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Com 30 internados involuntariamente, prefeitura do Rio só tem mais dez leitos para usuários de crack

A Secretaria Municipal de Governo do Rio de Janeiro começou na madrugada a internação compulsória de adultos usuários de crack - Fernando Quevedo/Agência O Globo
A Secretaria Municipal de Governo do Rio de Janeiro começou na madrugada a internação compulsória de adultos usuários de crack Imagem: Fernando Quevedo/Agência O Globo

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio de Janeiro

19/02/2013 11h57Atualizada em 19/02/2013 14h29

A Prefeitura do Rio de Janeiro tem apenas 40 vagas em hospitais gerais para receber adultos usuários de crack, das quais 30 foram preenchidas nesta terça-feira (19) após a operação que recolheu 99 pessoas –91 adultos e oito menores— na cracolândia da favela Parque União, em Bonsucesso, na zona norte da cidade. Com isso, só há mais dez vagas disponíveis na cidade.

É a primeira vez que os usuários recolhidos pela operação da prefeitura carioca são encaminhados involuntariamente para unidades hospitalares. Outras 69 pessoas recolhidas na ação foram encaminhadas para abrigos da cidade, das quais oito aceitaram voluntariamente o tratamento oferecido pela rede Fazenda da Esperança.

"Essa é uma decisão que nós tomamos para salvar vidas. Não podemos prescindir de usar todos os recursos que temos para salvar vidas. Vamos focar na cracolândia e permanecer o tempo que for necessário ali. É bem possível que alguns retornem, já que nem todos foram internados de forma involuntária. Apenas os que os profissionais de saúde entendiam que eram casos de internação involuntária", disse o secretário municipal de Governo, Rodrigo Bethlem.

Foram ocupados 14 leitos do hospital Evandro Freire, na Ilha do Governador, na zona norte, sete do hospital Ronaldo Gazolla, em Acari, também na zona norte, quatro do hospital dos Servidores, na zona portuária, e dois do hospital federal da Lagoa, na zona sul. Duas gestantes foram levadas para o hospital Pedro 2º, em Santa Cruz, na zona oeste.

"Passado o período de desintoxicação, essas pessoas vão para uma residência ou comunidade terapêutica, ou pode ser que elas fiquem no próprio Rio Acolhedor, com acompanhamento da Saúde e do Caps-AD", disse Bethlem, referindo-se ao Centro de Atenção Psicossocial, que, segundo o Ministério Público, é o órgão mais adequado para atuar na recuperação de dependentes de crack.

Entre os casos de internação involuntária --a maioria se deu em função da associação entre a drogadição e outros problemas de saúde--, o mais grave é de uma gestante que foi diagnosticada com HIV e tuberculose. A outra mulher grávida acolhida durante a operação na cracolândia da favela Parque União apresenta sintomas de "desnutrição profunda", de acordo com Bethlem. As duas estão em estado grave.

De acordo com o subsecretário de Atenção Hospitalar e Emergência, João Luiz Ferreira da Costa, o atual número de vagas não chega a ser um problema em relação à política de combate ao crack.

  • Pablo Jacob/Agência O Globo

    Pessoas usam drogas a 300 metros de onde a Secretaria Municipal de Governo montou uma operação que passou a internar compulsoriamente usuários de crack na avenida Brasil

“Não adianta só criar leitos. Dependendo da capacidade do leito, podemos ter pacientes liberados em três ou cinco dias”, afirmou, explicando que os leitos emergenciais podem ser liberados em poucos dias, já que, passado o período de desintoxicação, os usuários de crack seguem para unidades terapêuticas e/ou ambulatoriais.

Ocupação permanente

A Prefeitura do Rio de Janeiro anunciou que a ocupação da cracolândia da comunidade Parque União será uma medida permanente, a exemplo do que faz a Secretaria Estadual de Segurança Pública com o projeto das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora).

"Essa operação vai ter um caráter permanente. Nós vamos ficar presentes naquela área por tempo indeterminado. A Polícia Militar montou uma base ali, a Guarda Municipal, a Secretaria de Saúde vai ficar com o consultório de rua para fazer o atendimento eventual das pessoas que retornarem ao local. (...) Nós vamos permanecer por tempo indeterminado", afirmou Bethlem.

De acordo com o governo municipal, três holofotes já foram instalados a fim de que o local permaneça iluminado durante a noite. O patrulhamento ficará a cargo do BPVE (Batalhão de Vias Expressas) da PM, que montou três bases na região.

Dependentes retornam

Poucas horas após a operação na favela Parque União, os usuários de crack que não foram acolhidos pelos agentes da Secretaria de Desenvolvimento Social começaram a se espalhar pelas margens da avenida Brasil, nos pontos de acesso ao Complexo da Maré, onde o crack é vendido a preços módicos.

"Óbvio que nem todo mundo vai se tratar. Nós vamos tirar, um vai sair daqui e outro acolá. O fundamental é que ali, especificamente na avenida Brasil, estava se configurando uma área de altíssimo risco", afirmou Bethlem.

Segundo a titular da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), Valéria Aragão, os usuários de crack acabam migrando para outras áreas na medida em que as grandes cracolândias são "dissipadas". Para ela, tal fato explica a concentração de dependentes em diversos pontos da avenida Brasil.

"O objetivo é dissipar essas cracolândias a cada ação. Foram feitas operações que dissiparam as cracolândias na zona sul, a exemplo da ocupação da favela Santo Amaro, da ocupação de Manguinhos, Mandela e Jacarezinho, quando outra grande cracolândia foi dissipada, e o objetivo é dissipar mais essa cracolândia. Logicamente, trabalharemos com as hipóteses de migração, pois as migrações existem. Tanto que essa cracolândia é antiga, mas acabou recebendo usuários de outras regiões e se tornou um problema maior ainda", afirmou.