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A cidade nuclear de Juraguá, sonho atômico que Fidel quis construir em Cuba inspirado na União Soviética

A usina de Juraguá, em Cuba, nunca chegou a entrar em operação - AFP/BBC
A usina de Juraguá, em Cuba, nunca chegou a entrar em operação Imagem: AFP/BBC

16/06/2019 09h54

Na década de 1980, o governo cubano iniciou a construção de uma usina nuclear projetada para acabar com a dependência energética da ilha.

Era a oportunidade de realizar um dos grandes sonhos da revolução cubana: pôr fim à sua onerosa dependência do petróleo.

A usina nuclear de Juraguá começou a ser construída no início dos anos 1980, seguindo o modelo da usina soviética de Chernobyl, onde poucos anos depois foi registrado o maior acidente nuclear da história.

O projeto contemplava a criação de uma usina, junto à qual seria construída a chamada Cidade Nuclear, onde seriam erguidas casas e infraestrutura para acomodar milhares de trabalhadores, muitos deles vindos da antiga União Soviética.

"(Construir) uma usina e uma cidade ao lado dela se tratava de imitar o modelo da central de Chernobyl", explicou Jonathan Benjamin Alvarado, autor do livro Power to the people. Energy and the Cuban nuclear programme ("Energia para o Povo: a energia e o programa nuclear cubano", em tradução livre), em entrevista à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, em 2018.

Conforme explicou o jornalista britânico Darmon Richter, ambas as centrais foram projetadas seguindo o modelo da "utopia socialista de Atomgrado", um modelo urbano ideal - repleto de habitações sociais e inesgotáveis ??fontes de energia não poluentes - concebido pelos urbanistas soviéticos na década de 1970.

Mas Juraguá nunca entrou em operação.

O que aconteceu?

Uma cidade nuclear sem reatores

O governo cubano colocou Fidel Castro Díaz-Balart, filho mais velho do líder da revolução, à frente do programa nuclear de Juraguá. Ele havia se formado em Física no Instituto de Energia Atômica I. V. Kurchatov, em Moscou, na Rússia.

Conhecido como "Fidelito", Castro Díaz-Balart foi nomeado secretário-executivo da Comissão de Energia Atômica da ilha.

A usina deveria satisfazer até 15% das necessidades energéticas do país e gerar milhares de empregos.

"Os cubanos queriam mudar seu modelo de produção de energia e se voltar para outras fontes alternativas, incluindo eólica e solar", explicou Alvarado.

Em 1982, foi iniciada a construção, com apoio técnico e econômico soviético, do primeiro dos quatro reatores de 440 megawatts de potência que estavam previstos.

Foi o único que foi concluído.

Mas a Cidade Nuclear, onde foram erguidas casas e infraestrutura para abrigar milhares de trabalhadores, foi construída.

Acidente e declínio

Em 1986, o desastre na usina nuclear de Chernobyl expôs as fraquezas do programa nuclear da União Soviética para o mundo.

O acidente suscitou grandes preocupações por parte do governo dos Estados Unidos, que se deu conta de que a cerca de 4,8 mil km de Washington estava sendo construída uma usina nuclear soviética sobre a qual eles não teriam nenhum controle ou ingerência.

Os problemas não foram apenas políticos.

Alvarado lembra que "foi a primeira vez que os soviéticos tentaram construir uma usina nuclear fora da URSS, e não entenderam que as circunstâncias de Cuba tornavam isso impossível".

O especialista acredita que a ilha não tinha capacidade financeira para sustentar um projeto como esse.

Isso acabou comprovado pouco tempo depois, em 1989, quando a União Soviética entrou em colapso e, com ela, a valiosa ajuda econômica soviética que Cuba recebia chegou ao fim, deixando a ilha mergulhada em uma forte crise de escassez, conhecida como Período Especial.

Assim como a estrada que deveria ligar a capital Havana ao leste da ilha, a Cidade Nuclear de Juraguá ficou inacabada.

Fidel Castro procurou por algum tempo parceiros internacionais para concluir a obra, que havia se tornado um emblema de seu legado político.

Em setembro de 1992, diante dos trabalhadores da usina, ele finalmente anunciou: "Não temos alternativa a não ser parar a construção".

A essa altura, Cuba já havia investido US$ 1,1 bilhão na construção da usina.

Ruínas e abandono

O fracasso do projeto Juraguá também levou à demissão de Castro Díaz-Balart, que estava sendo acusado pelo pai de "incompetência", segundo relatos da imprensa à época.

Em 2018, "Fidelito" cometeu suicídio após sofrer um quadro de "depressão profunda", segundo a imprensa oficial cubana.

Mas, embora a usina nunca tenha entrado em operação, a Cidade Nuclear que foi erguida junto a ela sobreviveu.

Cerca de 4 mil, pessoas que se instalaram ali decidiram ficar, apesar de o projeto ter sido abandonado.

Hoje, a Cidade Nuclear permanece como "um pequeno bolsão de vida no meio de todo aquele cimento vazio", disse Damon Richter, que visitou o local em 2014, à BBC News Mundo.

Para os moradores da Cidade Nuclear, o abandono de Juraguá foi "uma oportunidade perdida", que os deixou sem os investimentos e os empregos que haviam sido prometidos.


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