"Quatro cadáveres foram retirados hoje: meu irmão, minha mãe, meu pai e minha tia", conta sobrevivente de terremoto
Equipes de emergência alemãs resgataram hoje, na cidade turca de Kirikhan, uma mulher que passou mais de 100 horas sob os escombros de uma casa que desabou no terremoto de segunda-feira (6).
No entanto, apesar desses "milagres", como já estão sendo chamados os resgates de sobreviventes, os moradores da Turquia e da Síria começam a perder a esperança de encontrar seus entes queridos com vida.
A mulher de 40 anos resgatada nesta sexta-feira está em condição "estável" e foi atendida imediatamente pela equipe médica, informou a ONG alemã I.S.A.R (sigla para Busca e Resgate Internacional, em tradução livre) nas redes sociais.
Os socorristas explicaram que conseguiram fornecer água e um suco de frutas para ela através de um tubo. "O resgate foi muito complicado", disse o porta-voz da organização, Stefan Heine às agências de notícias. "Um trabalho milimétrico com martelos para quebrar pedras", descreveu.
Um pouco mais cedo, na cidade turca de Antakya, capital da devastada província de Hatay, uma adolescente de 16 anos também foi retirada dos escombros. Ela havia ficado presa sob uma parede que desabou sobre um poço profundo.
No entanto, apesar desses sobreviventes, os moradores da região têm cada vez menos esperança de encontrar corpos com vida. Tradicionalmente, mais de 90% dos sobreviventes de terremotos são resgatados nos três dias seguintes à catástrofe.
Na cidade turca de Kahramanmaras, próxima do epicentro do tremor, os cadáveres se acumulam dentro de sacos plásticos diante dos restos dos prédios, enquanto esperam os carros funerários.
Os cemitérios não dão conta do ritmo de chegada das vítimas fatais, enquanto os familiares aguardam para o sepultamento.
"É um sofrimento enorme. É indescritível. Nunca vi nada assim. A gente lê o sofrimento e o medo nos olhos das pessoas", desabafa Edger Bahçage, que espera no cemitério para enterrar seu tio em um dos funerais coletivos organizados desde a tragédia.
Uma visão apocalíptica
Tratores cavam valas nas quais dezenas de corpos são sepultados simultaneamente. "É uma visão apocalíptica", resume Delek Isik, que observa a cena.
"Não sei nem o que pensar. Quero deixar tudo para trás e começar uma nova vida", diz a jovem turca.
Nas ruínas de Iskenderun, Mustafa, que faz parte das equipes de socorro enviadas de Istambul, cava na mesma zona há três dias e começa a desanimar. "Há cem pessoas sob esse prédio", aponta. "Continuamos procurando, mas não ouvimos nenhum sinal de vida".
Mesmo assim, os moradores rodeiam as equipes de socorro. Como Suna, que insiste em estar presente se o corpo de um membro de sua família for encontrado. "Quatro cadáveres foram retirados hoje. Meu irmão, minha mãe, meu pai e minha tia", enumera.
Como ela, Veli faz vigília nos arredores. "Ontem, nós tínhamos poucas esperanças. Mas hoje não vejo mais nenhuma chance. Sei que não posso dizer isso, pois precisamos ter esperança, mas também sei que ninguém pode sobreviver sob um prédio desses durante três dias e meio, sem água. Eu não acredito mais, mesmo se quero acreditar. Queremos pelo menos encontrar os corpos inteiros para poder enterrá-los dignamente".
Sanções impedem chegada de ajuda na Síria
Na Síria, a situação não é muito diferente, mesmo se os moradores também têm que lidar com questões políticas que atrasam as operações de resgate. Damasco é visada por sanções impostas pelos Estados Unidos contra o presidente Bashar Al-Assad e vários países hesitam em enviar ajuda.
"A cidade está totalmente destruída", relata Elia Kajamini, moradora de Alepo. "Centenas de casas foram destruídas, sem contar os sítios arqueológicos, a cidadela e o minarete de Saladino", diz, em referência aos principais monumentos locais.
"Ainda tem gente sob os escombros e nossos hospitais estão lotados. Mas estamos sufocados por esse terrível bloqueio imposto [pelos Estados Unidos] à Síria. Isso é tão injusto. Todos os aviões carregados com ajuda aterrissam na Turquia. E nós estamos a apenas 90 quilômetros da cidade turca de Gaziantep", explica.
"Temos que colocar a política de lado, pois há uma urgência humanitária. Deixem a ajuda humanitária entrar", se revolta a moradora de Alepo.
Com informações de Jad El Khoury, Guilhem Delteil e Manon Chapelain, enviados especiais da RFI à Turquia, e Sami Boukhelifa
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