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Espontaneidade preparada de Obama muda imagem dos EUA na América Latina

Barack Obama dança tango durante jantar em Buenos Aires - Carlos Barria/Reuters
Barack Obama dança tango durante jantar em Buenos Aires Imagem: Carlos Barria/Reuters

Carlos Meneses Sánchez

Em Bogotá

25/03/2016 21h17

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, concluiu esta semana uma viagem tão histórica quanto simbólica por Cuba e Argentina, que lhe permitiu conquistar o povo latino-americano e reverter em parte a imagem intervencionista que seu país tem na região.

Mais que uma visita de Estado aos presidentes de Cuba, Raúl Castro, e da Argentina, Mauricio Macri, o objetivo de Obama foi o de reconciliar-se com a América Latina com discursos pensados para seus cidadãos e agrados teoricamente espontâneos.

Também houve tempo para um "mea culpa" pela política intervencionista que os EUA realizaram em muitos dos países da América Latina durante a Guerra Fria, quando a potência americana e a extinta URSS impunham sua ideologia em todos os cantos do mundo.

As democracias devem ter a coragem de reconhecer quando não estiveram à altura dos ideais nos quais acreditamos, quando demoramos em falar em favor dos direitos humanos, e esse foi o caso aqui

Obama no dia em que se completavam 40 anos do golpe militar de Jorge Videla

Os EUA sempre carregaram o fardo de terem sido coniventes com as ditaduras militares na América Latina durante as décadas de 1970 e 1980.

Operação Condor

A cor vermelha causava alergia nessa época nos EUA e com esta filosofia surgiram os regimes de Augusto Pinochet no Chile (1973-1990), Alfredo Stroessner no Paraguai (1954-1989), Hugo Banzer Suárez na Bolívia (1971-1978), Jorge Videla na Argentina (1976-1981) e outras juntas militares declaradas anticomunistas na América Central.

Neste marco nasceu a Operação Condor em Brasil, Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, cujos serviços de inteligência se coordenaram para a repressão e extermínio de esquerdistas, com o conhecimento do Departamento de Estado dos EUA, dirigido então por Henry Kissinger.

Obama Cuba - Carlos Barria/Reuters - Carlos Barria/Reuters
Obama e Michelle andam pelas ruas de Havana durante visita a Cuba
Imagem: Carlos Barria/Reuters

Os EUA ganharam assim o papel de potência opressora, algo que Obama quis mudar com suas visitas a Cuba e Argentina, consciente também que os governos de esquerda da presidente Dilma Rousseff e seus colegas Nicolás Maduro, na Venezuela, e Evo Morales, na Bolívia, estão na corda bamba.

A mensagem de Obama foi a mesma nos dois países: é o início de uma "nova era" baseada no estabelecimento de uma política externa "mais madura", discurso que acompanhou com gestos que se transformaram em virais nas redes sociais e com os quais ganhou o afeto do povo latino-americano.

Na Cuba da reconciliação e do degelo, onde não tinha pisado um presidente "ianque" em quase 90 anos, Obama se reuniu com os dissidentes, falou em espanhol, se interessou pela gastronomia e pela música da ilha e até presenciou um jogo de beisebol sentado ao lado de Raúl Castro.

A isso uniu-se a presença da primeira-dama, Michelle Obama, e de suas filhas Sasha e Malia, sendo que esta última fez as vezes de tradutora para seu pai, que se atreveu a brincar com o jargão dos cubanos.

"Que bolá, Cuba?", escreveu o presidente dos EUA em sua conta no Twitter ao chegar à ilha, em referência ao típico cumprimento cubano, equivalente a "Como você está?".

Essa capacidade de combinar sua aparente espontaneidade, como fez ao dançar tango com uma dançarina profissional durante o jantar presidencial com Macri, e de pronunciar discursos carregados de manchetes para ocupar primeiras páginas fizeram com que as reações negativas a sua viagem tenham sido mínimas.

Isso porque Obama, que hasteou em Cuba e Argentina a bandeira dos direitos humanos, parece saber que não há nada como um jogo de beisebol ou uma dança sensual para fazer esquecer a pena de morte que ainda é aplicada em seu país ou a prisão de segurança máxima que segue aberta, sob domínio dos EUA, em Guantánamo (Cuba).