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'Local de reunião de comunistas': o que Bolsonaro e aliados já disseram sobre a ONU

Durante campanha, Bolsonaro chegou a dizer que Conselho de Direitos Humanos da ONU não servia "para absolutamente nada"; ele discursa nesta terça na Assembleia Geral - Adriano Machado/Reuters
Durante campanha, Bolsonaro chegou a dizer que Conselho de Direitos Humanos da ONU não servia 'para absolutamente nada'; ele discursa nesta terça na Assembleia Geral Imagem: Adriano Machado/Reuters

23/09/2019 13h58

Presidente brasileiro chegou a dizer que Brasil sairia do Conselho de Direitos Humanos; seu filho, assessor especial e guru também criticam o órgão.

Para Bolsonaro e bolsonaristas, a ONU é algo "mais aparelhado que universidade pública", serve de "trampolim" para aprovar "leis globalistas" no mundo e seu Conselho de Direitos Humanos é um "local de reunião de comunistas" que não serve "para absolutamente nada".

Criada em 1945 com o propósito de manter a paz entre nações depois da Segunda Guerra Mundial, a ONU já foi bastante criticada pelo presidente brasileiro e seus aliados.

Agora, Bolsonaro irá à sede do órgão, em Nova York, para discursar em sua Assembleia Geral. Como é tradição com líderes brasileiros, ele será o primeiro a discursar, nesta terça-feira (24/09).

Bolsonaro tem dito que falará sobre a Amazônia e defenderá a soberania brasileira ? as queimadas que atingiram a floresta no Brasil foram tema da reunião do G7 no mês passado e viraram centro de uma crise internacional, com escalada de tensão entre Bolsonaro e o presidente francês, Emmanuel Macron.

A BBC News Brasil resgatou frases de Bolsonaro e de seus apoiadores sobre a ONU em tuítes, vídeos e entrevistas.

Bolsonaro

'[Conselho de Direitos Humanos] Não serve para absolutamente nada' e é 'local de reunião de comunistas'

Durante a campanha presidencial, em agosto do ano passado, Bolsonaro chegou a dizer que, se eleito, retiraria o Brasil do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

"Aquele conselho não serve para absolutamente nada", afirmou. "Não é apenas porque vota contra Israel de forma corriqueira, porque estão sempre do lado de quem não presta..."

Sua afirmação foi feita quando o Comitê de Direitos Humanos da ONU, formado por peritos independentes, acolheu um pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que ele pudesse disputar as eleições presidenciais no Brasil.

A instituição recomendou que o Estado brasileiro tomasse "todas as medidas necessárias" para garantir que Lula pudesse exercer seus direitos políticos na prisão como candidato às eleições presidenciais.

Questionado por um repórter se retiraria o Brasil do conselho caso fosse eleito presidente, respondeu: "Tiro, sim, para continuar funcionando dessa maneira, tiro, é economia para nós. Não serve para absolutamente nada o Conselho de Direitos Humanos da ONU". Disse, ainda: "Saio fora, não serve para nada, é um local de reunião de comunistas e de gente que não tem qualquer compromisso com a América do Sul pelo menos".

No Twitter, escreveu: "Há mais ou menos 2 meses falei em entrevista que já teria tirado o Brasil do conselho da ONU, não só por se posicionarem contra Israel, mas por sempre estarem ao lado de tudo que não presta. Este atual apoio a um corrupto condenado e preso é só mais um exemplo da nossa posição".

Em julho deste ano, Bolsonaro voltou a falar sobre o Conselho de Direitos Humanos. Desta vez, porém, abordou a candidatura à reeleição do Brasil a um dos 47 assentos do conselho. Disse que suas principais pautas seriam o "fortalecimento das estruturas familiares" e a "exclusão das menções de gênero", sem dar maiores detalhes.

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos do governo Bolsonaro, Damares Alves, discursou em fevereiro no Conselho de Direitos Humanos da ONU, defendendo a candidatura brasileira. Afirmou que o Brasil continuaria "plenamente engajado com o sistema internacional de direitos humanos".

'Quando tem gente que não tem o que fazer, vai lá para a cadeira de Direitos Humanos da ONU'

Mas Bolsonaro voltou a atacar o órgão, dessa vez criticando diretamente a ex-presidente chilena Michelle Bachelet, atual Alta Comissária de Direitos Humanos da ONU, o principal cargo da área nas Nações Unidas.

O episódio aconteceu no início de setembro, depois que Bachelet alertou sobre o que percebe como uma "redução do espaço democrático" no Brasil e criticou ataques e assassinatos de defensores de direitos humanos e comunidades indígenas.

"Dissemos ao governo que é preciso proteger os defensores dos direitos humanos e do meio ambiente, mas também examinar as medidas que podem desencadear violências contra esses defensores", disse Bachelet.

A jornalistas, Bolsonaro respondeu: "Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 1973, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Parece que quando tem gente que não tem o que fazer, como a senhora Michelle Bachelet, vai lá para a cadeira de Direitos Humanos da ONU".

Alberto Bachelet, pai da ex-presidente do Chile, era general e resistiu ao golpe militar de Augusto Pinochet. Ele foi preso, torturado e morto pela ditadura militar.

Pelo Twitter, junto a uma foto de Bachelet, Dilma Rousseff e Cristina Kirchner, Bolsonaro escreveu: "Michelle Bachelet, Comissária dos Direitos Humanos da ONU, seguindo a linha do Macron em se intrometer nos assuntos internos e na soberania brasileira, investe contra o Brasil na agenda de direitos humanos (de bandidos), atacando nossos valorosos policiais civis e militares".

'Não vou aceitar esmola de país nenhum'

No começo de setembro, a jornalistas, Bolsonaro afirmou que participaria da Assembleia Geral da ONU porque queria "falar sobre a Amazônia". Disse querer "mostrar para o mundo com bastante conhecimento, com patriotismo, falar sobre essa área ignorada por tantos governos que me antecederam".

"Foi praticamente vendida para o mundo. E eu não vou aceitar esmola de país nenhum do mundo a pretexto de preservar a Amazônia, mas na verdade está sendo loteada e vendida. Uma chance que eu tenho de falar pro mundo sobre a nossa Amazônia, eu vou deixar essa oportunidade [passar]?", antecipou, sobre seu discurso.

Discurso 'conciliatório'

Bolsonaro também falou, na semana passada, sobre como será seu discurso, quando concedeu uma entrevista à TV Record. Na ocasião, disse que fará um discurso "conciliatório" e "diferente" dos discursos de líderes que o antecederam, reafirmando a soberania brasileira.

"Eu falei há um tempo atrás que iria de qualquer maneira, nem que fosse de cadeira de rodas, com todo respeito aos cadeirantes, e graças a Deus isso vai ser possível. Já comecei a rascunhar o discurso, um discurso diferente dos que me antecederam. É conciliatório, sim, mas reafirmar a questão da nossa soberania e do potencial que o Brasil tem e o que o Brasil representa para o mundo. Coisa que, pelo que me consta, pelo que eu estudei até agora, poucos ou quase nenhum presidente teve uma postura dessa natureza na ONU", afirmou na entrevista que foi ao ar na segunda-feira, 16.

'Vou ser cobrado'

A última vez que o presidente falou sobre a ONU e seu discurso na Assembleia Geral foi na quinta-feira, dia 19. "Tá na cara que vou ser cobrado", admitiu ele em uma live no Facebook, dizendo que sua fala em Nova York seria "objetiva".

"Nós iremos para Nova York, lá na ONU, para fazer um pronunciamento, e tá na cara que vou ser cobrado. Alguns países me atacam, de forma bastante virulenta, dizendo que sou responsável pelas queimadas no Brasil. Queimada tem todo ano, infelizmente. Quer que faça o quê? Tem. Até por questão de tradição, o caboclo toca fogo para plantar, o índio faz a mesma coisa... Tem aqueles que fazem de forma criminosa também", afirmou.

"Se Deus quiser, vou estar em Nova York na terça-feira. Estou me preparando para um discurso bastante objetivo, diferente de outros presidentes que me antecederam. Ninguém vai brigar com ninguém lá, pode ficar tranquilo. Vou apanhar da mídia, que sempre tem do que reclamar, e vou falar como anda o Brasil nesta questão. Eles querem desgastar a imagem do Brasil para ver se criam um caos aqui. Quem se dá bem? O pessoal lá de fora. Se a nossa agricultura cair, outros países que vivem disso vão se dar bem."

Eduardo Bolsonaro

'Nível de entorpecimento da ONU'

Na mesma época em que seu pai anunciava que o país sairia do Conselho de Direitos Humanos da ONU caso fosse eleito, no ano passado, seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, possível novo Embaixador brasileiro nos Estados Unidos, disse que a decisão do comitê de que o ex-presidente Lula deveria ter seus direitos políticos garantidos na prisão demonstrava "o nível de entorpecimento da ONU", "dominada por ideologias que não condizem com nossa cultura".

'Leis globalistas'

Já no começo deste ano, Eduardo disse que a ONU servia de "trampolim para leis globalistas que jamais seriam aprovadas nos Congressos Nacionais" de países.

Em 7 de dezembro de 2017, fez uma previsão: "Chegará um dia que EUA e Israel sairão da ONU. Anote aí".

Filipe Martins

O assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Filipe Martins, já disse que a ONU é "mais aparelhada que universidade pública" e que seria "jeca" citar o órgão "em argumento de autoridade".

Também colocou a ONU ao lado do ex-presidente do Irã Mahmoud Ahmadinejad, do ex-presidente de Cuba Raúl Castro, e do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, entre outros, como "representantes" enviado por "satanás" para apoiar o ex-presidente Lula.

'Mais aparelhado que universidade pública'

'Satanás'

'Organizações internacionais são aparelhadas por políticos de esquerda que perderam disputas eleitorais'

Em uma thread de agosto de 2018, quando Bolsonaro anunciou que o Brasil deixaria o Conselho de Direitos Humanos da ONU caso ele fosse eleito, Martins afirmou que isso seria "apenas um bom ponto de partida do qual se negociará a diminuição da interferência das agências, conselhos e comitês do Sistema ONU em nosso país".

"Há muito tempo, como ilustra o caso recente de Bachelet, as OIs [organizações internacionais] são aparelhadas por políticos de esquerda que perderam disputas eleitorais e que, sem recursos para levar sua agenda adiante, instrumentalizam essas OIs, valendo-se do verniz de autoridade que elas ainda carregam."

Segundo sua argumentação, agências da ONU são instrumentalizadas "para estabelecer critérios que determinarão se a educação, a saúde e a qualidade de vida serão consideradas boas ou ruins, empurrando no pacote vários itens da agenda progressista" sem contestação e com "verniz de autoridade".

Olavo de Carvalho

'Fomenta a nova ordem mundial'

O escritor Olavo de Carvalho, considerado guru do ideológico da família Bolsonaro, também já falou sobre a ONU diversas vezes. Em vídeos antigos encontrados no YouTube, ele aparece dizendo ? sem apresentar qualquer prova ? que a "100 ou 200 comissões da ONU" discutem "modificações políticas, culturais" para o que ele chama de "mundialização do poder", ou a formação de uma "nova ordem mundial".

"Neste mesmo momento, enquanto nós estamos discutindo e conversando sobre isso aqui, tem umas 100 ou 200 comissões da ONU, think tanks, elites universitárias etc discutindo novas modificações políticas, culturais etc. que resultarão na mundialização do poder. Eles fazem isso dia e noite. Praticamente não se faz outra coisa no mundo senão fomentar a tal da nova ordem mundial", disse ele em 2004.

Em outras duas ocasiões, falou que as leis aprovadas no Brasil vêm da ONU.

"Todas as leis politicamente corretas que são adotadas no Brasil, na Argentina, no Peru, na América Latina, na Zâmbia, na casa do c....., todas vêm prontas da ONU. É uma coisa de uma uniformidade extraordinária", afirmou.

Em outro vídeo, diz, também sem apresentar qualquer prova, que "todas as leis que foram promulgadas no Brasil nos últimos 10 ou 15 anos, todas vieram prontinhas da ONU".