Topo

Sete conclusões após os protestos pró-Bolsonaro

A reforma da Previdência foi defendida pela maiorida dos manifestantes na avenida Paulista - 26.mai.2019 - Roberto Costa/Código19/Folhapress
A reforma da Previdência foi defendida pela maiorida dos manifestantes na avenida Paulista Imagem: 26.mai.2019 - Roberto Costa/Código19/Folhapress

27/05/2019 11h52

Milhares de pessoas foram às ruas em várias cidades brasileiras no domingo, 26, apoiar o governo Jair Bolsonaro. Não foram manifestações gigantes, mas expressivas. Os setores que foram às ruas tiveram como alvo preferencial o chamado "centrão", grupo de parlamentares de partidos de centro e centro-direita, e demonstraram apoio aos projetos dos ministros Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) e Paulo Guedes (Economia).

Os atos foram convocados em resposta aos protestos realizados em 15 de maio contra os bloqueios anunciados no Orçamento da Educação.

Inicialmente apoiados por Bolsonaro e seus filhos, os protestos de domingo tinham uma pauta difusa. Na semana anterior, circularam nas redes sociais mensagens pedindo o fechamento do STF e postagens sobre a manifestação estavam sendo acompanhadas pela hashtag #vamosinvadirocongresso no Twitter.

Ante a repercussão negativa, principalmente na classe política e mesmo entre governistas, as bandeiras dos atos passaram a se concentrar em apoio à Reforma da Previdência e em projetos de Moro e Guedes.

Bolsonaro desistiu de ir ao ato e desencorajou a presença de seus ministros. No domingo, fez uma série de tuítes apoiando os protestos.

"Há alguns dias atrás, fui claro ao dizer que quem estivesse pedindo o fechamento do Congresso ou STF hoje estaria na manifestação errada. A população mostrou isso. Sua grande maioria foi às ruas com pautas legítimas e democráticas, mas há quem ainda insista em distorcer os fatos", escreveu.

A BBC News Brasil listou sete conclusões sobre as manifestações.

1 - Não foram gigantes, mas foram expressivas

Havia uma grande expectativa em relação à quantidade de pessoas que compareceriam às manifestações, principalmente por causa de divisões na direita no curso das convocações - por causa de pautas consideradas radicais, grupos como o MBL e deputados do partido governista PSL como Janaina Paschoal se opuseram aos atos - e pelo recuo de Bolsonaro, que decidiu não ir.

O resultado: por um lado, os atos não foram gigantes; eles perdem na comparação com as manifestações contra os cortes de verba na educação e dos protestos pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2015. Por outro, as milhares de pessoas que foram às ruas mostraram que o presidente ainda conta com uma expressiva base de apoio que vai às ruas, apesar da queda em sua popularidade nos primeiros meses de governo.

2 - Centrão vira alvo preferencial da direita

"Tudo o que o 'centrão' faz é contra o Brasil. Eles passam qualquer votação na frente só para prejudicar o Bolsonaro", afirmou à BBC News Brasil o confeiteiro Valdir dos Santos Vieira, 37 anos, que foi ao protesto na avenida Paulista, em São Paulo.

A avaliação não foi só de Valdir - o chamado "centrão" foi o principal alvo de crítica nos protestos pelo Brasil, tomando o lugar do tradicional "pixuleco" contra o ex-presidente Lula, por exemplo. O "centrão" é como são chamados os parlamentares de partidos de centro e centro-direita, como Democratas, Solidariedade, PP, PR, PSD, PTB, entre outros.

Esse grupo de deputados foi personificado no deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, alvo de muitos xingamentos e faixas. Paradoxalmente, Maia é o principal articulador pela Reforma da Previdência, um dos projetos que o governo Bolsonaro tenta aprovar no Congresso.

3 - Crise com o Congresso persiste

Analistas dizem que o tamanho dos protestos não foi suficiente para que Bolsonaro supere a crise que vive com o Congresso, apesar de terem mostrado que o presidente ainda tem "bala".

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, a exaltação de Bolsonaro aos atos que criticaram duramente o "centrão" pode ter até aumentador a crise com o Congresso. Os posts do presidente teriam irritado parlamentares.

Os cinco meses de administração Bolsonaro têm sido marcados por uma relação difícil com o Congresso, já que o presidente não construiu uma base de apoio ao seu governo sob a justificativa de implementar uma "nova política", sem "toma lá dá cá" ou seja, sem envolver a distribuição de cargos na máquina federal. Por isso, tem enfrentado dificuldade para aprovar diversos projetos.

Mas, segundo analistas, os protestos de domingo, chamados em parte para pressionar pela aprovação desses projetos, não foram grandes o suficiente para assustar o Congresso.

"Nitidamente, o movimento tinha objetivo de constranger o Congresso. Se fossem dois milhões de pessoas na rua, certamente o Congresso ficaria intimidado, mas como ficou aquém do esperado pelos organizadores acaba contribuindo para piorar a relação", disse à BBC News Brasil o cientista político da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Geraldo Tadeu Monteiro. "Acho que a crise vai persistir porque não há, por parte do governo, nenhum projeto para construção de uma base."

Outras análises apontam para um certo impulso que Bolsonaro pode ter ganhado com os atos: "Protestos pró-governo neste domingo parecem ter dado uma força política ao presidente", avaliou o Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, dizendo também que o capital político do presidente se mantém "relativamente robusto".

Manifestantes arrancam faixa em defesa da educac?a?o na UFPR

UOL Notícias

4 - Racha da direita sai das redes e chega às ruas

Outro alvo dos manifestantes foram membros da própria direita, concretizando um movimento que já tinha tomado as redes na semana anterior, com as duras críticas feitas ao líder do Movimento Brasil Livre (MBL), o deputado federal Kim Kataguiri (DEM).

Kataguiri havia se posicionado contra os protestos deste domingo, 26, por considerar que apoiavam pautas radicais, como o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Nos atos em São Paulo, o MBL foi chamado de "Movimento Bumbum Livre" pela multidão; e Kataguiri, de "traidor". O MBL foi um dos principais impulsionadores das manifestações que apoiaram o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB) e a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP), que também haviam se posicionado contra os atos, também foram alvos. Doria havia classificado o ato como "inútil" e "inadequado".

5 - Exaltados, Moro e Guedes têm projetos endossados

Os ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Justiça, Sergio Moro, tiveram seus projetos exaltados. Havia um amplo apoio nos atos à Reforma da Previdência tocada por Guedes e também ao pacote anticrime proposto por Moro.

No Twitter, Moro também publicou mensagem em apoio aos protestos. "Festa da democracia. Povo manifestando-se em apoio ao Pr Bolsonaro, Nova Previdência e ao Pacote anticrime. Sem pautas autoritárias. Povo na rua é democracia. Com povo e Congresso, avançaremos. Gratidão."

Em São Paulo, a reforma da Previdência foi amplamente defendida nos carros de som do protesto e pelos manifestantes ouvidos pela BBC News Brasil. "A reforma é o que o país mais precisa agora", afirmou o médico Heitor Oliveira.

Os líderes do ato repetiram o discurso do governo e de parte dos atores econômicos de que a reforma é primordial para fazer a economia andar nos próximos anos.

Protestos em prol do governo marcam o fim de semana

Band Notí­cias

6 - STF também é atacado, mas sem radicalismo anunciado

Mensagens contra o Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive apoiando seu fechamento, circularam na semana anterior aos protestos. Nos atos em si, o STF também foi alvo, mas em geral apenas com críticas e não com reivindicações mais extremas.

No protesto em São Paulo, o STF era um dos alvos preferenciais, com vaias e até pedidos de impeachment. Os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes foram xingados, às vezes com palavras de baixo calão.

O STF "está de brincadeira", afirmou o consultor Ricardo Gerhard. "Eles conseguem votar contra as próprias leis."

Para o médico Heitor Oliveira, o Supremo "não se dá ao respeito". "Você vê ministro que vive na ponte-aérea Brasil-Lisboa. Outro que faz palestra em empresa privada ou participa de festas com advogados", afirma.

"Se os ministros vivem batendo boca entre eles, por que um cidadão comum não pode questioná-los?".

Já o confeiteiro Valdir dos Santos Vieira cita uma licitação do Supremo para a compra de vinhos e lagostas, pleito que chegou a ser questionado na Justiça, mas acabou liberado. "Os caras comem lagosta e o povo passando fome?", diz.

7 - País segue dividido

Convocadas após os protestos contra o bloqueio de verbas para a educação que levaram milhares de pessoas às ruas, os protestos pró-Bolsonaro, apesar de menores, mostraram que o país segue dividido.

Em 2015, o Brasil viu suas ruas sendo tomadas com protestos ora de esquerda, ora de direita. Um novo protesto contra o governo, marcado para dia 30, mostra que novamente essa polarização pode ficar mais escancarada.