Uma semana sem ver o céu: brasileiro relata como é viver na Austrália em meio às queimadas
Morador de Sydney, o brasiliense Marcos Guimarães diz que é a quantidade de fumaça que tem determinado se as pessoas vão conseguir sair de casa.
Na cidade mais populosa da Austrália, o brasileiro Marcos Guimarães, de 32 anos, passou uma semana inteira sem conseguir enxergar o céu. O motivo: a fumaça gerada pelas queimadas que atingem o país.
"Fiquei uma semana sem ver o céu. Dava sensação de claustrofobia, por não ver o mar, não ver o céu. Você se sente confinado."
O brasiliense, que vive há mais de dois anos em Sydney, conta que agora precisa lidar com um novo fator na rotina: é a quantidade de fumaça que determina se as pessoas vão conseguir sair de casa - com ou sem máscara - ou se vão cancelar os compromissos.
"De noite já dá para ter uma ideia. Agora, por exemplo, estou conseguindo ver a lua, mas com fumaça. A gente começa a ver que amanhã não vai ser bom. Eu acordo e a primeira coisa que vejo são as notícias do dia para ver se tá ok sair ou não."
Seca e fogo
A Austrália está vivendo uma de suas piores temporadas de incêndios florestais, alimentados por temperaturas recorde e meses de seca extrema. As queimadas no país já levaram pessoas a evacuarem suas casas e, segundo trabalhadores de emergência que combatem as chamas, a situação pode piorar.
Sydney é a capital de New South Wales, Estado em que o governo declarou situação de emergência devido aos diversos focos de incêndio. Embora não haja queimadas na cidade de Sydney, áreas próximas estão entre as mais afetadas.
Para quem vive em Sydney, Guimarães lembra que o pior período até agora foi no início do mês de dezembro, com incêndios na região das Blue Mountains (Montanhas Azuis), famosas pelo tom azul quando vistas à distância.
"Eu me senti num filme pós-apocalíptico. Não conseguia ver nada além de 100 metros, e todo mundo de máscara. Dá medo do que está acontecendo", disse em entrevista por telefone à BBC News Brasil.
No âmbito profissional, também sentiu impacto. Como representante comercial de uma startup brasileira que vende polpas de frutas para cafés e restaurantes na Austrália, viu as vendas diminuírem. "Você não vai sair de casa para tomar açaí se não está conseguindo respirar."
Embora haja dias em que a vida parece voltar ao normal, como nesta sexta-feira (10), quando o dia amanheceu ensolarado e Guimarães chegou até a ir à praia, o alastramento dos incêndios gera apreensão.
"Eu sinto medo. Parece que não vai acabar nunca, isso tem se prolongado. A sensação é que não há controle dos incêndios. Não vou sair correndo, mas penso: se chegar aqui, tem como evacuar? Isso me dá medo, mas ainda não me faz correr."
Morte e destruição
O total de área queimada na Austrália desde o início da temporada de incêndios, em junho de 2019, foi de 10,7 milhões de hectares até esta quarta-feira (8), de acordo com o jornal The Guardian, que está compilando dados comunicados por todos os Estados australianos.
Os incêndios estão acontecendo em regiões das costas leste e sul, que é onde vive a maioria das pessoas no país. Desde setembro do ano passado, os incêndios deixaram um saldo de ao menos 24 mortos e dezenas de desaparecidos.
A Austrália sempre teve incêndios florestais, mas no ano passado e neste estão piores que o normal.
O consenso científico é que os níveis crescentes de CO2 estão esquentando o planeta. Faz cada vez mais calor na Austrália nas últimas décadas e a previsão é de que isso continue se agravando.
Embora os incêndios façam parte do ciclo climático australiano, especialistas advertiram durante muito tempo que esse clima mais quente e seco iria contribuir para que os incêndios ficassem cada vez mais frequentes e intensos.
Os padrões climáticos mais extremos e as temperaturas mais altas aumentam o risco dos incêndios florestais e fazem com que se espalhem mais rapidamente e por uma área maior.
Além dos efeitos para os seres humanos, as chamas estão sendo devastadoras para a vida silvestre das regiões afetadas. Um estudo acadêmico estima que 480 milhões de animais morreram só em New South Wales.
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