Desabrigado por enchente, homem resgata mais de cem cães em ônibus no RS

Depois de mais uma semana de chuvas, o sol voltou a aparecer no céu da grande Porto Alegre nesta terça-feira (21). O dia foi de recomeço para milhares de pessoas atingidas pelas cheias de rios e córregos no Rio Grande do Sul. José Damião dos Santos, 47, foi uma dessas pessoas. Ele abandonou a casa em que mora com a água pelo peito depois de salvar a mulher e seus três filhos. Mas, inconformado, voltou ao local e resgatou, um a um, os cerca de 140 cachorros que criava. Alguns não sobreviveram.

Era com felicidade, nesta terça-feira, que os cães, em sua maioria vira-latas, rolavam na grama ainda úmida para aproveitar o primeiro dia de sol depois de tanta chuva em Alvorada (22 km de Porto Alegre), na região metropolitana. Nesta terça, os animais puderam pisar na terra depois de passarem cerca de 24 horas empilhados em um velho ônibus sem freio e sem motor. Foi ali que Santos, condutor de carrinhos de frutas na Ceasa, recolheu seus animais.

"Na segunda-feira de madrugada choveu muito forte, e a água entrou em casa. Saí com água pelo peito, tirei minha família e voltei pra resgatar os cachorrinhos. O pessoal quase enlouqueceu quando me viu voltando pra casa", conta Santos. Morador do bairro Americana. depois de abrigar a mulher e os filhos de 10 meses, 15 e 22 anos, ele se dedicou a salvar os cães. "Me deu um desespero, entrei em pânico. Fui pegando um a um numa caixa, mas muitos se perderam, outros se afogaram. Uns vi que foram atropelados", conta, entre lágrimas. Ele calcula que cerca de cem animais estão no ônibus.

A família foi para a casa de parentes, mas os cães não podiam ficar na rua. Foi então que Santos acomodou a matilha no velho ônibus, estacionado em frente à residência. "Dormimos juntos, eu ali, naquela rede. Mas me assustei quando a água subiu ainda mais e passou uns dez centímetros do assoalho."

Durante a segunda-feira, alguns vizinhos se apresentaram para auxiliá-lo. "Fui doar ração e encontrei ele sentado no meio dos bichos, chorando. Ele precisava sair dali. Rebocamos o ônibus com jipes e tiramos do meio d'água", conta o voluntário Nelson Duarte Fernandes.

O drama de Santos virou notícia nas redes sociais e diversas pessoas se empenharam em encontrar um abrigo para ele e os cães. "Conseguimos contato com a Associação de Moradores da Vila Formosa, que nos cedeu o terreno. Guinchamos o ônibus, que não tem a mínima estrutura, sem freio, por uns cinco quilômetros dentro da cidade, sem auxilio da prefeitura, polícia militar, de ninguém. Devo ter recebido várias multas", brinca Fernandes.

Recolhimento

Santos conta que começou a abrigar animais em casa há cerca de 15 anos. "Moramos num terreno invadido da prefeitura que, inclusive, já me colocou na Justiça. Mas não tenho o que fazer", conta. "Nossos cachorros comem até fruta. Nos viramos. Mas não podemos ver um animal atropelado ou machucado, que levamos para casa", completa a esposa de Santos, Carla Maria Tonhin, 41.    

O casal não conseguiu salvar nada dentro de casa. "Só essa sacola com documentos e uma muda de roupa", corrige Carla. Entretanto, durante esta tarde, os telefones do casal não pararam de tocar. Eram pessoas de todas as partes oferecendo ajuda a eles e aos animais.

"Estamos esperando a água baixar para voltar para casa e ver o que sobrou. Daí vamos ver o que fazer", avalia Santos. Muito agradecido a toda ajuda que vem recebendo, acaricia os bichos enquanto chora. "É triste não ter conseguido salvar todos."

Interessados em auxiliar a família e os cães podem entrar em contato diretamente com Santos pelo telefone (0XX51) 8954-0993 ou com o voluntário Fernandes, pelo (0XX51) 9333-9068.