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Oscar 2017: a fascinante história do menino indiano que encontrou sua família graças ao Google Earth

24/02/2017 08h05

O pequeno Saroo vivia com sua humilde família em um vilarejo na Índia. Um dia, ele se perdeu, foi dormir em um trem e acordou em Calcutá, a cerca de 1.500 km de casa.

Ele tinha 5 anos e, depois de passar um tempo vivendo nas ruas, foi adotado por um casal australiano. Mas sua aventura não pode ser resumida em algumas poucas frases.

A história real de Saroo é o enredo de Lion: Uma Jornada Para Casa, filme dirigido por Garth Davis, estrelado por Dev Patel e Nicole Kidman, e que neste domingo concorre a seis Oscars, entre eles o de 'Melhor Filme'.

A verdadeira história comovente

Em 2012, o mundo foi cativado pela notícia de um jovem indiano que, 25 anos depois, tinha encontrado sua família graças ao Google Earth.

Tudo começou quando Saroo, de 5 anos, pediu para que seu irmão mais velho, Guddu, o levasse com ele. Os irmãos viviam com sua irmã e sua mãe em Ganesh Talai, um bairro na cidade de Khandwa, na Índia Central.

A situação econômica da família era precária e, às vezes, Guddu ganhava alguns trocados varrendo vagões de trem.

Numa noite em 1986, Guddu e Saroo saíram de casa e não voltaram.

"Era tarde da noite. Nós descemos do trem em Burhanpur e eu estava tão cansado que sentei na estação e dormi", disse Saroo em entrevista à BBC quando sua história foi publicada há cinco anos.

Esse cochilo acabou determinando o resto de sua vida.

"Eu pensei que meu irmão fosse me pegar, mas quando acordei, não o vi em nenhum lugar. Então, vi um trem na minha frente e eu decidi subir, na esperança de encontrá-lo."

Não só não o encontrou como dormiu de novo e só acordou 14 horas depois...em Calcutá.

"Eu estava muito assustado. Eu não sabia onde estava."

Ele tentou comprar uma passagem de volta para casa, mas o vendedor não entendia o destino que Saroo pronunciava. A criança dizia "Ginestlay" vez de Ganesh Talai.

Incapaz de ler, escrever e entender a língua falada em Calcutá, Saroo resignou-se a viver na rua.

"Eu tinha que ter muito cuidado. Não podia confiar em ninguém", relatou.

Ele conheceu um adolescente que o levou a uma delegacia de polícia, mas, ali, as autoridades mal conseguiam entender o que ele dizia - ele vinha de uma região com outra língua.

Semanas depois, o garoto foi transferido para a Sociedade Indiana de Adoção.

Incapazes de rastrear sua família, as autoridades declararam oficialmente a criança como perdida. O garoto foi adotado por Sue e John Brierley, um casal de Hobart, na Tasmânia, Austrália.

Nesse meio tempo, sua mãe biológica, Kamla Munshi, continuava à sua procura.

Em busca de suas raízes

Saroo adaptou-se bem à sua nova casa. Os Brierley adotaram, um ano depois, outra criança indiana, Mantosh.

Mas o desejo de encontrar sua família foi se tornando cada dia mais forte. Saroo mantinha gravada a imagem de sua mãe.

Em 2005, aos 24 anos, a vontade de encontrar sua família tornou-se uma obsessão. Ele começou a usar o Google Earth para encontrar seu lugar de origem.

"Usei tudo que eu conseguia lembrar sobre a paisagem e arquitetura da minha cidade natal", disse Saroo.

Depois de anos olhando diferentes imagens de satélite, Saroo resolveu apostar em uma nova estratégia.

"Certa noite, eu decidi que tinha de mudar os planos. Eu não sabia onde minha cidade natal ficava, mas sabia onde cheguei depois da longa viagem."

"Multipliquei o tempo que passei no trem - cerca de 14 horas - pela velocidade dos trens indianos e cheguei ao resultado de uma distância aproximada de cerca de 1.200 km", explicou à BBC.

Saroo desenhou um círculo no mapa com um ponto central em Calcutá e com um raio de pouco mais de 1.200 quilômetros.

Ele manteve em sua memória a imagem de uma cidade pequena, empoeirada e cheia de memórias de infância: a floresta, o templo, uma pequena ponte, uma parede e a cachoeira onde costumava toma banho.

Até que encontrou o que estava procurando: Khandwa. Era o ano de 2011.

O emotivo reencontro

Pouco depois, Saroo viajou para Khandwa e encontrou sua casa no bairro de Ganesh Talai. Mas não era o que imaginava, ela parecia abandonada.

Ele perguntou às pessoas que estavam ali perto e uma delas lhe disse que o levaria até sua mãe.

"Eu me senti bloqueado e pensei: 'É verdade o que estou ouvindo?'".

No início, Saroo não a reconheceu.

"A última vez que eu a tinha visto, ela tinha 34 anos, era jovem e muito bonita. Eu tinha esquecido o impacto do tempo. Mas a estrutura facial era a mesma e eu disse: 'Sim, é minha mãe'".

"Eu acho que ela estava tão paralisada quanto eu. Ela teve muita dificuldade em assimilar a ideia de que seu filho tinha aparecido 25 anos mais tarde, como um fantasma."

Embora muitos temiam que Saroo estivesse morto, uma cartomante tinha dito a sua mãe que um dia ela voltaria a ver o filho.

E foi nesse reencontro que Saroo soube que seu irmão Guddu também não tinha voltado para casa.

"Um mês depois do meu desaparecimento, encontraram meu irmão morto nos trilhos da ferrovia."

Sua mãe nunca soube se foi um crime ou um acidente.

Até o tapete vermelho

Quando a história de Saroo Brierley veio à tona, em abril de 2012, já se falava que ela daria um bom filme.

Em 2013, pouco depois de relatar sua experiência no livro A Long Way Home, produtores de filmes começaram a bater à sua porta.

Lion: Uma Jornada Para Casa nasceu ali.

"As pessoas estão muito intrigadas e fascinadas pelo filme", disse ele.

Saroo voltou para a Índia mais de uma dúzia de vezes, mas a Tasmânia ainda é a sua casa.

"Ali é onde está meu coração, minha família, meus amigos."