Opinião: Espanha versus Catalunha é disputa sem sentido
Catalães sabem muito bem como é arriscado o jogo em que estão se metendo. Mas Rajoy e Puigdemont não parecem ser as pessoas certas para resolver o impasse, opina o jornalista Martin Muno.Tudo o que o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, decretou nos últimos dias para impedir o referendo sobre a independência da Catalunha, deve ter provocado uma alegria sub-reptícia no governo regional em Barcelona, encabeçado por Carles Puigdemont.
Seja estacionar novas unidades da polícia e da paramilitar Guardia Civil na região, seja invadir supostos postos de votação e prender prefeitos: o governo central em Madri parece estar fazendo de tudo para acirrar e fortalecer o ódio dos catalães contra a Espanha.
Desse modo, Rajoy se iguala aos populistas que jogam gasolina na fogueira e depois se queixam que a coisa está pegando fogo. Pois a força crescente que os separatistas da Catalunha vêm ganhando é, em grande parte, culpa do conservador Partido Popular espanhol.
Recapitulando: em 2006 os parlamentos espanhol e catalão aprovaram um estatuto de autonomia abrangente e o ratificaram por consulta popular. Nele a Catalunha é definida como "nação". O documento parecia possibilitar a oclusão do profundo abismo entre Barcelona e Madri, criado pela Guerra Civil de 1936-1939 e a subsequente ditadura de Francisco Franco.
No entanto, o Partido Popular de Rajoy submeteu o estatuto ao tribunal constitucional espanhol. Em 2010, o órgão decidiu que artigos centrais não tinham validade. Em vez de regionalização, o veredicto significava recentralização das competências por Madri. As consequências se fazem sentir até hoje: se antes da sentença apenas 14 dos 135 deputados do Parlamento regional eram pela secessão, hoje são 72 – a maioria absoluta.
E, no entanto, os catalães sabem muito bem quão arriscado é o jogo em que estão se metendo. Pois está claro que serão consideravelmente mais complicadas as relações de uma Catalunha independente para com o restante da Espanha e com a União Europeia.
E não se trata apenas de que, no caso de uma separação, o Barcelona não poderá participar nem do torneio nacional espanhol nem na Liga dos Campeões, tendo que jogar contra os times de Sabadell e Girona. A região, tão grande quanto a Bélgica, terá que erguer sua própria estrutura estatal. A Catalunha terá que sair da UE. E o comércio, tanto com a Espanha quanto com os vizinhos europeus, necessariamente entrará em colapso. O júbilo esfuziante pelo novo Estado logo pode se transformar em lamúria.
O descontentamento de Madri com as pretensões de secessão é compreensível, já que a Catalunha responde por um quinto do desempenho econômico espanhol, e um desligamento poderia empurrar o país ainda mais em direção à depressão econômica. Igualmente compreensíveis são as apreensões da UE, pois uma independência catalã tem o potencial de desencadear movimentos semelhantes no País Basco, Irlanda do Norte, Bolzano, Escócia ou Flandres.
Quanto ao referendo em si, diante das mais recentes batidas policiais e detenções, é impraticável que possa transcorrer de forma regulamentar em 1º de outubro. Qualquer que seja o resultado, ele não terá validade nem do ponto de vista político nem do jurídico.
E se o governo Rajoy pretender impedir uma futura consulta popular, o preço será a presença constante e ampla da Guardia Civil na Catalunha. O exemplo do País Basco na década de 1980 mostra as possíveis consequências: um estado de sítio de facto, que transformou também parte da burguesia conservadora basca em simpatizante da organização clandestina ETA.
No momento, as lideranças espanhola e catalã se comportam como dois adolescentes disparando um em direção ao outro em seus carros "envenenados". Para evitar uma catástrofe, é preciso que negociem – sobre uma compensação financeira justa, sobre direitos de autonomia, sobre a reforma da Espanha, de Estado centralizador em estrutura federalista. Contudo há motivos para duvidar que Rajoy e Puigdemont sejam as pessoas indicadas para isso.
Seja estacionar novas unidades da polícia e da paramilitar Guardia Civil na região, seja invadir supostos postos de votação e prender prefeitos: o governo central em Madri parece estar fazendo de tudo para acirrar e fortalecer o ódio dos catalães contra a Espanha.
Desse modo, Rajoy se iguala aos populistas que jogam gasolina na fogueira e depois se queixam que a coisa está pegando fogo. Pois a força crescente que os separatistas da Catalunha vêm ganhando é, em grande parte, culpa do conservador Partido Popular espanhol.
Recapitulando: em 2006 os parlamentos espanhol e catalão aprovaram um estatuto de autonomia abrangente e o ratificaram por consulta popular. Nele a Catalunha é definida como "nação". O documento parecia possibilitar a oclusão do profundo abismo entre Barcelona e Madri, criado pela Guerra Civil de 1936-1939 e a subsequente ditadura de Francisco Franco.
No entanto, o Partido Popular de Rajoy submeteu o estatuto ao tribunal constitucional espanhol. Em 2010, o órgão decidiu que artigos centrais não tinham validade. Em vez de regionalização, o veredicto significava recentralização das competências por Madri. As consequências se fazem sentir até hoje: se antes da sentença apenas 14 dos 135 deputados do Parlamento regional eram pela secessão, hoje são 72 – a maioria absoluta.
E, no entanto, os catalães sabem muito bem quão arriscado é o jogo em que estão se metendo. Pois está claro que serão consideravelmente mais complicadas as relações de uma Catalunha independente para com o restante da Espanha e com a União Europeia.
E não se trata apenas de que, no caso de uma separação, o Barcelona não poderá participar nem do torneio nacional espanhol nem na Liga dos Campeões, tendo que jogar contra os times de Sabadell e Girona. A região, tão grande quanto a Bélgica, terá que erguer sua própria estrutura estatal. A Catalunha terá que sair da UE. E o comércio, tanto com a Espanha quanto com os vizinhos europeus, necessariamente entrará em colapso. O júbilo esfuziante pelo novo Estado logo pode se transformar em lamúria.
O descontentamento de Madri com as pretensões de secessão é compreensível, já que a Catalunha responde por um quinto do desempenho econômico espanhol, e um desligamento poderia empurrar o país ainda mais em direção à depressão econômica. Igualmente compreensíveis são as apreensões da UE, pois uma independência catalã tem o potencial de desencadear movimentos semelhantes no País Basco, Irlanda do Norte, Bolzano, Escócia ou Flandres.
Quanto ao referendo em si, diante das mais recentes batidas policiais e detenções, é impraticável que possa transcorrer de forma regulamentar em 1º de outubro. Qualquer que seja o resultado, ele não terá validade nem do ponto de vista político nem do jurídico.
E se o governo Rajoy pretender impedir uma futura consulta popular, o preço será a presença constante e ampla da Guardia Civil na Catalunha. O exemplo do País Basco na década de 1980 mostra as possíveis consequências: um estado de sítio de facto, que transformou também parte da burguesia conservadora basca em simpatizante da organização clandestina ETA.
No momento, as lideranças espanhola e catalã se comportam como dois adolescentes disparando um em direção ao outro em seus carros "envenenados". Para evitar uma catástrofe, é preciso que negociem – sobre uma compensação financeira justa, sobre direitos de autonomia, sobre a reforma da Espanha, de Estado centralizador em estrutura federalista. Contudo há motivos para duvidar que Rajoy e Puigdemont sejam as pessoas indicadas para isso.
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