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"Voz da China": a nova arma de propaganda de Xi Jinping

26/03/2018 06h00

Jèssica Martorell.

Pequim, 26 mar (EFE).- Um novo órgão de imprensa, batizado como "Voz da China", será a nova arma do Partido Comunista para promover os valores da "nova era" do país, liderada por Xi Jinping.

No plano de reestruturação da indústria audiovisual anunciado nesta semana e que deve entrar em vigor ainda neste ano, a China não esconde suas pretensões. São constantes as regras para tentar melhorar a gestão da censura e a propaganda do governo.

Serão parte da "Voz da China", que terá controle direto do Departamento de Propaganda do Partido Comunista, a emissora "CCTV", a "Rádio Nacional da China" (CNR) e a "China Rádio Internacional" (CVI).

A medida pretende, segundo um documento divulgado pela agência estatal "Xinhua", fortalecer a "direção centralizada e unificada do partido sobre as notícias e a opinião pública". Além disso, o objetivo é "reforçar a gestão de importantes propagandas".

O anúncio ocorre depois do fim da Assembleia Nacional Popular, a reunião política anual mais importante da China. No encontro, Xi consolidou seu poder em um nível somente alcançado por Mao Zedong.

A Assembleia Nacional Popular eliminou as restrições sobre a reeleição para mandatos presidenciais e incluiu na Constituição várias teorias políticas defendidas por Xi.

A reforma do setor audiovisual estatal é a primeira medida tomada desde então. O Departamento de Propaganda supervisionará o conteúdo de todas as notícias e publicações para fortalecer a gestão e adequar as três empresas, de acordo com o documento divulgado pela "Xinhua", ao "socialismo com características chinesas".

Apesar de a censura sobre a imprensa no país não ser novidade, a reestruturação deixa explícito o controle sobre a informação a partir de um grande órgão que permitirá supervisionar com facilidade tudo o que for publicado, eliminando qualquer divergência dentro do aparelho de propaganda do regime comunista.

A especialista em veículos de imprensa do Instituto de Ciências Humanas de Viena, Ling Li, explicou à Agência Efe que o Partido Comunista Chinês poderá, desta forma, responder às crises de relações públicas com maior rapidez e enviar instruções às empresas estatais de comunicação sem demora.

"Isso significa que esses veículos perderão ou terão uma oportunidade reduzida de aproveitar o atraso e informar sobre assuntos delicados antes de a censura do partido chegar, como costumavam fazer no passado", explicou.

"Em outras palavras, o urso abraçará mais de perto seus veículos de imprensa", opinou o pesquisador do Projeto de Veículos de Mídia da China da Universidade de Hong Kong, David Bandurski.

Segundo ele, o controle da informação e da ideologia é "essencial" para a sobrevivência do regime, apesar do "poder branco", como o Ocidente é reconhecido, apresentar um grande desafio para o sistema centralizado e autoritário da China.

"O desafio será como projetar vozes que, de alguma maneira, tenham impacto nas pessoas, sobretudo enquanto uma única opinião é propagada. É uma contradição interna contra a qual a China lutou durante anos através da sua propaganda em nível exterior. É possível que essa fusão possa piorar ainda mais o problema", explicou Bandurski.

Para organizações de direitos humanos como a Anistia Internacional (AI), a criação da "Voz da China" é "alarmante", pois o órgão será utilizado para projetar, sob medida, a imagem de Xi e a promoção da influência econômica chinesa no mundo.

"A nova plataforma parece estar orientada a promover opiniões do partido para a audiência internacional, com objetivo de mudar os valores universais promovidos pelas democracias ocidentais e os países de Estado de Direito", criticou em entrevista à Efe o pesquisador da AI Patrick Poon.

A indústria cinematográfica também não escapa da reestruturação e também será supervisionada pelo Departamento de Propaganda. Segundo o documento divulgado pela "Xinhua", o objetivo é "desenvolver o único e importante papel do cinema na difusão das ideias, da cultura e do entretenimento".

"O departamento organizará a censura do conteúdo dos filmes, orientará e coordenará os principais eventos relacionados ao cinema de caráter nacional e assumirá a responsabilidade das coproduções no exterior", descreve o documento.