Protestos antirracistas pelo mundo mostram revolta contra a impunidade policial
Os protestos multitudinários contra o assassinato a sangue frio de um homem negro por quatro policiais brancos em Minneapolis é mais um sinal dos tempos. O rechaço não tem só a ver com o racismo de policiais americanos. Afinal de contas, a discriminação racista é um vírus que infecta boa parte das forças policiais e das sociedades do planeta. Sem provocar um tamanho tsunami de reprovação. Além do racismo, a questão central é a impunidade.
O estado de direito e a igualdade perante a justiça são fundamentais para as democracias modernas. Não há lei sem polícia. O combate à criminalidade é impossível sem um instrumento doméstico com bastante força para que as regras legais sejam respeitadas e os delinquentes punidos.
Onde existem liberdades públicas, o uso da força só é considerada legítima quando os agentes da manutenção da ordem também são sujeitos ao rigor das leis, como qualquer cidadão.
Quando fica evidente que a corporação policial, o sistema judiciário e até autoridades públicas, protegem sistematicamente os agentes que cometem crimes e delitos, a confiança nas instituições despenca e a revolta explode.
Não é só nos Estados Unidos. No mundo inteiro, lá onde regime democráticos reconhecem o direito de manifestar descontentamento, os protestos vêm aumentando contra a "violência policial".
Escândalo da impunidade
Claro, Paris ou Londres não são Minneapolis ou Nova York. Seul ou Sidney têm pouco a ver com o Rio de Janeiro ou Johannesburgo. Cada situação tem que enfrentar suas próprias discriminações contra minorias de cor, étnicas, religiosas, sexuais ou sociais. Mas o motor da revolta é sempre o mesmo: o escândalo da impunidade.
Não há grandes manifestações internacionais contra as práticas dos regimes autoritários. Pouca gente ocupa as praças para condenar o tratamento dado aos Uigures, os Tibetanos ou à população de Hong-Kong pelo poder comunista chinês, ou para protestar contra os massacres na Síria ou em alguns países africanos ou asiáticos.
É como se a impunidade e a repressão policial nas ditaduras fossem consideradas como "normais". Lutar pela igualdade diante da lei é um privilégio daqueles que vivem em nações onde a lei impera. Mas o resto do mundo também está aprendendo a reivindicar o fim da impunidade.
A grande novidade é a mistura das redes sociais, com as televisões de informação permanentes e a ubiquidade dos smartphones. O suplício atroz de George Floyd, asfixiado durante nove minutos pelo joelho de um policial totalmente insensível, foi filmado pelo celular de uma garota de 17 anos e explodiu nas redes em poucos segundos. Boa parte da população mundial pôde assistir ao drama em tempo recorde. E graças à Internet revezada pelas televisões, a mobilização também foi quase imediata.
Onda de fraternidade gera esperança
Não existe poder estatal ou corporativo capaz de controlar tamanha transparência da informação e da emoção. É difícil combater o poder das imagens - só cortando a internet ou a eletricidade em geral. Manter a impunidade era mais fácil quando só pouca gente sabia o que tinha acontecido.
Hoje, as autoridades nacionais estão perdendo o poder de impor uma narrativa política de cima para baixo, junto com a perda dos instrumentos de controle de suas economias, fronteiras, organização territorial, cultura e até regras jurídicas internas.
As novas tecnologias da comunicação, abrindo espaço para que qualquer um possa se expressar e ter uma enorme influência social, estão destruindo a autoridade e até a legitimidade do poder político representativo. Mas sem isso, onde é que fica o monopólio do uso legítimo da força? Como inventar uma nova polícia, necessária mas que precisa ser legitimada pelas populações? Como garantir maior igualdade de direitos e menos discriminações?
As novas gerações estão abrindo o caminho. A esperança é que essa onda de fraternidade nas ruas não acabe afundando em novos regimes autoritários, cuja a única autoridade será o uso indiscriminado da força bruta.
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