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'Vídeo só mostra 10% do que aconteceu': Palestino alvejado pela polícia de Israel comenta que imagens viralizaram

Karam Qawasmi afirma ainda sentir dores da agressão que sofreu em 2018 - GETTY IMAGES
Karam Qawasmi afirma ainda sentir dores da agressão que sofreu em 2018 Imagem: GETTY IMAGES

14/11/2019 09h03

Atenção: esta reportagem contém link para um vídeo que mostra um homem sendo atingido por uma arma supostamente não letal

"O que é mostrado no vídeo não é mais do que (alguns) segundos dessa realidade terrível! O que não é mostrado naqueles segundos registrados é mais duro, mais horrível, mais doloroso", escreveu Karam Qawasmi em sua página no Facebook.

O jovem palestino de 22 anos se refere a um incidente que ocorreu quase 18 meses atrás, numa passagem subterrânea na qual ele foi baleado por uma arma não letal. A principal acusada é uma policial israelense da fronteira, mas ela nega ter atirado no jovem.

Mas o episódio somente veio à tona quando uma filmagem do ataque foi transmitida por uma emissora de TV israelense e depois viralizou na internet.

O vídeo, publicado por Yishai Porat do Channel 13 News, mostra agentes de fronteira israelenses gritando com Qawasmi, que começa a se afastar deles no túnel. Em seguida há um tiro e ele cai no chão.

"Eu não representava ameaça para os soldados. Eu mostrei minha carteira de identidade", afirmou o jovem palestino à BBC Arabic.

Naquele dia, 25 de maio de 2018, ele havia saído de sua casa em Hebrom, na Cisjordânia, para uma entrevista de emprego perto de Jerusalém.

Foi no trajeto de volta que os policiais lhe deram a ordem de parar.

"Eu fui levado contra minha vontade para uma área desconhecida onde sofri abusos brutais e agressões por mais de três horas na cabeça, nas costas, por todo o meu corpo. Eles me mandaram sair dali antes de ter sido baleado", relata.

O vídeo de 26 segundos mostra seus gritos de dor e sua queda no chão depois do disparo.

A bala que atingiu Qawasmi é supostamente não letal, mas quando é disparada de perto pode causar danos graves a órgãos vitais e mesmo fraturar ossos. Ela parece com uma cápsula com uma base de plástico e ponta bastante dura feita com espuma de alta densidade.

Qawasmi disse ter desmaiado minutos depois de ter sido atingido.

"Eu estava esperando aquele tiro. Andei já esperando que me atingissem", relatou à BBC Arabic.

Sem suporte

Segundo o relato do jovem, quando ele acordou, viu policiais armados gritando. "Não tive nenhum suporte. Andei ferido por uma hora e meia até Anata (cidade próxima de Jerusalém Oriental) e depois fui até o hospital em Hebrom."

"Eles me bateram e atiraram como se estivessem jogando videogame, caçando pombos. Me trataram como se eu fosse um animal."

O jovem, que diz ter percebido que a ação estava sendo filmada, relata ter passado um mês em casa se recuperando, mas ainda diz sentir dores da agressão.

Ele conseguiu um emprego em uma loja na Cisjordânia e quer levar uma vida normal. "Gostaria que todos os palestinos pudessem viver em paz, segurança e liberdade como os povos do mundo", escreveu ele em sua página no Facebook.

Investigação

O Ministério da Justiça de Israel afirmou ter concluído uma investigação sobre o incidente e em breve divulgará se vai indiciar ou não a agente de fronteira acusada de ter disparado contra o jovem palestino.

"À época, foram feitos esforços para encontrar a vítima, que infelizmente eles não foram bem-sucedidos", disse a pasta.

"Recentemente, a vítima foi identificada e, nesta fase, os investigadores estão organizando uma reunião com ele para reunir as provas disponíveis", acrescenta.

Mas Qawasmi diz que ninguém falou com ele para obter seu testemunho.

"Meu depoimento é importante (como parte da investigação), porque sou o elemento central do incidente. Sou o centro da história."

'Forma discutível de diversão'

Segundo o jornal israelense Haaretz, na audiência judicial para definir a fiança da policial acusada de atirar em Qawasmi, a juíza afirmou que a suspeita atirou no jovem, que estava gravemente ferido, "como uma forma discutível de diversão".

O advogado da policial acusada negou que ela tenha feito o disparo, também de acordo com o Haaretz, e a filmagem vazada não mostra quem de fato atirou.

O Channel 13 também informou que um outro policial se gabou do incidente com sua namorada por meio de mensagem de celular.

O governo de Israel tem sido acusado por grupos de direitos humanos de usar força desproporcional contra os palestinos. Para um dos principais grupos de direitos humanos em Israel, o B'Tselem, há uma cultura de impunidade por trás de incidentes como de Qawasmi.

"Este registro excepcional mostra o que, infelizmente, é um episódio comum: forças de segurança israelenses ferindo um palestino por absolutamente nenhum motivo", disse o porta-voz do B'Tselem, Amit Gilutz, ao jornal britânico The Independent.

Os casos de violência se agravam também durante capítulos do conflito armado entre as Forças Armadas israelenses e grupos jihadistas na Faixa de Gaza.

No mais recente, Israel lançou mais de 400 mísseis nos últimos dois dias contra alvos acusados de ligação com a Jihad Islâmica da Palestina (PIJ).

A violência cresceu depois que Israel matou o líder do grupo, Baha Abu al-Ata. Uma família de oito pessoas morreu durante um ataque aéreo israelense. Ao todo, as autoridades dos dois lados afirmam que 32 palestinos morreram e dezenas de palestinos e israelenses ficaram feridos.

Segundo o governo israelense, dentre os mortos há 20 integrantes da Jihad Islâmica da Palestina.

Apesar da escalada da violência, a mais acentuada em meses, Israel e militantes em Gaza acordaram um cessar-fogo que passou a valer nesta quinta-feira (14).