Contra a ONU e com ataque a ONGs: como a Venezuela cogita regular as redes sociais
A Assembleia Nacional da Venezuela, com a maioria formando a base do governo, interrompeu suas férias para ajudar o presidente Nicolás Maduro e votar a partir desta terça-feira (13), em Caracas, um pacote de leis para regulamentar as redes sociais. O projeto é criticado pela oposição, que reivindica vitória na eleição presidencial. A ONU denuncia um "clima de medo" no país.
A iniciativa faz parte de um pacote de leis promovido pelo presidente da Assembleia, Jorge Rodríguez, que inclui a aprovação de uma norma para regular ONGs e outra para punir o "fascismo", termo pelo qual o governo também costuma se referir a seus críticos.
"Vamos nos dedicar à tarefa de aprovar um conjunto de leis que você (Maduro) solicitou para poder defender nossa população contra o ódio", disse Jorge Rodríguez, na segunda-feira (12) durante uma reunião do Conselho de Defesa e de Estado.
O presidente Nicolás Maduro afirma que as redes são usadas para atacar a sua reeleição, denunciada pela oposição como uma fraude.
"A Venezuela precisa regulamentar o funcionamento das redes sociais (...) Vamos nos dedicar neste período de sessões à tarefa de aprovar um pacote de leis que o senhor solicitou para poder defender a nossa população das expressões de ódio social, do terrorismo e da disseminação de ideias fascistas e de ideias de ódio nas redes sociais", disse Rodríguez, dirigindo-se a Maduro.
ONGs na mira do projeto de lei
A Assembleia Nacional venezuelana já aprovou em primeira discussão uma lei que regulamenta o financiamento das ONGs, que são alvo frequente de ataques do governo, e outra contra o fascismo, que propõe tornar ilegais partidos e multar empresas, organizações ou veículos de comunicação que financiem atividades ou divulguem informações que "incitem o fascismo". Uma vez confirmadas em segunda discussão, elas podem ser promulgadas.
"Muitas ONGs servem de fachada para o financiamento de atos terroristas (...) Vamos revisar a lei contra o ódio para incorporar os elementos relacionados à propagação de ódio nas redes sociais", apontou Rodríguez.
De acordo com o texto do projeto, as organizações devem registrar-se localmente e declarar suas fontes de financiamento, geralmente estrangeiras. A lei contra o ódio de 2017 estabelece penas de até 20 anos de prisão, sendo a maioria dos presos políticos acusados de crimes que ela contempla.
Jorge Rodríguez também promete a regulamentação das redes sociais, uma lei para punir o "fascismo" - termo regularmente utilizado pelo governo para designar a oposição.
Maduro já suspendeu por 10 dias a rede social X, após acusar seu dono, Elon Musk, de incitar o ódio e o fascismo. Ele também lançou uma campanha para boicotar o WhatsApp.
Maduro ataca redes sociais ao mesmo tempo que crescem prisões arbitrárias na Venezuela
Missão da ONU questiona projeto
O presidente venezuelano pediu "mão de ferro e justiça severa" diante da "violência" e dos "crimes de ódio", acusando os dois líderes da oposição, María Corina Machado e Edmundo González Urrutia, de serem os responsáveis.
Uma missão independente da ONU sublinha que o projeto de lei "visa claramente limitar" o "direito de associação". Regulamentações semelhantes foram adotadas em Cuba, Nicarágua, Guatemala e Bolívia.
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Quero receberMas "praticamente tudo é fascismo" para quem está no poder, avaliou Alí Daniels, advogado e diretor da ONG Acesso à Justiça, à AFP em maio.
Oposição contesta resultado das eleições
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) ratificou a vitória de Maduro no dia 2 de agosto com 52% dos votos, sem publicar a contagem exata e as atas das assembleias de voto, alegando ter sido vítima de um ataque hacker.
Segundo a oposição, que publicou as atas obtidas graças aos seus auditores - cuja legitimidade é rejeitada por Maduro - Edmundo González Urrutia venceu a votação com 67% dos votos.
A oposição, bem como muitos observadores, acreditam que o ataque hacker apresentado pelo CNE é uma invenção do governo para evitar a publicação de documentos eleitorais.
O anúncio da reeleição provocou manifestações espontâneas com saldo de 25 mortos, 192 feridos e 2.200 prisões de fontes oficiais.
ONU denuncia "clima de medo"
O Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, expressou sua profunda preocupação nesta terça-feira com o alto número de detenções arbitrárias na Venezuela e o uso desproporcional da força, bem como "o consequente clima de medo".
"É particularmente preocupante que tantas pessoas estejam sendo detidas, acusadas ou indiciadas por incitação ao ódio, ou de acordo com a legislação antiterrorista. O direito penal nunca deve ser usado para restringir indevidamente os direitos à liberdade de expressão, reunião pacífica e associação", disse o Türk em um comunicado.
O pacote de leis de regulação das redes surge no momento em que a oposição, que organizou apenas uma mobilização em 3 de agosto, convocou grandes manifestações para o sábado (8).
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