Patrulhas anti-imigrantes tomam as ruas de países nórdicos
Patrulhas urbanas anti-imigrantes vêm emergindo nas ruas da Finlândia, da Noruega e mais recentemente da Dinamarca, em reação ao fluxo recorde de refugiados que chegam aos países nórdicos. São os chamados Soldados de Odin, que acusam os refugiados de provocar um aumento da criminalidade e afirmam ter a missão de "proteger a população" contra os "intrusos islâmicos".
Na mitologia nórdica, Odin é o deus da sabedoria e da guerra. Os "soldados" caminham pelas ruas com jaquetas pretas, decoradas com a estampa de um capacete viking. Vão desarmados, mas refletem a tensão social gerada pela entrada maciça de refugiados na região. E começam a conquistar adeptos também na Suécia e em outros países do norte da Europa, como a Alemanha.
"Detectamos a movimentação de simpatizantes do grupo na Suécia há poucas semanas", disse à BBC Brasil o oficial Mats Grundström, da unidade de inteligência da polícia sueca. "Nenhum incidente foi registrado ainda, mas estamos de olho neles."
Os Soldados de Odin dizem querer ser os olhos e ouvidos da polícia. Para os críticos, porém, são justiceiros xenófobos.
"Queremos acabar com a criminalidade que vemos hoje em nosso país, e que a polícia é incapaz de enfrentar", disse um porta-voz norueguês dos patrulheiros, que marcharam recentemente pelas ruas de diversas cidades da Noruega.
"Drogas estão sendo vendidas, mulheres estão sendo tocadas, há ataques e violência", acusou.
Suspeita neonazista
O grupo surgiu no fim do ano passado na Finlândia, onde é suspeito de manter vínculos com neonazistas. Na Noruega, a polícia afirma que alguns membros do grupo têm ligações com o crime. Nas mídias sociais, um patrulheiro norueguês publicou fotos em que aparece empunhando armas automáticas e bandeiras da Noruega.
"Migrantes não são bem-vindos", lê-se nas faixas carregadas pelos Soldados de Odin. Até o momento, nenhuma denúncia de agressão a refugiados foi feita contra os patrulheiros.
A estimativa é de que o grupo reúna cerca de 500 integrantes na Finlândia --mas a página dos Soldados de Odin no Facebook tem mais de 32 mil likes, além de vários comentários racistas e de apoio ao grupo, enviados por internautas de países como Áustria, Austrália e Canadá.
Ativistas antirracismo também se mobilizam: durante ato na cidade finlandesa de Tammerfors, manifestantes fantasiados de palhaços dançaram em torno dos Soldados de Odin (Soldiers of Odin, no nome original em inglês), a quem chamavam de "LOLdiers of Odin" --uma referência à sigla inglesa LOL ("laughing out loud", que em português pode ser traduzida como "rindo muito").
Na cidade norueguesa de Tønsberg, residentes rechaçaram os patrulheiros afirmando que não precisavam de proteção.
Os governos nórdicos têm expressado sua condenação à atuação das patrulhas urbanas.
Na Noruega a temperatura política subiu nos últimos dias, quando um deputado do Partido Progressista --a força de extrema direita que compõe a coalizão de governo com o Partido Conservador - elogiou a atuação dos patrulheiros.
"É claro que não damos apoio ilimitado aos Soldados de Odin. Mas há tempos enfrentamos uma situação nas ruas que ninguém deseja, com crimes sendo cometidos e outros atos indesejáveis, e a polícia norueguesa não possui recursos para fazer seu trabalho. Portanto, achamos que qualquer cidadão que queira contribuir para reduzir a insegurança e o crime deve ser saudado", disse o deputado Jan Arlid Ellingsen, durante um debate na rádio norueguesa.
A primeira-ministra norueguesa, Erna Solberg, usou o Twitter para se distanciar rapidamente dos comentários do deputado.
"Os Soldados de Odin não têm lugar na tarefa de manter a segurança nas ruas. Valores perigosos. As palavras de Ellingsen não representam o governo", escreveu Solberg em sua conta.
Outros integrantes do Partido Progressista também rechaçaram os comentários do deputado, incluindo a líder do partido e ministra das Finanças, Siv Jensen.
O Partido Socialista de Esquerda foi além e exigiu que o governo norueguês determine a legalidade ou não das patrulhas dos Soldados de Odin.
Constituição
Na Finlândia, a polícia diz que a Constituição garante aos cidadãos a liberdade de movimento e que não há amparo legal para proibir as patrulhas urbanas.
"Isso não dá a nenhum grupo o direito de interferir na liberdade de movimento dos demais cidadãos", destacou na emissora finlandesa Yle o comandante da polícia nacional, Seppe Kolehmainen. "A polícia acompanha a situação e estará pronta para intervir diante de eventuais ações ilegais".
A polícia sueca tem a mesma visão.
"Não é ilegal caminhar em grupos, desde que esses grupos não cometam nenhum ato ilegal", diz o oficial Mats Grundström.
Mas o aumento do ativismo xenófobo preocupa: a agência de inteligência norueguesa (PST) adverte que a ameaça representada por grupos de extrema direita vem crescendo na Noruega.
Ao contrário da Suécia, a Finlândia, a Noruega e a Dinamarca não têm tradição de receber grandes números de refugiados. Em 2015, 32 mil migrantes chegaram à Finlândia --número quase dez vezes maior do que o registrado no ano anterior, em um país de 5,4 milhões de habitantes que há três anos vive uma recessão econômica.
A Noruega também recebeu um número recorde de 31 mil refugiados. A Dinamarca registrou 20 mil pedidos de refúgio e chegou a aprovar uma controversa lei que permite o confisco de bens de refugiados para ajudar a cobrir suas despesas. Na Suécia, chegaram 163 mil solicitantes de refúgio --a maior taxa per capita de recepção de migrantes registrada na Europa. Todos os países tentam agora fechar as portas em um continente dividido diante da magnitude do êxodo dos desesperados em fuga.
Os Soldados de Odin crescem em meio a um clima de medo e desconfiança que se forma entre determinadas parcelas da população e que turbina os índices de popularidade dos partidos anti-imigração.
A polarização foi acentuada a partir de notícias de roubos e atos de agressão sexual supostamente praticados por imigrantes na capital finlandesa durante a celebração do Ano Novo, além de acusações de que a polícia sueca ocultou denúncias sobre incidentes similares na capital, Estocolmo --e que teriam se reproduzido em Colônia e outras cidades da Alemanha.
Entre outros incidentes mais recentes, uma assistente social de 22 anos de idade foi morta a facadas por um refugiado na Suécia, quando tentava apartar uma briga em um abrigo para imigrantes menores de idade.
Mas muitos argumentam que se trata de casos isolados por parte de determinados grupos, enquanto alertam para o perigo de uma onda indiscriminada de ódio aos imigrantes.
E os diversos casos de incêndios suspeitos e ataques contra centros de refugiados, vistos nos países nórdicos, são sinal de que os imigrantes também estão com medo.
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