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Mali: militares que tomaram o poder prometem transição política e eleições gerais

Analistas atribuem o golpe ao crescente descontentamento dos soldados com as desigualdades de pagamento e corrupção - Stringer/AFP
Analistas atribuem o golpe ao crescente descontentamento dos soldados com as desigualdades de pagamento e corrupção Imagem: Stringer/AFP

19/08/2020 08h36

Os mentores do golpe militar no Mali anunciaram hoje que planejam estabelecer um governo civil de transição, responsável por organizar novas eleições, um dia após a renúncia do presidente Ibrahim Boubacar Keita.

Ibrahim Boubacar Keita, conhecido como "IBK", anunciou na noite de ontem que renunciou e dissolveu o parlamento, após sua prisão no início do dia por soldados amotinados, agravando a crise em um país que já enfrenta uma insurgência jihadista e uma onda de protestos.

Em uma intervenção transmitida na manhã de hoje pela televisão pública, o porta-voz dos amotinados, que se identificam como o "Comitê Nacional para a Salvação do Povo", convidou a sociedade civil e partidos políticos malineses a aderir ao movimento, a fim de estabelecer as condições para uma transição política, levando a eleições.

Cercado por soldados, o coronel Ismaël Wagué, porta-voz do comitê, explicou que os amotinados tomaram medidas para impedir que o Mali mergulhe ainda mais no caos. "Nosso país está afundando no caos, anarquia e insegurança, e a culpa é principalmente das pessoas que são responsáveis pelo seu destino", declarou.

Diante da imediata condenação internacional ao golpe, o porta-voz dos soldados amotinados e chefe-adjunto do Estado-Maior para a Aeronáutica disse nesta manhã que o grupo irá respeitar os acordos internacionais. Uma mensagem enviada à França, que possui soldados no Mali na operação Barkane, de luta contra os jihadistas salafistas na região. A Comunidade de Estados do Oeste da África decidiu isolar o Mali, fechando suas fronteiras com o país.

Libertação imediata

O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, exige a libertação imediata do presidente malinês detido no motim. O Conselho de Segurança da ONU fará uma reunião de emergência nesta quarta-feira sobre a crise. O presidente Keita enfrentava há semanas críticas de personalidades da sociedade civil apartidárias e líderes religiosos.

Analistas atribuem o golpe ao crescente descontentamento dos soldados com as desigualdades de pagamento do soldo e a corrupção, que levou ao enriquecimento de um pequeno grupo na cúpula das Forças Armadas.

Desde junho, dezenas de milhares de pessoas protestavam nas ruas de Bamako pedindo a demissão de Ibrahim Boubacar Keita, repreendendo-o por suas falhas ao lutar contra os crescentes problemas de segurança e corrupção.

A coalizão M5-RFP, formada por líderes religiosos, políticos e da sociedade civil e na origem desse movimento de protesto, mostrou seu apoio aos militares. Seu porta-voz, Nouhoum Togo, disse à Reuters que os eventos recentes "não foram um golpe militar, mas uma revolta popular".

Amotinados

Centenas de manifestantes antigovernamentais se concentraram no centro de Bamako na noite desta terça-feira para aclamar os amotinados, que desfilaram pela cidade em veículos militares.

Um motim anterior já havia acontecido na base de Kati, em 2012, levando a um golpe militar que derrubou o presidente Amadou Toumani Touré, acelerando a tomada de controle do norte do Mali pelos jihadistas, que continuam operando nas regiões Norte e Centro do país.

A França, antiga potência colonial, lançou em 2013 uma operação militar para tentar combater os jihadistas, mas as forças islâmicas ampliaram sua influência na região chamada de "três fronteiras", em que convergem os territórios do Mali, Burkina Faso e Níger, onde continuam os ataques contra soldados, civis e estrangeiros.

O motim de ontem desencadeou um conjunto de reações internacionais. Paris e outras capitais temem que a queda de IBK desestabilize ainda mais o Mali e a Região do Sahel como um todo.