Topo

O 'ninho de espiões' que sediará a Embaixada dos EUA em Havana

Repórter fala em frente ao Escritório de Interesses dos EUA (dir) em Havana, Cuba  - Alexandre Meneghini/Reuters
Repórter fala em frente ao Escritório de Interesses dos EUA (dir) em Havana, Cuba Imagem: Alexandre Meneghini/Reuters

Da BBC Mundo

20/07/2015 11h55

Na região do bairro de Malecón, em Havana, é possível ver um grande prédio que destoa da arquitetura típica da capital cubana. Durante mais de meio século, esse edifício foi visto com grande desconfiança pelos moradores locais, que o viam como um "ninho" de intrigas políticas contra o governo de Cuba.

O bloco cinza de seis andares, grandes janelas e um estilo arquitetônico que lembra os prédios oficiais da antiga União Soviética, foi, por décadas, a Seção de Interesses dos Estados Unidos em Cuba. A partir desta segunda-feira, ele volta a ter o status de Embaixada americana - que perdeu quando os dois países romperam relações, em 1961.

Em janeiro de 1961, pouco antes do rompimento e em meio a campanhas de intimidação e acusações de complô, Fidel Castro alertava em um discurso que o governo americano teria de reduzir o número de funcionários em sua Embaixada.

"O governo revolucionário decidiu que antes de 48 horas..., a Embaixada dos Estados Unidos não tenha aqui nenhum funcionário além do que nós temos (nos Estados Unidos)", que eram 11, segundo o próprio Castro.

"Enquanto pressionavam outros governos a romperem com Cuba, eles (os americanos) usavam a Embaixada para introduzir aqui agentes conspiradores e terroristas; porque estavam dirigindo o terrorismo amparados pela imunidade diplomática", disse Fidel na época.

Dois dias depois, os últimos funcionários da embaixada acabavam de recolher suas coisas e fechavam a embaixada.

E nem sempre as suspeitas não tinham justificativas.

Desde o triunfo da revolução liderada por Castro em 1959, a Agência Central de Inteligência dos EUA, a CIA, tentou várias vezes derrubar o governo comunista da ilha.

Cuba sempre desconfiou das atividades na Sessão de Interesses dos Estados Unidos.

E vice-versa. Em 2003, o governo americano ordenou a expulsão de 14 funcionários que trabalhavam na Sessão de Interesses de Cuba em Washington e na representação cubana na ONU.

O edifício em Cuba só viria a ser reaberto em 1977, depois de um acordo entre o então presidente americano Jimmy Carter e Fidel Castro, para permitir a presença de uma Sessão de Interesses nas respectivas capitais de seus países, sob a proteção da Embaixada da Suíça.

Símbolo

O prédio, construído em 1953, tem sido um símbolo visível da tensão entre os dois países que, no dia 17 de dezembro de 2014, iniciaram o processo de restabelecimento das relações bilaterais.

Em 2006, os Estados Unidos instalaram, no topo de sua fachada, um painel eletrônico que exibia mensagens pró-direitos humanos.

A resposta do governo cubano foi instalar, em tempo recorde, um "bosque de bandeiras" em frete ao prédio, com mais de 138 mastros para esconder as mensagens americanas.

O próprio Fidel Castro inaugurou o monumento em um episódio da chamada "Guerra dos Cartazes", iniciada em 2004, quando os americanos montaram um painel luminoso com o número 75, em referência à quantidade de dissidentes políticos cubanos presos pelo governo de Fidel Castro em 2003.

Em resposta, o governo em Havana cercou a sede de placas com fotos de torturas a prisioneiros no Iraque.

Outro incidente ocorreu duranta um Natal. Os americanos decoraram o jardim do prédio com uma grande árvore de Natal e outros símbolos como o Papai Noel, algo que o governo cubano viu como uma "provocação".

A imensa esplanada situada em frente ao prédio, também foi, durante este período, cenário de manifestações "contra o imperialismo" convocadas pelo governo de Castro.

A paisagem ao redor da Seção de Interesses também sofreu com os altos e baixos da intensa relação entre os dois países.

Em meio a estas provocações, os funcionários que trabalhavam no prédio, americanos ou não, podiam ver das janelas uma outdoor com a frase "Pátria ou Morte. Venceremos", construída no ano 2000 durante a disputa pela custódia do menino Elián González.

O menino foi resgatado das águas do estreito da Flórida por pescadores depois que a balsa em que viajava com a mãe naufragou; a mãe morreu na travessia. A partir daí começou uma batalha legal entre os familiares do menino em Miami e o pai dele em Cuba. Elián acabou sendo enviado de volta a Cuba.

Mudanças em Washington

Cuba também terá uma Embaixada, em Washington, uma mansão protegida apenas por uma grade não muito alta e sem segurança visível, construída em 1916 - e que já serviu como a Seção de Interesses de Cuba.

Localizada entre as embaixadas da Lituânia e da Polônia, a bela casa de três andares e estilo neoclássico raramente é visitada - ao contrário da Seção de Interesses dos EUA em Havana, onde são formadas grandes filas de pessoas atrás de vistos.

Ela foi atacada duas vezes por grupos cubanos anticastristas: em 1978, pelo grupo armado CORU, e no ano seguinte, pelo o grupo Omega 7, que instalou uma bomba na parte de trás da casa.

Nos andares, foi inaugurado, em 2011, o pequeno bar Hemingway, dedicado ao escritor americano. O bar não é aberto, o acesso se dá apenas em poucas ocasiões e com convite.

No dia 10 de junho de 2014, a casa mostrava os primeiros sinais de mudança ao instalar um mastro para a bandeira cubana.

A abertura das Embaixadas marcará o restabelecimento das relações diplomáticas, que ainda enfrentarão alguns desafios, como o pedido de Cuba pelo fim do embargo econômico.