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Importância do shabat vira polêmica no governo de Netanyahu

30/11/2017 10h00

Maya Siminovich.

Jerusalém, 30 nov (EFE).- A mais recente grave crise do governo de Israel gira em torno sobre quão sagrado é o shabat, o dia de descanso semanal no judaísmo e que levou à renúncia de um ministro ultraortodoxo, que se opôs a trabalhar em um sábado.

"Como não tive sucesso, não vou poder manter a minha responsabilidade ministerial depois de tão séria ofensa contra um dos valores eternos do povo judeu, o dia do shabat", escreveu o ministro da Saúde Yaakov Litzman, do partido Judaísmo Unido da Torá, na carta de renúncia que entregou ontem ao primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu.

A crise ameaçou rachar a coalizão de governo e provocar eleições antecipadas, em um momento em que o partido de Netanyahu, o Likud, aparece equilibrado nas pesquisas.

Litzman enfrentou o dilema com o qual, cedo ou tarde, todos os partidos ultraortodoxos asquenazes (de origem europeia) se deparam cada vez que entram em uma coalizão de governo desde 1970: vivem em um país em permanente tensão entre os valores seculares e os religiosos, e que viola sistematicamente as rígidas leis do sábado, que impedem os fiéis de trabalhar, dirigir ou carregar peso até o pôr do sol.

"O descanso do shabat é uma bonita tradição dos contos de Isaac Bashevis Singer (autor polonês judeu), mas é impraticável, e eu não quero preservá-lo no meu dia a dia, menos ainda que alguém me imponha", disse à Agência Efe a advogada Sharon Mijaeli, que mora em Tel Aviv e tem opinião oposta a do ministro que renunciou.

Para os religiosos judeus, o respeito ao descanso no shabat, que começa quando o Sol se põe na sexta e termina ao entardecer do sábado, é um mandamento divino.

"Deus descansou no dia do shabat depois de criar o mundo, e nós devemos fazer o mesmo. O objetivo é descansar para se conectar com o lado espiritual da existência", explicou à Efe a doutora em Judaísmo Nava Waserman.

Para os ultraortodoxos da ramificação Ger, à qual Litzman pertence, o respeito aos sábados é uma das principais caraterísticas da sua rígida ortodoxia, assim como a separação dos sexos e seguir com disciplina as palavras do rabino. O atual rabino Ger, Yaakov Aryeh Alter, por exemplo, se nega a se encontrar com judeus que violam o shabat, entre eles o primeiro-ministro, segundo o jornal "Maariv".

A ramificação chassídica Ger é a maior dentro da ultraortodoxia do Judaísmo, e, por isso, tradicionalmente seus ocupam posições significativas nos governos de coalizão. Porém os ultraortodoxos são apenas 10% da população israelense e os Ger, segundo a doutora na história da religião, respondem por 70 mil pessoas desse total, mas são os responsáveis por legislar temas tão fundamentais para este povo, como casamento e divórcio, circulação dos transportes públicos aos sábados e feriados, proibição da venda de alimentos fermentados na Páscoa.

A recente crise governamental foi resolvida ontem mesmo, à noite, com o acordo entre Netanyahu e os líderes ultraortodoxos para aprovar uma série de regulações para manter o status quo. Uma delas é uma transação legal: modificar a lei básica para que um vice-ministro tenha a autoridade administrativa de um ministro de maneira a que Litzman não seja titular da Saúde, mas sim vice e mesmo assim possa voltar ao gabinete.

Sobre os trabalhos ferroviários, que seriam seriamente afetados se não pudessem avançar aos sábados, exatamente quando os trens não circulam, ficou acertado que o governo poderá dar permissões especiais para trabalhar no shabat quando se tratar de um "serviço vital". Também fechado um acordo para que alguns supermercados possam continuar abertos na laica Tel Aviv aos sábados (o que também incomoda os extremistas religiosos) e que o Campeonato Israelense de futebol continuará tendo jogos nesses dias.

Um pequeno triunfo para os que acreditam que o país não deve ser sequestrado pela ultraortodoxia judaica que, no entanto, deve continuar - através do seu peso político - tentando impor sua visão de mundo ao resto da sociedade.