82-2 são o equipamento militar mais comum na República Centro-Africana", aponta o relatório, conduzido pelo Grupo de Pesquisa de Armamento em Conflitos do Reino Unido para a União Europeia.

"Essas granadas são tão comuns que supostamente podem ser compradas pelo equivalente a US$ 0,50 a US$ 1 (R$ 1,40 a R$ 2,80) cada, valor inferior ao de uma latinha de Coca Cola", assinala o estudo.

Granadas podem ser compradas por valores que variam de US$ 0,50 a US$ 1. "Pequenas e fáceis de esconder, têm tido um impacto significativo na segurança, causando ferimentos e morte de civis em Bangui e em outros lugares ao longo de 2014", acrescenta a pesquisa.

Os pesquisadores encontraram um lote de mais de 25 mil granadas desse tipo em uma remessa de 2006. Elas haviam sido fabricadas na China e, de acordo com o carregamento, se destinavam ao "Quartel-Geral do Exército Real do Nepal”, informação negada pelas Forças Armadas desse país, que afirmaram nunca ter usado tal equipamento militar.

Saques e contrabando

As armas que circulam na República Centro-Africana também são obtidas por meio de saques em arsenais do governo. Outros armamentos são contrabandeados por mercenários estrangeiros, através da fronteira porosa do país.

Mas muitas armas parecem ter vindo de nações vizinhas, em especial do Sudão. "Em 2013, chegaram, pelo menos, dois carregamentos de armas do Sudão a Bangui por via aérea", destaca o relatório.

"As munições chinesa e supostamente iraniana presentes na República Centro-Africana parecem ter sido transferidas do Sudão. No caso da China, isso poderia envolver a violação do acordo sobre o consumidor final entre Pequim e Cartum".

Os carregamentos do Sudão foram feitos antes de a ONU impor um embargo sobre o Seleka no final de 2013. "Independentemente da origem das armas, o resultado final é claro. Ao tomar o poder, o Seleka ajudou a inundar um país já sobrecarregado de armas. Eles cometeram graves abusos dos direitos humanos, incluindo o assassinato de mulheres e crianças", diz Lewis Mudge, pesquisador da divisão africana da ONG Human Rights Watch.