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Rússia evita confinar a população, que desconfia dos dados oficiais sobre coronavírus

O presidente russo Vladimir Putin visita infectados pelo coronavírus em hospital em Moscou - Alexey DRUZHININ / SPUTNIK / AFP
O presidente russo Vladimir Putin visita infectados pelo coronavírus em hospital em Moscou Imagem: Alexey DRUZHININ / SPUTNIK / AFP

Xavier Colás

Correspondente da RFI em Moscou

26/03/2020 08h32

A Rússia pode se orgulhar de um número relativamente baixo de pessoas infectadas com o novo coronavírus. Até o momento, foram notificados 840 casos de infecções no país e três mortes. Talvez por isso o presidente da Rússia, Vladimir Putin, se recuse a confinar seus cidadãos.

Os dados oficiais não convencem mais quase ninguém. Durante semanas, vários meios de comunicação e sindicatos de médicos denunciaram que esse número oficial - que contabiliza apenas três mortes - está certamente abaixo da situação real, uma vez que a Rússia tem uma fronteira de 4.200 quilômetros com a China. Além disso, eles atribuem que consideram uma "anomalia" aos poucos testes realizados até o momento e também às manobras das autoridades para esconder a verdade.

A lembrança da catástrofe de Chernobyl, silenciada e mal administrada pelas autoridades soviéticas em 1986, volta à tona para boa parte da população.

"O próprio governo não sabe quantos casos existem porque os testes são de péssima qualidade", diz Anastasia Vasileva, médica e diretora do sindicato dos médicos e aliada do opositor Alexei Navalny.

O prefeito de Moscou, Sergei Sobyanin, um dos responsáveis ??pela operação em toda a Rússia da luta contra o coronavírus, admitiu nesta semana que o número real de pessoas afetadas pelo Covid-19 no país é desconhecido. "Não importa se são 400 ou 500. A taxa de contágio é alta, estamos enfrentando um problema sério", disse o prefeito em uma reunião com Putin transmitida pela televisão.

Sobyanin está preocupado porque sabe que muitas pessoas se isolam em casa: "As que vieram do exterior e não fizeram testes, as que não têm condições de pagar e ficam em seus apartamentos, isolados, e também os doentes, que são numerosos".

A revista médica 'PCR' também critica o procedimento de contagem: "O tipo de análises que eles estão fazendo não é tão eficiente quanto deveria", argumenta Alexei Torgashev, diretor da publicação. "Se um paciente está infectado, mas a concentração do vírus não está em seu nível mais alto naquele momento, o resultado é negativo", explica ele.

Por esse motivo, o Ministério da Saúde da Rússia anunciou que começará a realizar testes com uma "sensibilidade maior" do que os atualmente em uso. Mas, no momento, os testes estão se acumulando nos laboratórios por falta de pessoal.

Falta de medidas de quarentena

A falta de medidas de quarentena total decidida pelo governo significa que as pessoas assintomáticas permanecem nas ruas e seguem infectadas.

O máximo que Vladimir Putin decretou foi que na próxima semana gozarão de férias pagas em todo o país. É uma medida "generosa" para incentivar os russos a ficar em casa e frear a propagação do vírus.

O presidente se viu forçado a sacrificar algumas ações por causa da pandemia. O referendo que decidirá se Putin poderá permanecer no poder até 2036 foi adiado, sem data determinada.

Em uma mensagem veiculada por rede nacional de televisão para anunciar medidas contra o coronavírus, Putin pediu aos russos que ficassem em casa. Mas ele deixou para os governadores e prefeitos tomarem medidas mais restritivas.

Putin anunciou um pacote de estímulo econômico que inclui, entre outras medidas, uma moratória no pagamento de créditos, se a renda cair abaixo de 30%, e o aumento de 50% no pagamento do seguro desemprego. Ele também confirmou a suspensão do pagamento de impostos, exceto o IVA (equivalente ao ICMS), às Pequenas e médias empresas do país. "Estamos conseguindo impedir que a epidemia se espalhe rapidamente", disse o líder russo.

O discurso de Putin foi "uma necessidade evidente após uma reunião que durou várias horas devido à situação nada fácil provocada pelo coronavírus", disse Dimitri Peskov, porta-voz do Kremlin.

A prefeitura de Moscou decidiu adotar o confinamento a alguns moradores e ordenou que os idosos acima de 65 anos fiquem em casa a partir da manhã desta quinta-feira. Quase dois milhões de moscovitas são afetados. Mas lojas, bancos e farmácias permanecerão abertos.