Por que esta semana é essencial para as eleições municipais de 2020
O Congresso Nacional deve começar a decidir nesta semana a respeito do possível adiamento das eleições municipais de 2020 — quando serão escolhidos os prefeitos, vice-prefeitos e vereadores das 5.570 cidades do país.
O mais provável é que o pleito seja postergado em algumas semanas, mas aconteça ainda em 2020.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), decidiu colocar em votação amanhã uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que adia as eleições municipais deste ano.
Um texto sobre o assunto está sendo preparado pelo relator do tema no Senado, o líder da bancada do PDT, Weverton Rocha (MA). Ele propõe que as eleições aconteçam nos dias 15 e 29 de novembro.
Como toda proposta de emenda à Constituição, o adiamento das eleições precisa ser votado em dois turnos em cada Casa do Legislativo. Segundo Davi Alcolumbre, o objetivo é realizar os dois turnos de votação no Senado já nesta semana. Se aprovado, o texto seguirá para a Câmara dos Deputados.
O consenso entre os epidemiologistas ouvidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é de que seria melhor adiar a data das eleições em algumas semanas - para novembro ou dezembro.
Durante o fim de semana, líderes de bancadas na Câmara se reuniram com Weverton Rocha para tratar do assunto.
Apesar disso, há resistência ao adiamento: na maioria, os prefeitos que vão disputar a reeleição são contra, e muitos deputados federais de partidos do chamado "centrão" também não querem adiar o pleito.
Na tarde desta segunda-feira (22), o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, participará de uma sessão no Senado para debater o assunto e apresentar o ponto de vista da Corte — a decisão final cabe aos congressistas.
Esta é pelo menos a segunda vez que Barroso participa de discussões sobre este tema com os políticos.
Como toda Proposta de Emenda à Constituição, o adiamento das eleições precisa ser votado em dois turnos em cada Casa do Legislativo. Segundo Davi Alcolumbre, o objetivo é realizar os dois turnos de votação no Senado já nesta semana. Se aprovado, o texto seguirá para a Câmara dos Deputados.
Apoio no Senado, resistência na Câmara
Ao longo da semana passada, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), expressou dúvidas sobre se o adiamento das eleições teria os votos necessários para passar pela Câmara — como toda PEC, a medida precisaria do "sim" de 308 dos 513 deputados.
"Hoje, eu vejo assim: o Senado tem uma maioria para aprovar. A Câmara ainda está muito dividida e acho que hoje ainda não tem número para isso", disse Maia, na quinta-feira (18).
Maia atribuiu a resistência na Câmara à pressão dos prefeitos contra o adiamento.
Manter a data atual, com o primeiro turno ocorrendo em 4 de outubro, beneficia quem já está no cargo e vai disputar a reeleição. Os incumbentes já são conhecidos pelo eleitorado e, a princípio, largam na frente em um cenário com o tempo de campanha encurtado pela pandemia.
A maior resistência a mudar as datas da eleição está hoje entre os partidos do "centrão" — no jargão da política, o termo é usado para referir-se a partidos conservadores sem orientação ideológica clara, que costumam busca proximidade com o Executivo em troca de cargos e outras benesses.
"Os médicos não provaram nada. Não há dados confiáveis que exijam a mudança de data (das eleições). Tem mais aglomeração numa fila da Caixa Econômica Federal para sacar os R$ 600 do que numa fila de eleição", disse o vice-presidente da Câmara e presidente do Republicanos (antigo PRB), Marcos Pereira (SP), ao jornal Valor Econômico.
Pereira é um dos principais caciques do "centrão" na Câmara.
Questionado pela reportagem da BBC News Brasil, o vice-presidente da Câmara reiterou a posição e enviou um texto no qual defende a manutenção da data original, desde que observadas medidas de segurança, como a ampliação do horário de votação.
Apesar disso, os líderes de algumas das maiores bancadas da Câmara defendem o adiamento das eleições. É o caso do petista Enio Verri (PR), e do tucano Carlos Sampaio (SP), entre outros.
"A nossa posição é respeitar a orientação dos sanitaristas. Na reunião que nós tivemos no TSE, os sanitaristas provaram que o risco da votação em 4 de outubro era muito mais alto. Portanto, nós concordamos com a alteração para novembro. Não vemos nisso nenhum problema", disse Verri à BBC News Brasil, acrescentando que a bancada do PT se reunirá para tirar uma posição definitiva na terça.
Epidemiologistas são favoráveis ao adiamento
No começo de abril, o TSE criou um grupo de trabalho para avaliar os impactos da pandemia do novo coronavírus sobre o calendário eleitoral de 2020. O tribunal também está sendo assessorado por alguns dos principais epidemiologistas e biólogos do país.
Participam do grupo o doutor em virologia e divulgador científico Atila Iamarino; o médico infectologista David Uip; a médica sanitarista Ana Freitas Ribeiro, da iniciativa independente Observatório Covid-19 BR; e o epidemiologista Paulo Lotufo, professor da Universidade de São Paulo (USP), entre outros.
Dos integrantes desse grupo, a maioria defende o adiamento das eleições por algumas semanas - além de outras medidas.
"O consenso dos epidemiologistas (ouvidos pelo TSE) é que fazer um pouco mais para a frente seria bom, para dar mais tempo de ter algum controle e para o preparo acontecer. Por 'mais pra frente', entenda-se novembro ou dezembro", relata Atila Iamarino à BBC News Brasil. A opinião pessoal de Atila é um pouco diferente, no entanto.
"A primeira coisa que teve de ficar clara, e que a gente vai ter que falar pra todo mundo, é que não é exatamente a época do ano em que a eleição acontece. Adiar a eleição por motivo da epidemia não deve fazer grande diferença; o que deve fazer grande diferença é o controle que a gente precisaria ter da epidemia até lá", diz Atila.
"(Em relação à) pandemia, faria mais diferença a política de controle, que a gente não tem tido até aqui, do que qualquer outra coisa", diz ele.
Para o epidemiologista Paulo Lotufo, o ideal seria adiar ainda mais as datas do que a proposta em tramitação no Senado - jogando o primeiro turno para 29 de novembro, e o segundo para 13 de dezembro.
"Será o mais prudente. (Além disso), aumentar o tempo de votação para 12 horas. O ministro Barroso foi hábil em apresentar uma janela entre 15 de novembro e 20 de dezembro", disse Lotufo à BBC News Brasil.
O pesquisador diz ainda que não faz grande diferença reduzir a idade mínima para voto facultativo para pessoas mais velhas - a ideia chegou a ser aventada, mas enfrenta forte resistência entre os políticos. "Eu não vou opinar nem a favor nem contra o voto facultativo para maiores de 60 anos porque, do ponto de vista epidemiológico, será ação de pouca relevância", diz.
Mudança para agradar prefeitos
O relator do texto no Senado, Weverton Rocha, disse que seu texto incluirá um adiamento de todos os prazos do calendário eleitoral - ao contrário da resolução atual do TSE sobre as eleições, que manteve a maioria das datas. Esta seria uma forma de reduzir as resistências de prefeitos, disse Rocha à BBC News Brasil.
"Na verdade, os prefeitos estão muito preocupados em prorrogar as eleições e os prazos (do calendário eleitoral) continuarem os mesmos. Ou seja, você cria um Frankenstein na campanha. Você faz uma convenção (partidária) agora e não pode fazer campanha? Só vai fazer depois de 45 dias? Realmente não tem sentido. Então uma das coisas que eu estou trabalhando é prorrogar tudo que está a vencer de prazo. Jogar para a frente", explica Rocha.
O líder do PDT no Senado cita como exemplos os prazos para escolha de candidatos e também para a transferência de dinheiro dos Estados e da União para os municípios, via convênio — este tipo de recurso não pode ser usado durante o período eleitoral. "Com isso, o prefeito continua trabalhando, e só trata da eleição lá na frente. Aí fica mais fácil", diz.
"Pessoalmente, eu não adiaria a eleição. Agora, você não pode ser irresponsável e levar para um debate desse a opinião pessoal. Eu prefiro ouvir a ciência e ouvir quem entende. Então, se os médicos, os cientistas, os infectologistas estão dizendo que é perigoso (manter), quem sou eu para dizer que estamos certos?", pondera Rocha.
Segundo o cientista político Bruno Carazza, o uso massivo da internet nas últimas eleições, em 2018, sugere que talvez a campanha "tradicional" tenha um peso menor também este ano - por isso, a vantagem dos prefeitos que vão tentar a reeleição talvez não seja tão grande.
"A gente não sabe até quando as pessoas vão ficar sem sair às ruas, e de que forma isso vai afetar os comícios; os balançadores de bandeiras nos semáforos. Vai ser uma dinâmica diferente, nestas eleições", diz ele.
"As pessoas que estão no cargo levam vantagem se a gente pensar nesse modelo antigo de campanha. Diria que eles teriam vantagem nesse cenário, mas, agora, acho que a coisa muda um pouco de figura (...) Teremos muito dinheiro na campanha este ano, e muita gente vai colocar o dinheiro no digital. E aí, acho que tem o risco de ainda mais disseminação de 'fake news', de personalidades dos meios digitais se tornando competitivas e fazendo pressão em cima dos prefeitos e vereadores que já estão lá", diz Carazza à BBC News Brasil.-
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